Nova
desvalorização do yuan aumenta pressão nas empresas exportadoras
da UE
CAMILO SOLDADO
12/08/2015 - PÚBLICO
China
volta a depreciar a moeda e afecta bolsas mundiais.
Depois de na
terça-feira o Banco Popular da China (BPC) ter descido a taxa de
referência do yuan naquela que foi maior depreciação da moeda em
mais de 20 anos, a instituição voltou a fazê-lo hoje.
Nesta quarta-feira,
o banco central chinês fixou a taxa diária do yuan face ao dólar
em 6,3306, o que significa um ajuste de 1,6%. Já na terça-feira o
yuan tinha sido desvalorizado em 1,9%, passando para uma taxa diária
de 6,2298 yuan face ao dólar, quando na segunda-feira o preço
imposto se fixava nos 6,1162.
A mexida na taxa de
referência foi recebida com surpresa pelos mercados, mas o BPC
anunciou que não iria repetir a medida no futuro. Um dia depois,
Pequim voltou a depreciar o yuan, levantando preocupações sobre a
performance da economia chinesa.
À Reuters, um
membro não identificado de um think-tank chinês que aconselha
membros do governo disse que o yuan tinha ainda margem para perder um
acumulado de 10%. “Deve haver depreciação suficiente, de outra
forma não será possível estimular as exportações”, afirmou.
Esta quinta-feira, o
BPC vai dar uma conferência de imprensa, ao longo da qual são
esperados mais esclarecimentos.
Pequim estima que a
economia cresça a um ritmo de 7% em 2015, o mais baixo em décadas,
mas uma nova depreciação da moeda levanta preocupações sobre a
capacidade de o país atingir essa meta. Nesta quarta-feira, os
indicadores tornados públicos mostram que o desempenho da economia
voltou a desiludir, com um crescimento de 6%.
Na quarta-feira, as
principais empresas exportadoras para aquele país voltaram a acusar
o cenário desanimador e viram as suas cotações em bolsa cair. O
gigante asiático constitui o segundo maior mercado de destino dos
produtos europeus, apenas atrás dos Estados Unidos. De acordo com
números do Eurostat, a China foi o destinatário de 14% da indústria
exportadora da União Europeia. Com nova desvalorização, a pressão
acentuou-se.
Na análise à
surpreendente medida do BPC, as consequências previsíveis da queda
do yuan passam pelo impulso das exportações, com os preço dos
produtos chineses a diminuir, por oposição ao encarecimento dos
produtos importados, o que reduz o poder de compra dos chineses.
Com a emergente
classe média chinesa a perder poder de compra, é previsível que se
registe uma quebra na procura por produtos de luxo, carros,
tecnologia (entre outros) que a China ia adquirir principalmente nos
mercados europeu e norte-americano. As últimas duas sessões do
índice Euro Stoxx 50 confirmam esta lógica e espelham o receio dos
investidores.
A liderar as perdas
na sessão de quarta-feira estavam a Unilever (produtos de grande
consumo), a descer 6,31%, e a LVMH (holding especializada em produtos
de luxo, responsável por marcas como Louis Vuitton ou Moët et
Chandon) a cair 5,46%. Todas as empresas deste índice fecharam o dia
em terreno negativo. As grandes companhias europeias beneficiavam de
um euro mais enfraquecido face ao yuan, cenário que se inverte com a
intervenção do BPC.
Com a venda de
carros no mercado chinês acelerar para uma queda de 6,6% em Julho,
depois de já ter declinado 3,4% em Junho, a indústria automóvel
também perde na bolsa. A Daimler (Mercedes, Smart) foi penalizada em
4,87% na sessão desta quarta-feira, enquanto o grupo Volkswagen
(Volkswagen, Audi, Bentley, Bugatti) viu a cotação diminuir 3,26%
(em dois dias foi de -6,8%, ou 13 euros).
Paris, Frankfurt,
Madrid, Milão e Londres. As principais praças europeias encerraram
em queda, arrastadas pelas perspectivas de menores oportunidades de
negócio no mercado chinês. Lisboa não escapou às congéneres
europeias, com o PSI-20 a fechar 1,13% em terreno negativo.
A fábrica da
Volkswagen de Palmela aumentou as exportações 12% em 2014, muito
impulsionada pelas vendas para o mercado chinês (à semelhança das
grupo alemão). Dos 101 mil carros construídos no ano passado, a
Autoeuropa vendeu 24 mil para a China, o seu maior destino fora da
União Europeia.
No caso de Portugal,
apesar do aumento das vendas para a China (onde o impulso da
Autoeuropa ajudou), o défice comercial tem crescido. No primeiro
semestre deste ano, estava nos -395 milhões de euros, mais 13% face
a idêntico período de 2014. Com os recentes desenvolvimentos, é
possível um agravamento deste desequilíbrio.
A moeda chinesa
funciona num regime de valorização ou desvalorização deslizante,
o que significa que, todos os dias, Pequim fixa uma taxa de câmbio
do yuan face ao dólar, permitindo que a moeda flutue 2% ao longo da
sessão.
Nos últimos meses,
a taxa fixada pelas autoridades chinesas mantinha-se relativamente
estável face ao dólar, mas esta intervenção pelo segundo dia
consecutivo vem aumentar os receios de que o BPC não esteja apenas a
ajustar o valor da moeda ao desempenho do mercado, mas a manter o
yuan propositadamente fraco.
Nas reacções
oficiais, Comissão Europeia e Departamento do Tesouro avaliaram esta
intervenção como positiva, ao considerar que a depreciação do
yuan reflecte a queda da economia chinesa. No entanto, os EUA
expressaram preocupação quanto à evolução da intervenção
estatal chinesa.
A Reuters dá conta
de duas correntes no aparelho governamental. Por um lado, o banco
central chinês aponta para alicerçar o crescimento económico no
reforço do consumo interno. Por outro, o Ministério do Comércio dá
preferência à desvalorização da moeda, que apoia as empresas
exportadoras, num modelo de crescimento que tem até agora sido
seguida por Pequim. A agência refere que o BPC está sobre pressão
do executivo para baixar ainda mais a taxa de referência yuan/dólar
nos próximos meses.
Em Setembro, o
presidente chinês Xi Jinping realiza a primeira visita oficial aos
Estados Unidos, onde será recebido pelo homólogo Barack Obama e
onde a política cambial será seguramente um dos temas. Em Outubro,
será a vez dos principais responsáveis chineses definirem o
objectivo de crescimento económico para os próximos cinco anos.
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