Há ruas de São Teotónio onde os portugueses são a minoria. E isso está a causar desconforto |
Imigração sobe
18%. Indianos entre os que mais chegam a Portugal
Dados provisórios
do SEF mostram que até fim de Outubro tinham sido concedidas 110.813 novas
autorizações de residência. Brasil continua no topo. O Reino Unido, que estava
em quarto lugar no ano passado, passa para segundo. Nepal continua em quinto.
Agricultura e necessidade de mão-de-obra explicam subidas.
Joana Gorjão
Henriques 12 de Novembro de 2019, 6:30
Há mais
imigrantes a trabalhar nas estufas em São Teotónio MIGUEL MANSO
A dois meses de
acabar o ano, os dados provisórios do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras
(SEF) apontam para uma tendência de crescimento de 18% na imigração.
Segundo números
fornecidos ao PÚBLICO, até 31 de Outubro já tinham sido concedidas 110.813 novas
autorizações de residência (AR), quase mais 17 mil do que em todo o ano de 2018
(93.154), mantendo-se assim uma tendência de subida nos últimos quatro anos. Já
no ano passado se tinha registado o maior número de imigrantes de sempre em
Portugal, que chegaram aos 480 mil. Os números de residentes devem ultrapassar
os 566 mil, segundo a estimativa de 18% do SEF que não especificou números
concretos em relação às nacionalidades.
Os brasileiros
continuam no topo da tabela dos que mais estão a imigrar. Estes cidadãos são a
maior comunidade imigrante em Portugal com mais de 105 mil residentes em 2018.
A maior novidade
é a entrada da Índia para o top 5 da tabela das autorizações concedidas,
ficando em quarto lugar e à frente do Nepal que ocupa o mesmo quinto lugar que
em 2018. O Reino Unido, que estava em quarto lugar no ano passado, passa para
segundo. A Itália também se mantém neste ranking, passando de segundo para
quarto lugar. França sai da tabela dos cinco que mais pediram a residência.
Porém, os novos
pedidos não correspondem todos, necessariamente, aos grupos de imigrantes que
já vivem em Portugal. Nesta lista há ligeiras mudanças. Em 2019 as maiores
comunidades são Brasil, Cabo Verde, Reino Unido, Roménia e Ucrânia – em 2018
também o eram, mas estavam em posições diferentes na tabela, também liderada
pelo Brasil e Cabo Verde, mas seguida da Roménia, Ucrânia e Reino Unido.
Indianos e
agricultura
O aumento do
fluxo da imigração de indianos explica-se, em parte, com a subida de população
estrangeira que vem trabalhar na agricultura. Aliás, em Odemira, onde estão
concentradas grandes produções de frutos vermelhos que atraem mão-de-obra
imigrante – ao ponto de o Governo ter aprovado a construção de alojamentos nas
propriedades agrícolas, o que está a criar polémica – os dados provisórios de
2019 apontam para mais 28% de residentes estrangeiros (ou seja, devem passar de
6124 para 7838, e são sobretudo do Nepal, Índia, Bulgária, Tailândia e
Alemanha). Os novos pedidos neste concelho subiram de 1807 para 2077 e vieram
sobretudo de Índia, Nepal, Alemanha, Bangladesh e Reino Unido.
Satbir Singh, 29
anos, indiano a viver em São Teotónio desde 2016 nota que de facto a imigração
do seu país está a crescer desde há dois anos naquela zona, pelo menos. “Porque
há muitas empresas aqui, há trabalho”, afirma ao PÚBLICO por telefone este
trabalhador numa das estufas de frutos vermelhos.
