Os porteiros do
regime não sabem fazer contas
É um absurdo
silenciar três deputados com a desculpa que não são um grupo parlamentar, até
porque a melhor forma de os transformar num grupo parlamentar é mesmo fazendo
tudo para que não abram a boca.
João Miguel Tavares
12 de Novembro de
2019, 6:20
Os porteiros do
regime fazem tudo para não deixar entrar novos clientes, e quando estes
conseguem, à custa de muito esforço, passar da porta, os porteiros do regime
fazem tudo para não os deixar dançar. Os porteiros da discoteca Urban Beach têm
fama de ser tipos difíceis, mas os porteiros da Assembleia da República não são
mais fáceis. Aquilo que se está a passar no Parlamento, com PS, Bloco de
Esquerda, Partido Comunista e Os Verdes (que nunca na vida foram a votos fora
da barriga de aluguer marxista-leninista) a fazerem uma panelinha para
silenciar os deputados do Chega, da Iniciativa Liberal e do Livre é um
desrespeito escandaloso pela democracia e pelos votos dos portugueses.
Ainda por cima, é
uma decisão profundamente estúpida; tão estúpida, aliás, que chega a ser
ofensiva para qualquer inteligência mediana. Chega, Iniciativa Liberal e Livre
podem começar já a esfregar as mãos de contentes e a organizar manifestações
nos corredores de São Bento durante os debates quinzenais, para grande
felicidade das televisões. Não há nada mais telegénico do que a justa
indignação e os gritos de censura, sobretudo quando 999 em cada 1000
portugueses estarão de acordo que até André Ventura, depois de ter sido eleito,
tem direito a resmungar no Parlamento contra pedófilos e emigrantes; e até
Joacine Katar Moreira, apesar das suas dificuldades, tem direito a esgotar o
tempo das suas intervenções da maneira que bem entender. Chama-se a isso
democracia, deu muito trabalho a conquistar, merece ser respeitada, e não há
regimento parlamentar que se sobreponha a ela, como bem percebeu o presidente
da Assembleia Ferro Rodrigues, justiça lhe seja feita.
É um absurdo
silenciar três deputados com a desculpa que não são um grupo parlamentar, até
porque a melhor forma de os transformar num grupo parlamentar é mesmo fazendo
tudo para que não abram a boca. A pressão política e mediática vai obviamente
ser insustentável, a esquerda vai obviamente ceder e os três novos partidos vão
obviamente poder falar nos debates quinzenais, como têm direito. Não lhes estão
a fazer favor nenhum – bem pelo contrário. O regime faz tudo para proteger os
partidos que já estão na Assembleia da República, seja em termos financeiros,
seja em termos mediáticos (quem está fora do Parlamento não tem direito a
participar nos principais debates televisivos, e portanto tem de fazer um
esforço colossal para se fazer ouvir), seja em termos eleitorais, por causa do
método de Hondt e devido à inexistência de um círculo nacional.
Querem fazer umas
continhas simples? Vamos dividir o número de votos de cada partido pelo número
de deputados que conseguiu obter. Chega e Iniciativa Liberal tiveram quase 68
mil votos e obtiveram um deputado. O Livre teve 57 mil votos. O PAN teve 174
mil votos e quatro deputados – bastaram-lhe 43.500 votos para eleger um
deputado. O CDS precisou de um pouco mais: 44.400 votos por cada deputado. O
PCP: 27.700 votos por deputado. O Bloco: 26.300 votos. O PSD: 18.500 votos. O
PS teve 1,9 milhões de votos e 108 deputados: bastou-lhe 17.600 votos para
eleger um deputado. (Quanto aos Verdes, zero votos chegaram, como sempre, para
eleger dois deputados.)
Isto significa
uma coisa muito simples: em número de votos, André Ventura e João Cotrim de
Figueiredo valem quase quatro vezes mais do que um deputado do PS. Repito:
quatro vezes mais. Donde, a esquerda que cale a boca, tenha vergonha na cara e
deixe os pequenos partidos falar.
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