quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Câmara de Lisboa responsabiliza Assunção Cristas por fecho de muitas lojas históricas / Programa Lojas com História de Lisboa finalmente aprovado (com avisos ao Parlamento)


Câmara de Lisboa responsabiliza Assunção Cristas por fecho de muitas lojas históricas
POR O CORVO • 1 FEVEREIRO, 2017 •

Todos à espera da Assembleia da República (AR). A Câmara Municipal de Lisboa (CML) e a Assembleia Municipal de Lisboa (AML) querem que o parlamento acelere a discussão e apreciação dos instrumentos legais que poderão ajudar a travar a actual vaga de encerramentos de estabelecimentos comerciais da capital com importância histórica ou cultural local. As alterações ao Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU), assim como ao Regime Jurídico das Obras em Prédios Arrendados (RJOPA), estão há quase um ano nas mãos da AR onde aguardam agendamento para discussão e votação.

Sem elas, continuar-se-á a assistir ao fecho de lojas notáveis a um ritmo acelerado. Algo que Duarte Cordeiro, vice-presidente da CML, diz ser responsabilidade de Assunção Cristas (CDS-PP), por, enquanto ministra do anterior governo, ter introduzido alterações à Lei das Rendas que facilitam os despejos – responsáveis pela cessação da existência de muitas lojas emblemáticas. Ao mesmo tempo, o “número dois” da câmara municipal apela também aos donos dos prédios para que aprendam a valorizar a lojas históricas que estejam instaladas nos seus edifícios. “Não são um activo negativo, são antes um activo positivo, que os proprietários devem tentar valorizar”, diz.

As acusações a Cristas surgiram durante o debate que precedeu a aprovação do regulamento das Lojas com História e do respectivo fundo, realizado na tarde desta terça-feira (31 de janeiro), na AML. Sem nunca a nomear, o autarca socialista foi contundente nas críticas à agora candidata à presidência da edilidade. “A lei do arrendamento em vigor tem autores e nós queremos, efectivamente, corrigi-la. Se hoje estamos a assistir a um conjunto de despejos de lojas com história, isso não se deve ao município de Lisboa, mas as autores da lei do arrendamento. Temos todos que nos lembrar quem foram esses autores da lei do arrendamento e que partidos é que a subscreveram”, afirmou Duarte Cordeiro, referindo-se à alteração legislativa, aprovada em 2012, na AR, com os votos favoráveis da maioria então formada por PSD e CDS-PP. Assunção Cristas era a titular da pasta da Habitação.

As fortes críticas à ex-ministra surgiram no momento em que o vice-presidente da autarquia destacava a importância do programa Lojas com História – que tem sido alvo de muitas críticas por demorar demasiado tempo a entrar em vigor, havendo ainda quem o considere incapaz de reverter a dinâmica de encerramento de estabelecimentos emblemáticos, acelerada nos últimos tempos. “Temos consciência de que isto é uma corrida contra o tempo”, disse, já depois de ter exortado o Governo e a Assembleia da República a despacharem-se na colocação a apreciação e votação das tais alterações legislativas (NRAU e RJOPA).

“Com os instrumentos aqui apresentados na assembleia municipal, damos um sinal claro a todos no que diz respeito ao desejo de proteger as lojas com história. Mas estamos também a pressionar a AR para que seja célere no seu processo”, afirmou o autarca, que prometeu diversas acções promocionais destes estabelecimentos, para breve. Para o mês de Abril, e já depois do arranque de outras iniciativas promocionais, está prevista “uma grande exposição que valorize as lojas com história”, prometeu o vereador. Tanto o projecto de Regulamento do Fundo Municipal como o referente ao Regulamento Municipal de Atribuição da Distinção “Lojas com História” foram ontem aprovados, com votos contra do CDS-PP e abstenção do PSD.

Duarte Cordeiro considera que a aprovação destes dois instrumentos associados é importante, nem que seja pelo sinal político transmitido ao resto do país de que deseja preservar os estabelecimentos históricos -“Lisboa dá um sinal muito importante, que será seguido por outros municípios”, afirma, confiante. Mas o autarca frisa também a importância vital da reversão do enquadramento legal criado pelo anterior Governo.

“O programa Lojas com História é importante para Lisboa, independentemente das alterações legislativas que vierem a ser aprovadas. Mas, não tenhamos ilusões, sem elas, o nível de protecção que temos é bastante insuficiente face ao conjunto de fenómenos ao conjunto de situações a acontecer na cidade, relacionadas com a lei do arrendamento e o quadro legal relativo a obras profundas em prédios arrendados”, destacou.

