OPINIÃO
Joacine, julgava
que a conhecia bem?
Tudo isto mostra
também como, afinal, os partidos são importantes e como merecem ser
respeitados.
HELENA PEREIRA
29 de Novembro de
2019, 6:26
Inexperiência,
muita. Falta de bom-senso, sim. Arrogância, também. Tudo isso pode ser
discutido a propósito da polémica que envolve a deputada única do Livre,
Joacine Katar Moreira. Mas esta polémica levanta ainda outra discussão
importante: as eleições primárias para a escolha de deputados são uma prática
virtuosa? O Livre foi o único partido que escolheu desta forma os seus
candidatos a deputados. Com grande entusiasmo e orgulho, o partido dizia
“querer mudar a forma de participação dos cidadãos na política”.
Quem quisesse
podia apresentar-se como candidato, desde que subscrevesse a carta de
princípios do Livre. Se recebesse o aval da direcção, passava a constar na
lista sujeita a eleição livre de membros do partido e simpatizantes. “Nas
legislativas podemos escolher um partido. Mas não decidimos quem são os
candidatos a deputados que nos vão representar. Por vezes, nem os conhecemos”,
argumentava o partido em 2014, quando se preparava para a sua estreia que teve
lugar nas legislativas de 2015 (e em que não conseguiu eleger representação).
“Pela primeira vez na história da democracia portuguesa, as listas de
candidatos a deputados não vão ser escolhidas e ordenadas por uma direcção
partidária. Vão ser decididas por si, em eleições primárias abertas, com a
participação de todos.”
Em 2019, para o
círculo eleitoral de Lisboa, apresentaram-se 17 candidatos, que tiveram a
oportunidade de debater entre si (um debate foi transmitido online) e com os
simpatizantes (muito através das redes sociais). Votaram 211 pessoas, o
equivalente a 32,6% do colégio eleitoral. Essas pessoas, que votaram por meios
electrónicos, tiveram de ordenar numa lista os 17 nomes e daí resultou uma
pontuação, em função de quantas vezes os candidatos eram colocados em primeiro,
segundo ou terceiro lugar e por aí fora. Conclusão: Joacine Katar Moreira teve
798.64 pontos, o segundo melhor classificado foi Carlos Teixeira, com 654.20
pontos. Rui Tavares, que foi através do mesmo método escolhido para cabeça de
lista ao Parlamento Europeu, teve 2122.22 pontos. Bom, pode parecer confuso mas
é mesmo assim: estes são os dados disponíveis no site do partido.
Dito isto, a
minha dúvida é: um processo que arranca com cada um dos candidatos a fazer
campanha individual não contribui para estimular uma diferenciação excessiva
pelas suas características pessoais e de personalidade? Será que é isso que
explica que Joacine Katar Moreira fale, como tem falado nos últimos dias, como
se não existisse nenhuma entidade além dela, demonstrando desprezo e
desrespeito pelo partido através do qual foi eleita? (Em Portugal, os cidadãos
só podem concorrer à Assembleia da República se for dentro de uma lista de um
partido. Podem apresentar petições e iniciativas legislativas directamente à
Assembleia mas não podem apresentar candidaturas.)
Mas acrescento,
sem ironia, que tudo isto mostra também como, afinal, os partidos são
importantes e como merecem ser respeitados. Não é admissível ‘a lavagem de
roupa suja’ como a que tem sido exposta publicamente, nem o desrespeito pelo
papel do jornalismo e do Parlamento como ‘uma casa aberta’ da democracia. O
Livre, que nasceu em 2014, parece-me condenado a ter uma vida efémera, à medida
que se torna cada vez mais anedota. E é pena.
Mas que há uma
grande ironia nisto tudo, há. Quando era eurodeputado eleito pelo BE, Rui
Tavares entrou em ruptura com o partido e passou a independente. Agora está a
provar, como se costuma dizer, o seu próprio veneno. E há de certeza
muitos bloquistas a rir.
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