Obras do metro e à superfície na Praça do Chile só
terminarão em 2021 e, por isso, comerciantes da zona desesperam
Obras do metro e à superfície na Praça do Chile só
terminarão em 2021 e, por isso, comerciantes da zona desesperam
Sofia Cristino
Texto
16 Janeiro, 2019
Os lojistas, prejudicados pelo atraso das obras da estação
de metro de Arroios, estão muito apreensivos com o futuro dos seus negócios. A
preocupação agravou-se, na semana passada, quando souberam que o Metro de
Lisboa rescindiu o contrato com o empreiteiro responsável pela obra. Exigem,
por isso, ser reembolsados pelos danos causados. Na última reunião
descentralizada da Câmara Municipal de Lisboa, o executivo prometeu avançar com
a isenção de taxas de ocupação de espaço público e de publicidade. Mas o CDS-PP
quer ir mais longe e, na tarde desta terça-feira (15 de Janeiro), a vereadora
Assunção Cristas propôs que os comerciantes sejam isentos destas taxas
retroactivamente, até ao momento em que os tapumes foram colocados, em Julho de
2017. Cristas acusa a Câmara de Lisboa de não comunicar com a empresa de
transportes e critica o presidente da autarquia, Fernando Medina (PS), de só
estar preocupado com a futura Linha Circular.
Junto ao estaleiro de obras da estação de metro de Arroios,
na Praça do Chile, a tabacaria Órbita está fechada para férias há três meses.
“Já não volta a abrir”, lamenta Carla Salsinha, proprietária da loja de noivas,
logo ao lado. O comentário surge minutos antes de Assunção Cristas, vereadora
do CDS-PP, visitar os estabelecimentos afectados pela paragem da empreitada do
metro de Arroios. A infra-estrutura foi encerrada a 19 de Julho de 2017 para
obras de requalificação profundas, mas a empreitada só avançaria em Outubro
desse ano, devido a problemas financeiros do empreiteiro. A mesma debilidade
económica da empresa de construção civil levou agora o Metro de Lisboa a
rescindir o contrato e a data de conclusão, inicialmente prevista para este mês
de Janeiro, deverá derrapar ainda mais. Mas não se sabe até quando.
Segundo Carla Salsinha, ainda estará por concluir 80% da
obra e a empreitada deverá estar parada até Maio. “Se tudo correr bem, ainda
teremos de esperar três a quatro meses para se conhecer o resultado do concurso
público para a nova empresa. Depois de concluída, a Câmara de Lisboa ainda vai
requalificar a Praça do Chile, uma intervenção que deverá demorar cinco meses.
Prevemos a conclusão de tudo lá para 2021”, conjectura a também ex-presidente
da União da Associação de Comerciantes e Serviços (UACS).
À volta da empresária
vão-se juntando outros comerciantes lesados pelos atrasos das obras do metro
naquela zona, onde cerca de vinte lojas terão fechado, com queixas semelhantes.
Jorge Santos, proprietário do supermercado Japão, na Rua Morais Soares, sente-se
cansado. “Trabalho desde os 14 anos, fartei-me de trabalhar e chego ao fim da
vida com um problema às costas. Tenho dez funcionários, se fecho a loja, como é
que os vou indemnizar? O que é que o Governo quer fazer? Só há duas lojas
portuguesas na Morais Soares, acha isto normal?”, questiona directamente
Assunção Cristas.
A vereadora do CDS-PP vai ouvindo os lamentos dos lojistas,
à frente do antigo hospital de Arroios, o local marcado para o início da visita
aos espaços comerciais mais afectados. É de lá que parte para a Rua Morais
Soares, onde a informação de “liquidação total” numa loja de vestuário chama a
atenção da comitiva do CDS-PP. O estabelecimento, ali há 26 anos, também vai
encerrar. “Modificámos a loja, passamos a vender, além de roupa, lençóis e
outros artigos têxteis e decorativos, mas não foi suficiente. As obras do metro
agravaram o estado do nosso negócio, mas sabemos que não foi só isso, o poder
de compra das pessoas também diminuiu e surgiram novas lojas”, diz, conformado,
Manuel Conde, proprietário da Condestaque.
Ao chegar ao estaleiro de obras, o cenário começa a piorar.
Os tapumes estão grafitados e partidos, há lixo acumulado, e só sobrevive uma
churrasqueira e uma casa de sandes, onde os comerciantes estão visivelmente
mais transtornados. A perfumaria, onde O Corvo esteve em Outubro passado, deu
lugar a um barbeiro. E a loja de roupa para crianças permanece encerrada.
Cidália Ferreira, funcionária da churrasqueira, recebe Assunção Cristas sem
alaridos. “Temos clientes que acham que fechámos, quando bastava tirarem estes
tapumes da nossa frente. Isto não faz sentido nenhum, não sei o que querem que
diga mais”, desabafa.
