sexta-feira, 1 de abril de 2016

Outra drogaria fechou portas no Chiado para dar lugar a turistas e a loja gourmet


 Um encerramento que acontece no mesmo dia do fecho da Drogaria Pereira Leão, na Rua da Prata, e pelos mesmos motivos: rentabilizar o imobiliário respondendo à demanda turística.




Outra drogaria fechou portas no Chiado para dar lugar a turistas e a loja gourmet
Um encerramento que acontece no mesmo dia do fecho da Drogaria Pereira Leão, na Rua da Prata, e pelos mesmos motivos: rentabilizar o imobiliário respondendo à demanda turística.
POR O CORVO • 1 ABRIL, 2016 •
Texto: Samuel Alemão / Fotografias: Luísa Ferreira

O desfecho era já conhecido das funcionárias, “há cerca de um ano e tal”. Mas a tristeza quase conformada de Rute Peixe, 32 anos, e de Maria José, 57, parecia ontem difícil de esconder, apesar dos sorrisos. Ambas trabalhavam na loja há praticamente uma década e, juntamente com uma outra, Maria da Luz, 51, a partir desta sexta-feira (1 de abril), já estarão no fundo de desemprego. Um encerramento que acontece no mesmo dia do fecho da Drogaria Pereira Leão, na Rua da Prata, e pelos mesmos motivos: rentabilizar o imobiliário respondendo à demanda turística.

Ao princípio da tarde, atrás do balcão da Drogaria do Loreto, no número 62 da Rua do Loreto, as duas funcionárias iam atendendo as solicitações dos clientes que aproveitavam as promoções oferecidas no último dia de actividade da loja, situada às portas do Bairro Alto. “É um dia triste para nós, claro. Demos aqui muito do nosso tempo, muita da nossa dedicação, muito amor”, desabafa ao Corvo Rute, que tem dois filhos – um de dez anos e outro de oito meses – e o marido também desempregado, há cerca de mês e meio.

Mas tais preocupações pouco diziam a quem entrava ontem na loja. “As coisas têm-se vendido bem. As pessoas querem barato, claro. Há uma promoção, entram para ver. Até nós andamos sempre atentas às promoções, como é natural”, reconhece Maria José.

O prédio vai agora ser convertido num conjunto de alojamentos para turistas, estando ainda prevista a abertura no rés-do-chão de duas lojas mais de acordo com o gosto do momento. A drogaria deverá ser ocupada por uma loja gourmet, enquanto a loja ao lado, onde até há alguns meses funcionou uma papelaria-tabacaria onde se vendia alguma da melhor imprensa internacional, deverá dar lugar a uma gelataria. As obras começarão em breve, prevendo-se a sua conclusão até ao final deste ano.

Tudo isto fará parte do Edifício Officina Real, um dos quatro empreendimentos anunciados recentemente para o centro de Lisboa pela Almaria, a marca criada pela Parimob – Investimentos Imobiliários para apostar na reabilitação urbana na capital portuguesa. A empresa, que é presidida por Ana Maria Martins Caetano, filha de Salvador Caetano, gastou 15 milhões de euros nesses projectos situados na zonas do Chiado/Corpo Santo e Santos.

No sítio da Almaria, pode ler-se que o Edifício Officina Real será constituído por 11 apartamentos nas tipologias T1 e T1+1, destinados a arrendamento de curta duração. “O edifício, que acolheu em tempos as oficinas que estanhavam as loiças da Casa Real, deve o seu nome a este passado, o qual será evidenciado em todo o projeto”, explica-se, adiantando-se ainda que, na sua nova vida, “os apartamentos estão decorados, mobiliados e equipados, integrando todas as facilidades para proporcionar uma estadia diferenciada aos seus hóspedes”.

Uma situação que tanto Rute Peixe como Maria José julgam não fazer sentido. “Qualquer dia, os turistas vêm cá e perguntam uns aos outros ‘O que é que viste em Lisboa?’ e a resposta é ‘Olha, vi lojas gourmet e hostels’”, ironiza Rute, considerando que esta estratégia de aposta massiva no turismo é pouco inteligente, até porque muitos dos turistas são clientes do comércio tradicional, como acontecia com esta drogaria, onde procuravam sobretudo produtos portugueses, como os sabonetes. “Além disso, até podiam abrir o hostel em cima, mantendo as lojas em baixo”, sugere.



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