Há sete meses que
quase não chove no Algarve e a seca é extrema
Autarcas
reivindicam a construção de uma nova barragem. A empresa Águas do Algarve
garante que até final do ano não faltará água nas torneiras.
Idálio Revez 11
de Novembro de 2019, 20:00
Metade do
Algarve, o sotavento, encontra-se em situação de “seca extrema” e a outra parte
para lá caminha, está em “seca severa”. No mapa da gestão das Bacias
Hidrográficas do Algarve, os furos que regam os golfes de Vale do Lobo já estão
sinalizados com um triângulo a “vermelho”. A situação não é inédita, mas este
ano a região algarvia está a ser particularmente atingida por uma aridez que
faz temer o pior: os cortes no abastecimento ao sector agrícola
O ano hidrológico
começou há um mês, mas a chuva não aparece. Por enquanto, dizem os
agricultores, são só promessas, já desesperados por há sete meses quase não
chover. O céu, aparece carregado de nuvens de vez enquanto mas S. Pedro não
abre a torneira. O Verão entrou pelo Outono adentro e vai deixando um rasto de
tristeza nos campos As ribeiras estão quase todas secas e a vida aquática
morreu. A zona mais atingida é o nordeste algarvio, nos concelhos de Castro
Marim e Alcoutim.
Porém, a parte
central do Algarve sofre um outro tipo de problemas: a contaminação dos solos e
das águas. “A massa de água das campinas de Faro está em muito mau estado”,
destaca José Paulo Monteiro, investigador da Universidade do Algarve,
explicando que existe uma “sobreexploração” no lado ocidental do aquífero Vale
do Lobo/Almancil. Na parte oriental, nas antigas hortas de Faro, “continua a
existir o problema dos nitratos”, derivados da agricultura intensiva ali
praticada durante décadas sem regras.
O nível das
barragens da região, de acordo com os dados divulgados pela Agência Portuguesa
de Ambiente (APA), encontra-se a 37,1% da capacidade máxima de armazenamento.
Mas “esmo que não chova até final do ano, não haverá problema no abastecimento
às populações”, garante a porta-voz da empresa Águas do Algarve, Teresa
Fernandes, mostrando a convicção de que o “Governo tomará medidas” caso a
situação venha a piorar. Uma das soluções, admite, “pode passar pelos cortes à
agricultura, foi o que se fez em 2005 [ano da grande seca]. A prioridade é o
consumo humano”, sublinha.
Entretanto, a
empresa (pertencente ao grupo Águas de Portugal) está a utilizar também os
furos artesianos do aquífero Querença/Silves para complementar o abastecimento
às populações, essencialmente garantido pelo sistema de barragens.
Perante os vários
cenários que se colocam para garantir o futuro da região – dependente do
turismo mas cobiçada, igualmente, para o desenvolvimento de novas culturas de
regadio – coloca-se uma questão: o Algarve necessita de uma nova barragem? O
presidente da Câmara de São Brás de Alportel, Vítor Guerreiro, não tem dúvidas.
“É uma infra-estrutura absolutamente necessária, constitui uma reserva
estratégica.” O autarca, socialista, vai levar nesta terça-feira à reunião do
executivo uma moção para que seja retomado o projecto da “construção de uma
barragem na zona central do Algarve”.
Por mais uma
barragem
A discussão
arrasta-se há quase 40 anos. Em 1981, recorda, foi apresentado o estudo prévio
para a construção da barragem do Monte da Ribeira (ou do Alportel) na zona
central da região. Se a obra tivesse avançado, observa, “provavelmente, não
haveria a contaminação dos solos das campinas de Faro”. Além disso, argumenta,
com a ocorrência de fenómenos extremos cada vez mais frequente, “a barragem
iria permitir o controlo sobre as cheias e inundações na ribeira do
Alportel/rio Gilão (Tavira)”. A assembleia municipal já aprovou por unanimidade
uma moção a defender a “imperativa necessidade de reforçar a capacidade de
armazenamento hídrico do Algarve”.
Já os autarcas do
Sotavento reivindicam a construção da Barragem da Foupana, que passaria a
integrar o sistema Odeleite/Beliche. O ex-Instituto da Água, há mais de duas
dezenas de anos, chegou a desenvolver os primeiros estudos, prevendo-se que
esta poderia vir a ter uma capacidade para armazenar 100 milhões de metros
cúbicos. “Mas só nos lembramos da falta de água, em anos de seca”, comenta
Vítor Guerreiro, para quem é igual “construir uma barragem na ribeira do
Alportel ou na Foupana, o importante é que seja feita uma obra que garanta o
futuro da região”.
Mas José Paulo
Monteiro faz um alerta: “Os rios não podem ficar todos domesticados.” O sector
da água, lembra o hidrogeólogo, é “muito conservador e gosta das soluções
testadas há séculos, como é o caso das barragens”. Porém, uma gestão correcta
dos recursos, sublinha, “pode passar pela recarga artificial dos aquíferos, com
os efluentes tratados, à semelhança do que se faz em Madrid, Barcelona ou
Israel”. A nova Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) Faro/Olhão, por
exemplo, lança na ria Formosa 40 milhões de hectómetros de esgoto sem qualquer
aproveitamento. Do ponto de vista científico, diz o hidrogeólogo, “estas
questões são estudadas há muito tempo mas não fazem ainda parte das soluções da
estratégia nacional da gestão da água”.
No plano
imediato, para minimizar os efeitos da seca extrema, a empresa Águas do
Algarve, informa Teresa Fernandes, está a “equacionar a possibilidade de
reutilização das águas residuais” para regas e limpezas de ruas. Segundo a
empresa, o consumo humano gasta, em média, por ano, 73 milhões de metros de
cúbicos e mais de metade desse volume é desperdiçado.
Neste momento,
apenas dois campos de golfe reciclam a água para rega, o dos Salgados, e um da
Quinta do Lago, de forma parcial.
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