terça-feira, 17 de janeiro de 2017

A novela da TSU é absolutamente patética


A novela da TSU é absolutamente patética
A deterioração da situação económica vai dar razão a Passos. Mas até por isso, convém que a comunicação do PSD assente na coerência ideológica, e não no amuo político.

João Miguel Tavares
17 de Janeiro de 2017, 6:47

Este caso em torno da diminuição da TSU é extraordinário: o PSD tem toda a razão no que está a querer fazer, patrocinar o aumento do salário mínimo com a diminuição da TSU é um absurdo, o chumbo da medida é mais do que justificado, só que as explicações do partido têm sido tão atabalhoadas e tão pouco focadas no essencial que o PSD consegue o prodígio de fazer de mau da fita num filme onde nem sequer deveria ter entrado. É ridículo. É injusto. Mas, sobretudo, é estúpido. Bloco e PCP colocaram ao lume uma panela onde deveria ir a cozer António Costa e, de repente, quem cai lá para dentro é Passos Coelho.

O PSD não pode, nem deve, justificar o chumbo da diminuição da TSU com o facto de não fazer favores ao governo. Com este tipo de argumentos é facílimo passar a ideia de um partido oportunista que, na verdade, concorda com a medida, só que em vez de beneficiar o país prefere lixar António Costa. Espantosamente, a justificação cínica foi a primeira coisa que saiu da boca dos sociais-democratas. Luís Montenegro disse que “o PSD não funciona como bombeiro de serviço da geringonça”. Passos Coelho, que tem tanto jeito para a ironia como eu para o bilhar às três tabelas, perguntou: “Vão andar sempre a pedir ao PSD para apoiar o Governo porque [Bloco e PCP] este ano estão de baixa, meteram folga?” Ora, a questão não está em ser ou não bombeiro, nem em fazer ou não as folgas dos outros –, a única questão que realmente importa e que deveria ter sido verbalizada é que o salário mínimo está a ser artificialmente aumentado ano após ano, sem acompanhar a produtividade do país, e que essa subida que tanto satisfaz a extrema esquerda está a pesar sobre o orçamento de Estado e sobre a Segurança Social, de forma a não comprometer a descida do desemprego.

Dir-me-ão: mas Luís Montenegro e Pedro Passos Coelho também usaram esses argumentos. Pois usaram, mas como, ao mesmo tempo, fizeram observações picantes sobre bombeiros e sobre folgas, os bombeiros e as folgas saltaram para os primeiros parágrafos de todas as notícias, enquanto as justificações substanciais ficaram como uma espécie de nota de rodapé que foi imediatamente triturada no espaço mediático. A actual direcção do PSD nunca foi muito popular entre os barões do partido e já se faz fila à direita para ficar com a sua cabeça. Marcelo Rebelo de Sousa, Marques Mendes, Manuela Ferreira Leite, Rui Rio, Paulo Rangel, Nuno Morais Sarmento, José Eduardo Martins, Pacheco Pereira, e até, segundo consta, Marco António Costa – todos eles tiraram senha para fazer a cama ao líder do PSD. Quando se soma aqueles que têm grande peso político àqueles que têm grande peso mediático, já dá para contar as facas nas costas e dormir de capacete.

Ainda assim, Passos Coelho tem um grande trunfo do seu lado: os nomes disponíveis para o substituir não são grande coisa e ninguém percebe que políticas alternativas iriam apresentar, já que todos eles estão mais perto, e não mais longe, de António Costa. Há ainda um outro trunfo, o maior de todos: a deterioração da situação económica vai dar razão a Passos. Mas até por isso, convém que a comunicação do PSD assente na coerência ideológica, e não no amuo político. O PSD deve chumbar a descida da TSU porque ela é uma medida errada; não deve chumbá-la por não querer apoiar o governo. Há uma diferença radical entre agir por convicção e agir por cinismo. Confundir uma coisa com a outra é um erro enorme, e Passos já tem idade para saber isso.

Jornalista

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