“Rule, Britannia! Britannia, rule the waves;
Britons never shall be slaves.”
(…) “Quando se confundem miragens soberanistas, impérios
imaginários e poderes que não existem num projecto transnacional como o
europeu, talvez esse destino seja irreversível.” (Manuel Carvalho)
O trecho em Inglês foi escolhido pelo OVOODOCORVO e é parte
do ‘Rule, Britannia!’
O Referendo ilustra as possíveis perigosas e caóticas
consequências quando a Política é deixada à Democracia Directa, numa época de
opiniões em turbilhão na Internet e incapacidade ou incompetência da classe
política, refém do ‘bafo quente no pescoço’ do Populismo, e crescente Nacionalismo.
Para além do impasse e do turbilhão erosivo do Brexit, a
sombra dos efeitos nos resultados das eleições
Europeias, espreita …
OVOODOCORVO
God Save UK
O Reino Unido entra numa das suas épocas mais sombrias.
Manuel Caravalho
15 de Janeiro de 2019, 22:00
Esperava-se que a primeira-ministra britânica, Theresa May,
sofresse esta terça-feira uma derrota na votação do acordo para a saída da
União Europeia pelo qual se bateu com uma obstinação notável. Mas não se
esperava que essa derrota fosse tão grande, tão profunda e tão dramática – foi
a maior derrota de um primeiro-ministro em Westminster da história recente.
Aconteça o que acontecer a seguir, os termos do acordo arduamente negociados
com Bruxelas estão enterrados. Vai ser preciso começar tudo de novo e é difícil
acreditar que as clivagens esta terça-feira reveladas pelo Parlamento britânico
permitam uma negociação aceitável pelos 27. O “Brexit” dificilmente poderá ser
suave depois do que aconteceu. Os piores pesadelos para o futuro do Continente,
Ilhas Britânicas incluídas, tornaram-se ainda mais reais.
O pessimismo sobre o futuro próximo tem como principal
alicerce tudo o que aconteceu no passado recente. Cumprir o espírito do
“Brexit”, em que o instinto soberanista e vagamente nacionalista do
isolacionismo britânico dominou, e ao mesmo tempo evitar rupturas nos alicerces
da relação que o Reino Unido construiu nas últimas cinco décadas com o
Continente era por si só uma missão impossível. O acordo que Theresa May
apresentou a votos era uma quadratura do círculo, uma tentativa desesperada de
vender os anéis para salvar os dedos. Os interesses económicos e os fantasmas
da violência na Irlanda do Norte impunham uma negociação que evitasse o
regresso de uma fronteira física. E para que isso acontecesse sem a criação de
uma alfândega imaginária no Mar da Irlanda, todo o país teria de seguir o
acordo sobre a preservação de uma união aduaneira. O acordo de May era uma
clara submissão ao pragmatismo da realpolitik. Mas era também um óbvio curativo
nas feridas do referendo de 2016.
Na barafunda que embrulha coragem, irresponsabilidade e
cinismo (capítulo no qual Jeremy Corbyn, que aproveitou o desastre para
censurar Theresa May, é imbatível), o Reino Unido vai querer agora impor a sua
vontade ao resto da Europa. Uma missão na qual está condenado a perder.
Resta-lhe o pior dos pesadelos: uma saída não negociada. Para um país habituado
às liberdades de circulação e à normalização europeias, o cenário que se
anuncia é um “desastre”, como reconhece o secretário da Economia. Quando se confundem
miragens soberanistas, impérios imaginários e poderes que não existem num
projecto transnacional como o europeu, talvez esse destino seja irreversível. O
Reino Unido entra numa das suas épocas mais sombrias. Como escrevemos na nossa
capa da edição impressa de quarta-feira, por imitação do mote do hino nacional
britânico, God Save UK (Deus salve o Reino Unido).
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