quinta-feira, 1 de julho de 2021

Acidente com carro de Cabrita: Todas as contradições de uma morte anunciada com versões diferentes

 


Acidente com carro de Cabrita: Todas as contradições de uma morte anunciada com versões diferentes

01.07.2021 às 08h15

RITA RATO NUNES

JORNALISTA

https://visao.sapo.pt/atualidade/politica/2021-07-01-acidente-com-carro-de-cabrita-todas-as-contradicoes-de-uma-morte-anunciada-com-versoes-diferentes/?fbclid=IwAR0-ZOMwjQ6zX0wpnjl_Vn2WcQjr-Nbpn7HQBfn44bNv-yQCKUGKbUgmrv4

 


Há duas semanas, um acidente na A6, que envolveu o carro onde seguia o ministro Eduardo Cabrita, fez uma vítima mortal - o trabalhador de uma obra, que estaria a atravessar a estrada, no momento da colisão. A tutela, antes de se remeter ao silêncio, argumentou que a obra não estava sinalizada, mas a concessionária da autoestrada (Brisa) desmente. A investigação decorre, mas este não é o único facto por explicar

 

As perguntas são mais do que as respostas: a que velocidade seguia o carro do ministério da Administração Interna (MAI), no dia 18 de junho, quando chocou, na A6, contra um trabalhador das obras que estaria a atravessar a estrada? A obra estava ou não sinalizada? Porque ia o carro numa faixa da esquerda, sem trânsito? O ministro Eduardo Cabrita – que seguia no banco de trás do carro – não responde. Mesmo instado pelo Presidente da República, remeteu-se ao silêncio até à conclusão da investigação aberta pelo Ministério Público ao acidente. Fica apenas a garantia deixada por Marcelo Rebelo de Sousa, nesta quarta-feira: “Essa investigação não deve depender de saber se a A ou B ou C ia a conduzir, ao lado ou atrás do condutor. O que for apurado, é apurado”.

 

Cronologia dos acontecimentos

 

18 de junho: Um acidente e uma vítima

 

A informação sobre o acidente ao quilómetro 77 da A6 – que liga a Marateca à fronteira do Caia, em Elas (Portalegre), – chega às redações através de um comunicado do ministério da Administração Interna, onde se lamenta a morte de um cidadão (um homem de 43 anos), que realizava trabalhos de limpeza na berma da autoestrada.

 

Nas primeiras horas, fonte da GNR ainda chega a assegurar, ao jornal Observador e replicado nas televisões, que Eduardo Cabrita não seguia no carro. Notícia que viria a ser desmentida pouco depois. O ministro regressava de uma deslocação oficial a Portalegre. A tutela esclarece ainda, neste dia, que não se tratou de um despiste da viatura, que “circulava na faixa de rodagem, de onde nunca saiu, quando o trabalhador a atravessava”, e que a obra em causa não estava assinalada [versão que viria a ser desmentida pela Brisa, a 29 de junho].

 

18 de junho: Investigações em curso

 

No mesmo dia, o Núcleo de Investigação Criminal de Acidentes de Viação da GNR de Évora deslocou-se ao local e abriu um inquérito, que ainda não está concluído, confirmou a Visão junto da GNR. Mas que deverá ter em conta a velocidade a que ia o carro do MAI (informação desconhecida para já). Outro dado que esta investigação deverá esclarecer é o facto de a viatura estar a circular na faixa mais à esquerda, quando havia pouco trânsito. É deste lado (o esquerdo) que ficou a marca da amolgadela no carro; sendo que o acidente aconteceu junto ao separador central. No entanto, não há câmaras de vigilância que o comprovem, uma vez que a câmara mais próxima localiza-se ao quilómetro 76.

 

Para além da GNR, também abriram inquéritos o Ministério Público, para apurar as circunstâncias da morte (procedimento habitual em acidentes rodoviários com vítimas mortais), e o Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) para averiguar as circunstâncias em que foi prestado o socorro à vítima.

 

28 de junho: Oposição pede explicações

 

O líder do PSD, Rui Rio, pede esclarecimentos urgentes quanto ao acidente e responsabiliza o primeiro-ministro por aquilo que “vão sendo as falhas” de Eduardo Cabrita. Junta-se assim ao CDS, que pede a demissão do ministro, caso seja apurado que o carro onde seguia ia em excesso de velocidade.

 

29 de junho: Brisa garante sinalização da obra

 

Em comunicado, a empresa concessionária da autoestrada declara que – ao contrário do que a tutela referiu inicialmente – a “sinalização dos trabalhos de limpeza realizados na berma direita da A6 estava a ser cumprida pela ArquiJardim”, a empresa responsável pela intervenção, e que a sinalização estaria de acordo com “os procedimentos de segurança adequados”. Contactada pela Visão, a ArquiJardim reafirmou a sinalização da obra, mas não quis prestar mais declarações.

 

30 de junho: “Velocidade louca”

 

Um dos colegas da vítima, que assistiu ao acidente, descreve, ao Correio da Manhã, que o carro do MAI vinha com uma “velocidade louca”. A mesma testemunha garante que a sinalização estava feita e que o colega vestia um colete refletor, acrescentando que tanto o ministro como o motorista nunca chegaram a sair do carro.

 

30 de junho: MAI em silêncio

 

Questionado pela Visão sobre a velocidade a que seguia o carro e a garantia de sinalização da obra, por parte da empresa, o ministério indica que “não tem nada a acrescentar aos esclarecimentos públicos já prestados”. Pela hora de almoço, Cabrita é encurralado pelos jornalistas, no final de uma visita à Unidade Especial de Polícia, no concelho de Sintra, e estes pedem-lhe, mais uma vez, para comentar a evolução do caso, mas o ministro remete-se ao silêncio, apontando que não seria o “momento adequado”.

 

Já Marcelo Rebelo de Sousa, que se encontrava ao seu lado, não deixa de comentar o caso, dizendo que espera pelas conclusões da investigação e deixa a garantia de que esta não será mais branda por estar envolvido um governante. “ Essa investigação, a meu ver, não deve depender de saber se a A ou B ou C ia a conduzir ou ao lado do condutor ou atrás do condutor. É apurado, é apurado, o que for apurado é apurado”, referiu.

 

01 de julho: “Ordem Superior”

 

Segundo o Correio da Manhã, quando os elementos do Núcleo de Investigação Criminal a Acidentes de Viação da GNR de Évora quiseram fazer novas diligências ao carro, foram impedidos “por ordem superior”. Os cálculos de estimativas feitas com base nos registos da Via Verde e das câmaras da A6 e a hora do acidente indiciam que o carro oficial do Ministro da Administração Interna circulava a uma velocidade média de 200 km/h.

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