domingo, 24 de abril de 2016

Estadia temporária. Partida definitiva. É o urbanismo estúpido! / ANTÓNIO SÉRGIO ROSA DE CARVALHO


Estadia temporária. Partida definitiva. É o urbanismo estúpido!
ANTÓNIO SÉRGIO ROSA DE CARVALHO 20/04/2016 - PÚBLICO
Não se trata só de cobrar taxa turística. Trata-se de impor regras rigorosas de limite de ocupação e fiscalizá-las.

Embalado e estimulado pela notícia positiva do possível adiamento da Lei das Rendas para lojas de reconhecido valor histórico até 2027, e depois do anúncio da intenção de criar alojamentos comportáveis para jovens e “classe média”, Fernando Medina entrou, através de uma entrevista, em pré-campanha eleitoral.

Na linha destes acontecimentos, o Vereador das Finanças da CML veio anunciar em tom triunfante que a AIRBNB responsável por 90% da ocupação temporária em Lisboa com 1 milhão de reservas em 2015, iria cobrar, tal como os hotéis, taxa turística.

João Paulo Saraiva refere-se a Amsterdão dizendo que a mesma cidade não tem qualquer problema com o pagamento da taxa.

Mas, caro Vereador, não se trata só de cobrar taxa turística. Trata-se de impor regras rigorosas de limite de ocupação e fiscalizá-las.

Trata-se de controlar o efeito devastador da Turistificação e Ocupação temporária na Identidade e Autenticidade das cidades, associado ao direito à Habitação Permanente para os Residentes e Populações Locais.

O regulamento em Amsterdão estabelece que o período máximo de oferta de um alojamento por Ano é de 60 dias. O número máximo de hóspedes é de 4 pessoas (não apenas por alojamento mas por edifício). O alojamento tem que garantir segurança e a instalação de um sistema de prevenção e combate a incêndio é obrigatório. Os hóspedes não podem ser fonte de incómodo para a vizinhança e a envolvente. A autorização do Proprietário é necessária. Aquele que disponibiliza o alojamento para aluguer tem que pagar 5,5% como Imposto Turístico e declarar os seus rendimentos aos Impostos (a própria AIRBNB cobra pelos seus serviços 6 a 12 % sobre a quantia paga pelo hóspede).

Comparar com a versão Portuguesa que entrou em vigor a 27 de Novembro de 2014. “Em Portugal, não se impede que as casas estejam exclusivamente destinadas a este efeito, não se limitam períodos de estadia, não se limita o número de apartamentos que uma pessoa pode ter no mercado, não se estabelecem obrigações de prestação de serviços no apartamento, não se impõem capacidades máximas nem números de equipamentos a constar do apartamento. Um regime muito mais aberto do que em Madrid ou Barcelona ou Amesterdão, portanto.” Dinheiro Vivo, 12-9-2014).

Tudo isto vem a propósito de que as pequenas mas importantes vitórias alcançadas por anos de luta e pressão por parte da Sociedade Civil e respectivas correcções posteriormente feitas pelos Autarcas, muitas vezes por inexperiência, atenuam a consciência que todos estes temas, embora muito importantes, constituem “satélites”, reflexos e consequências de um Planeta principal, onde o âmago da questão reside: as opções estratégicas e as escolhas da Política Urbanística determinada pelo Vereador do Urbanismo.

É neste sentido que é com preocupação e consternação que assistimos à partida de José António Cerejo em direcção a uma mais do que merecida reforma.

José António Cerejo desenvolveu ao longo dos anos um trabalho jornalístico idiossincrático, único, rigoroso e baseado na incontornável argumentação dos factos, esta garantida e baseada em rigoroso estudo e investigação.

Com uma tenacidade e coragem únicas, garantidas por uma total Independência, José António Cerejo confrontou muitos e poderosos com o rigor dos factos e da realidade, sempre em busca da Verdade.

Ele, sim, vai fazer muita falta!

O seu percurso, irá sempre relembrar-nos perante a nossa inexperiência:

É o urbanismo estúpido!


Historiador de Arquitectura

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