O reinado
dos turistas
Mas a
Carris não é só autocarros e quando se muda de meio de transporte, também os
problemas mudam. E agravam-se.
Do Martim
Moniz aos Prazeres, o eléctrico 28 parece passar pelos séculos de história da
cidade. A embarcar no Chiado, Álvaro, assessor de profissão e que realiza
aquele percurso há 10 anos, nota que a afluência de passageiros aumenta a cada
ano que passa. “No Verão é ainda mais complicado e, simultaneamente, parece
haver menos eléctricos”.
A média de
passageiros desta carreira atingiu os 4,6 milhões nos últimos quatro anos, de
acordo com a Carris. Às 11h, o transporte transborda pelas costuras e todos, à
excepção de Álvaro, são estrangeiros, algo que se mantém durante todo o
percurso. Quando chega às diferentes paragens, há uma notória impossibilidade
de entrar, pelo que os novos passageiros têm de se acotovelar para o
conseguirem fazer.
O percurso
é, no entanto, cénico. O historiador José-Augusto França deu conta, ao dedicar
uma crónica à carreira, que ela abrange “dez igrejas, oito conventos que foram,
meia dúzia de prédios de destaque, seis jardins, uma dezena e meia de estátuas,
dez teatros e cinema de que só restam dois”, tornando a experiência muito
apelativa para os turistas.
O problema
põe-se para os moradores da área, muitos deles de idade avançada e que, nalguns
casos, não têm outro modo de transporte ou este fica-lhes mais distante.
Manuel, de 73 anos, habita perto da zona da Graça mas hoje em dia deixou de
conseguir entrar nos eléctricos que sempre usou. “Utilizo a Carris há cerca de
55 anos. Antigamente era ávido utilizador de eléctricos mas agora que estes
estão sempre apinhados uso os autocarros”, afirma, agarrando a sua bengala com
as duas mãos.
Habitante
de Lisboa toda a sua vida, utilizou eléctricos para ir para a faculdade e
depois para o emprego. Agora, com a subida de preços para o transporte que
considera “de turistas”, conforma-se com os autocarros que, além de serem
poucos, páram mais longe de sua casa.
Já em Campo
de Ourique, a última paragem onde é feito o transbordo, Ana de 72 anos, espera
com o seu neto o eléctrico 25, que os levará até à Praça da Figueira. Enquanto
ajusta a mala à volta do ombro, desvenda um truque: “Evito apanhar o 28 pois é
realmente insuportável mas a esta hora começa a ficar mais razoável - é que os
turistas vão almoçar".
Ana comenta
que o serviço não se adaptou ao aumento de estrangeiros na cidade. “Tinha
de ter em conta o aumento de gente que chega de fora. Como está, é um serviço mal organizado, uma
pena”, conclui.
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