terça-feira, 29 de janeiro de 2019

Bárbara Vara diz não ter estranhado dois milhões do pai na Suíça / Portugal abaixo da média europeia na tabela de percepções da corrupção



Bárbara Vara diz não ter estranhado dois milhões do pai na Suíça

Arguida repetiu o que já tinha dito antes: que confiou no pai, e que sempre fez o que este lhe indicou, sem o questionar.

 Ana Henriques
Ana Henriques 28 de Janeiro de 2019, 19:14

No primeiro dia de instrução da Operação Marquês, a filha de Armando Vara, Bárbara Vara assegurou não ter estranhado que o pai possuísse dois milhões de euros em contas bancárias na Suíça – apesar de até 2009 desconhecer este facto. Pensou que vinham de negócios do progenitor, alegou.

Neste processo, Bárbara Vara é acusada de dois crimes de branqueamento de capitais por, alegadamente, ter ajudado o pai a lavar dinheiro. Na tese da acusação, quando era administrador da Caixa Geral de Depósitos, Armando Vara envolveu o banco num negócio ruinoso, relacionado com a compra e expansão do resort de Vale do Lobo, tendo em troca recebido um milhão de euros de luvas, através de uma sociedade offshore que lhe pertencia a si e à filha. Foi para dissimular a proveniência desse dinheiro, assegura a acusação, que Bárbara Vara trocou a casa onde morava, na Avenida do Brasil, por outra mais cara na Lapa.

Esta segunda-feira, no Tribunal Central de Instrução Criminal, a filha de Armando Vara foi uma vez mais confrontada com a ignorância que manifestou em anteriores interrogatórios sobre os negócios do antigo governante. E mais uma vez repetiu o que já tinha dito antes: que confiou no pai, e que sempre fez o que este lhe indicou, sem o questionar. A arguida chegou a depositar dinheiro numa conta no Dubai, que assegurou acreditar ser para o pai abrir várias empresas naquele país. Ter-se-á limitado a dar o nome para a criação de duas sociedades offshore. E não terá relacionado os elevados montantes depositados nas contas do pai na Suíça com o facto de ele ser administrador da Caixa Geral de Depósitos.

Bárbara Vara negou conhecer Horta e Costa, alegadamente também implicado no esquema de Vale do Lobo, ou sequer o milionário holandês Jerome Van Dooren que nos primeiros meses de 2008 depositou cerca de dois milhões de euros para uma conta da UBS de Joaquim Barroca, vice-presidente do grupo Lena. Soma que o Ministério Público suspeita que seria para dividir entre o ex-primeiro-ministro José Sócrates e Armando Vara, com a cumplicidade do empresário Carlos Santos Silva – arguido com quem Bárbara Vara disse esta segunda-feira só se lembrar de ter estado uma vez, na casa dos avós em Vinhais.

Armando Vara também tem vindo a dizer que a filha – cujo interrogatório durou apenas cerca de hora e meia – é alheia aos crimes que lhe imputam na Operação Marquês. O antigo governante devia ser ouvido esta terça-feira no Tribunal Central de Instrução Criminal, mas, como se encontra a cumprir pena na cadeia de Évora e decorre uma greve de guardas prisionais, o seu interrogatório foi adiado para 5 de Fevereiro



Portugal abaixo da média europeia na tabela de percepções da corrupção
Desde 2012 que a variação é mínima, com o país estagnado a meio do índex da Transparência Internacional. Falta uma estratégia nacional de combate à corrupção, diz a secção portuguesa desta ONG.

 Leonete Botelho
Leonete Botelho 29 de Janeiro de 2019, 6:00

Portugal melhorou um ponto mas baixou um lugar no índex de percepções da corrupção da Transparência Internacional para 2018. Na média ponderada dos 13 rankings consultados para a elaboração desde índex, o país subiu de 63 para 64 pontos, numa escala de zero a 100, em que quanto maior o número, menor será a corrupção sentida. Ainda assim, baixou do 29.º para o 30.º lugar, visto que houve outros países que registaram melhorias mais sensíveis.

Esta pequena oscilação revela, portanto, que Portugal continua estagnado neste combate, mantendo-se dois pontos abaixo da média dos países da Europa Ocidental (66 pontos), a região mais bem classificada do mundo neste ranking de 180 países de todo o mundo. A Dinamarca continua a ser o país que lidera esta tabela, com 88 pontos, seguido pela Nova Zelândia (87), Finlândia, Singapura, Suécia e Suíça (todos com 85 pontos).