No final da visita,
em declarações aos jornalistas, Assunção Cristas garante acompanhar “há muito
tempo” as preocupações destes comerciantes e propõe a isenção retroactiva de
taxas de ocupação de espaço público e de publicidade dos estabelecimentos
comerciais até ao momento em que os tapumes foram colocados, em Julho de 2017.
A 28 de Dezembro, recorda a vereadora do CDS-PP, foi aprovada, por unanimidade,
pela Assembleia de Freguesia de Arroios, uma recomendação apresentada pelos
eleitos do CDS/PP, visando a exoneração destes valores. “A isenção ainda não se
verificou e, por isso, vamos continuar a insistir junto da Câmara de Lisboa.
Infelizmente temos um presidente de câmara que gosta de aparecer em todas as
notícias de expansão do metro, mas não tem tempo para vir à rua falar com os
comerciantes e inteirar-se do que estão a viver. Se o tivesse feito, não tenho
dúvidas de que já teria avançado com a isenção das taxas e reembolsado estes
comerciantes”, afirma.
A vereadora centrista
acusa ainda a Câmara de Lisboa de não comunicar com a empresa de transportes,
tendo assim responsabilidades no agravamento do problema. E criticou ainda a
falta de programação das obras e de comunicação atempada aos comerciantes para
se prepararem para este “embate”. “A degradação do espaço público e da higiene,
a insegurança e a falta de planeamento, são questões que estão relacionadas com
a falta de comunicação e atenção ao impacto negativo que estas obras podem ter.
Creio que já é responsabilidade directa da própria câmara, que tem obrigação de
se articular com o metro”, considera.
Questionada por O
Corvo sobre o facto de também o atraso nas obras do metro do Areeiro estar
relacionado com dificuldades financeiras do empreiteiro, Assunção Cristas diz
que, para cada um dos casos, “haverá circunstâncias que têm de ser apuradas”.
“Há um padrão que se repete e a nossa preocupação é garantir que o Metro de
Lisboa se responsabilize pelos danos que causa a toda uma rede de comércio, que
precisa de se manter viva. Tem de ser feito com planeamento e, quando não se
cumpre, é preciso compensar as pessoas. Seria muito justo o Metro indemnizar
estes comerciantes, dadas as circunstâncias que estão a viver”, frisa.
A líder centrista
aproveitou o momento para criticar a opção de expansão do metro através de uma
rede circular, propondo alternativas. “Sugerimos a expansão para a zona
ocidental, onde há muita população sem acesso ao Metro, para retirar uma grande
parte dos 400 mil automóveis que, todos os dias, entram na cidade. A futura
linha circular não resolve nenhum problema estrutural de mobilidade na cidade.
O Governo anuncia expansões do Metro, mas não trata desta situação em concreto,
que está a afectar um dos corações comerciais da cidade”, critica.
Na última reunião
descentralizada da autarquia, no passado dia 9 de Janeiro, Carla Salsinha
voltou a criticar o atraso das obras e questionou a autarquia sobre a isenção
das taxas publicitárias aos comerciantes, já sugerida pela própria lojista em
Abril do ano passado. Em resposta à lojista, o vereador das Finanças, João
Paulo Saraiva, admitiu a “incapacidade que a câmara teve de responder, até
hoje, aos comerciantes de forma cabal” e mostrou-se disponível para apresentar,
na próxima reunião de câmara, uma proposta de alteração do regulamento das
taxas que permita à Junta de Freguesia de Arroios intervir com a isenção destes
valores.
Na mesma reunião, o vereador da Mobilidade, Miguel Gaspar,
disse ter sido informado, na quarta-feira passada, que o Metro de Lisboa havia
enviado uma carta ao empreiteiro da obra para com ele rescindir o contrato. Os
motivos alegados para tal decisão da empresa pública foram a falta de
capacidade de resposta às obrigações contratuais e o atraso ter chegado a uma
situação “limite”. “O Metro de Lisboa terá, portanto, de encontrar um novo
empreiteiro que tome conta da obra”, admitiu Miguel Gaspar.
No passado mês de
Outubro, os comerciantes da zona já tinham dito a O Corvo que a empresa deveria
ter problemas financeiros, uma vez que os trabalhadores não compareciam no
estaleiro de obras, queixando-se de salários em atraso. O vereador da
Mobilidade, na reunião camarária de 26 de Abril de 2018, também já tinha
referido que o atraso de quatro meses no arranque da empreitada se devia a
“dificuldades financeiras do empreiteiro”. A empresa de construção civil
responsável pela obra do metro de Arroios, a Opway Engenharia, segundo o jornal
Expresso, em Maio de 2015, tinha uma ampla lista de credores. Devia 62 milhões
de euros ao Banco Espírito Santo (BES), 57 milhões de euros à Espírito Santo
International e à Espírito Santo Financière e 3,3 milhões de euros à Rioforte.
O Ministério Público também reclamava da Opway Engenharia mais de 9,4 milhões
de euros.
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