Sobre esta questão, aliás, gerou-se um consenso à esquerda. Tanto o PCP, pela voz do deputado municipal Carlos Santos Silva, como o Bloco de Esquerda, através da eleita Cristina Andrade, apontaram as modificações à lei do arrendamento realizadas por iniciativa de Assunção Cristas como as grandes responsáveis pelo encerramento maciço de lojas consideradas históricas. Apenas diferiram ligeiramente na categorização dos fenómenos que, no seu entender, ajudam a fechar o cerco aos donos das lojas. Se os comunistas denunciaram “o movimento especulativo” sentido na cidade, os bloquistas denunciaram o “processo de gentrificação” em curso. Os deputados dos restantes partidos não se pronunciaram sobre a matéria.


Texto: Samuel Alemão


Programa Lojas com História de Lisboa finalmente aprovado (com avisos ao Parlamento)
Depois de longa discussão, vai por fim avançar a distinção às lojas mais emblemáticas de Lisboa. A câmara e os deputados municipais insistem na alteração à Lei das Rendas.

JOÃO PEDRO PINCHA 31 de Janeiro de 2017, 20:20

Quase dois anos depois de ter sido lançado, o programa Lojas com História foi finalmente aprovado esta terça-feira na Assembleia Municipal de Lisboa. O regulamento, que define as regras para que os espaços comerciais da cidade se possam candidatar a esta distinção, foi elogiado pelos partidos de esquerda e só teve o voto contra do CDS.

A líder deste partido, aliás, foi alvo de várias críticas, embora o nome de Assunção Cristas não tenha sido referido na reunião. “Se está a haver despejos [de lojas] não se deve ao município, mas sim aos autores da Lei do Arrendamento”, disse o vice-presidente da Câmara Municipal de Lisboa, responsável pelo programa agora aprovado na generalidade. Como já fez noutras ocasiões, Duarte Cordeiro criticou a actuação de Cristas enquanto ministra por ter criado, em 2012, o Novo Regime de Arrendamento Urbano (NRAU), que levou à “desprotecção” do comércio tradicional. “Essa lei do arrendamento tem autores e nós queremos, efectivamente, corrigi-la”, afirmou.

Também o PCP e o Bloco de Esquerda apontaram baterias à legislação do anterior Governo. “A lei das rendas tem aqui, claramente visto, um efeito terrível para a cidade”, declarou o comunista Carlos Silva Santos. “Consideramos essencial que ela seja revista”, afirmou depois a bloquista Cristina Andrade.

Nos últimos anos foram dezenas as lojas e restaurantes emblemáticos de Lisboa que fecharam. Em alguns casos, os proprietários dos edifícios – frequentemente fundos imobiliários estrangeiros - despejaram os espaços comerciais para fazer obras profundas. Noutros, as rendas aumentaram exponencialmente. Noutros ainda, os contratos de arrendamento não foram renovados.

“Temos consciência de que isto é uma corrida contra o tempo”, disse Duarte Cordeiro, destacando que as regras agora aprovadas permitem uma “classificação exigente” das lojas, algo que não chega para as salvar de um eventual fecho. “Não tenhamos ilusões. Sem alterações legislativas, o nível de protecção é bastante insuficiente”, alertou.

O Parlamento, por iniciativa de um conjunto de deputados do PS, está a discutir um projecto-lei sobre este tema há quase um ano. O documento está na Comissão de Ambiente, Ordenamento do Território, Descentralização, Poder Local e Habitação desde Abril, mas a câmara espera que a legislação avance rapidamente. Com a aprovação deste regulamento é dado “um sinal claro ao legislador” de que estas lojas “merecem ser protegidas”.

A autarquia definiu em Julho de 2016 o primeiro grupo de 63 Lojas com História, que agora – após discussão na especialidade do regulamento aprovado esta terça – vão receber um galardão especial, além de passarem a constar de um site criado para o efeito. A partir deste momento, outras lojas vão poder candidatar-se à distinção. A câmara quer escolher, brevemente, mais 20 espaços.

Paralelamente foi também aprovada a criação de um fundo municipal de 250 mil euros destinado a apoiar as lojas classificadas na preservação de património, na modernização da actividade e na criação de programas culturais, por exemplo. “Abre-se hoje definitivamente uma nova janela de esperança nesta urbe tão amada”, declarou a deputada independente Ana Gaspar. “Acho que estamos todos de parabéns.”

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