“Desde 2012 que Portugal está parado a meio da tabela europeia sem progressos reconhecíveis no combate à corrupção”, constata o presidente da Transparência e Integridade, João Paulo Batalha. Na sua opinião, “a acumulação de escândalos de falta de ética na vida pública, a inoperância de uma Comissão para a Transparência no Parlamento que em três anos ainda não produziu resultados ou as tentativas de controlo político sobre os Conselhos Superiores da Magistratura e do Ministério Público são a tradução prática de uma falta de vontade política que é evidente e reconhecida pelos observadores externos que compõem este índice”.

Para esta avaliação também contribuirá o elevado número de arquivamentos de processos de corrupção – em 2017, cerca de dois terços destes processos foram arquivados – e o baixo número de condenações, o que é ainda mais notório em casos mediáticos.

João Paulo Batalha lamenta que continue a não existir em Portugal, uma estratégia nacional de combate à corrupção, independentemente da cor política do Governo. “O facto de o Governo se ocupar em disputas com a OCDE sobre o impacto da corrupção na economia em vez de levar a cabo uma estratégia nacional de combate a este flagelo mostra bem que a política vigente continua a ser a de tentar mascarar a realidade em vez de a enfrentar”, aponta.

Lembrando que este é um ano eleitoral que abrirá um novo ciclo político no país, João Paulo Batalha defende que o combate à corrupção deve estar “no centro da discussão política e que todos os candidatos” às eleições europeias, regionais da Madeira e legislativas se devem comprometer com “reformas claras e específicas de combate à corrupção”.

“Portugal não será imune à degradação das democracias que se verifica a nível global se não agir para preservar as suas instituições. O debate é inadiável e não podemos desperdiçar mais oportunidades para o assumir de frente”, declara.


Democracia e corrupção: relações perigosas
A relação entre corrupção e democracia é evidente neste índex, como salienta a presidente da Transparência Internacional, Delia Ferreira Rubio, na nota informativa que acompanha o trabalho. “A nossa pesquisa mostra uma relação clara entre a qualidade da democracia e a capacidade de combater com sucesso a corrupção no sector público: a corrupção espalha-se muito mais facilmente onde as instituições democráticas são fracas, como temos visto em vários países onde políticos populistas e anti-democráticos a usam como tema para tirarem vantagem pessoal e política”, afirma.

Os resultados globais deste ranking mostram, segundo a TI, o impacto nocivo que a corrupção está a ter na qualidade das democracias em todo o mundo. Mais de dois terços dos 180 países analisados têm uma pontuação inferior a 50, com uma média global de apenas 43 pontos. Abaixo dessa média estão países como a Turquia (41 pontos), China (39), Brasil e Timor-Leste (35 pontos cada), Rússia (28), Moçambique (23), Angola (19), Venezuela (18), Guiné Equatorial e Guiné-Bissau (16 cada).

Para a elaboração deste índex são tidos em conta 13 outros barómetros globais e regionais, de 12 instituições diferentes que captam percepções de corrupção nos últimos dois anos, como o Varieties of Democracy (V-Dem), Freedom House Nations in Transit, Economist Intelligence Unit Country Risk Service, relatórios do Banco Mundial, do Banco de Desenvolvimento Africano, do Fórum Económico Mundial, do Political Risk Services Group, do World Justice Project Rule of Law Index ou da fundação germânica Bertelsmann, entre outros. Para que um país ou território seja incluído neste índex, tem de existir um mínimo de três fontes a avaliar esse país. A pontuação de um país é calculada como a média de todas as pontuações padronizadas disponíveis para esse país, arredondada para números inteiros.

Para que o combate à corrupção possa “fazer progressos reais, contribuindo para fortalecer as democracias em todo o mundo”, a Transparência Internacional apela a todos os governos que fortaleçam as instituições responsáveis por garantir um sistema de integridade assente em freios e contrapesos ao poder político que funcionem de forma livre e sem intimidações e dêem passos concretos para aproximar os compromissos de combate à corrupção da sua efectiva implementação.

Apela ainda aos Estados que apoiem as organizações da sociedade civil que trabalham para a mobilização cívica e participação política dos cidadãos, assim como assegurem a existência de uma imprensa livre e dêem condições para que os jornalistas trabalhem em segurança, sem qualquer forma de intimidação ou perseguição.

tp.ocilbup@ohletobl

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