Há ruas de São
Teotónio onde os portugueses são a minoria. E isso está a causar desconforto
Nos últimos três
anos houve sim um aumento de indianos a procurar a Solidariedade Imigrantes
(Solim), associação que tem uma sucursal em Beja e que é uma das que tem mais
sócios. Timóteo Macedo afirma, porém, que tem sentido um abrandamento na
procura de imigrantes destes países. Os dados a que se refere o SEF podem
corresponder a pedidos efectuados no ano passado ou em anos anteriores – porque
entre a entrada do pedido e a concessão da autorização podem passar-se vários
meses. “Não houve efeito-chamada, foram as necessidades objectivas porque
apareceu trabalho em Portugal. Os fluxos migratórios movimentam-se entre a
oferta e a procura”, afirma. Os indianos vêm também para a restauração. “Quem
está nas cozinhas?”, interroga o dirigente.
O mesmo acontece
com os nepaleses, analisa Kubber Karki, da Associação dos Nepaleses. “Continuam
a chegar nepaleses. Vêm por causa do trabalho, da comida, do tempo.” O Alentejo
e o Algarve são alguns dos destinos preferidos, e aí trabalham na agricultura,
mas também na restauração ou em pequenos negócios como mercearias. Mas segundo
Kubber Karki, há muita gente qualificada, engenheiros ou advogados, a trabalhar
nas estufas ou em restaurantes. “Até terem o cartão de residência não arranjam
bons trabalhos”.
As estatísticas e
a realidade
Já em relação ao
Reino Unido há duvidas sobre se os dados significam novas entradas ou se
correspondem a residentes que se foram registar por causa do Brexit.
Totalizados em 22.500 em 2017 e em mais de 26 mil em 2018, os britânicos são a
terceira maior comunidade imigrante a viver em Portugal, segundo os dados
provisórios do SEF em relação a 2019 (mais uma vez não forneceram números
específicos). Ao PÚBLICO, o gabinete de imprensa da embaixada britânica calcula
que a comunidade seja muito maior e chegue aos 50 mil. “Desde o referendo que a
embaixada tem desenvolvido um esforço para que os britânicos não registados o
façam de modo a que os seus direitos sejam garantidos. Esse esforço terá
produzido efeitos”, referem.
Para Michael
Reeve, director executivo da Afpop, a associação de proprietários estrangeiros
em Portugal, há razão para que mais britânicos queiram mudar-se porque o país
está entre os seus três destinos preferidos. Referindo-se aos imigrantes
britânicos em Portugal como expatriados, Michael Reeve afirma que terá
funcionado “o boca-a-boca” de quem vive no país. “A Câmara de Comércio
Luso-Britânica tem feito uma boa campanha de marketing, este ano fez quatro
eventos [no Reino Unido] para promover Portugal e quando as pessoas vêm que é um
dos países mais seguros do mundo isso tem efeito positivo”.
Também em relação
ao Brasil, Carlos Vianna, membro do Conselho das Migrações, e fundador da Casa
do Brasil, acha que os dados estão bem abaixo das estatísticas. Calcula que
haverá 200 mil brasileiros em Portugal, cerca de 2% da população, entre
imigrantes não regularizados, imigrantes com AR e brasileiros que obtiveram a
nacionalidade portuguesa. “Acredito que haja em Portugal cerca de 40 a 50 mil
portugueses de origem brasileira como eu, que já sou português há quase 20
anos. No Brasil há imensos novos portugueses porque não há família com
portugueses que não incentive os filhos a ter a nacionalidade. Quem tem avô
brasileiro vai pedir a nacionalidade. Apelo ao Governo que faça um reforço dos
consulados portugueses.”
Para Portugal têm
vindo imigrantes de todos os perfis, mas ultimamente também pessoas da classe
média e classe média alta que “compra lojas, apartamentos”. “A espiral de crise
económica e política no Brasil tem empurrado a imigração brasileira para
Portugal”.
E vai continuar a
crescer, estima. “A dinâmica de chegada de gente está forte. As pessoas vêm bem
informadas. Quando há um certo número de população num país isso gera um fluxo
porque são os próprios que trazem amigos e parentes.”
tp.ocilbup@hgj
Sem comentários:
Enviar um comentário