O novo
aero-aborto
Só se fala de
dinheiro. Ninguém fala de dignidade. Fala-se em mais milhões de turistas.
Ninguém fala em qualidade de vida.
Miguel Esteves
Cardoso
1 de Novembro de
2019, 6:53
Com que então a
Agência Portuguesa do Ambiente (APA) aprovou o novo aeroporto do Montijo. Que
surpresa!
A Vinci Airports
está de parabéns. Conseguiu o que queria: mais um aeroporto. Aliás é sempre
isso que quer: mais um aeroporto para entrar mais gente – e mais dinheiro nos
cofres da Vinci Airports.
Só se fala de
dinheiro. Ninguém fala de dignidade. Fala-se em mais milhões de turistas.
Ninguém fala em qualidade de vida.
A APA diz que,
para compensar o mal que o novo aeroporto vai fazer aos animais que vai
despejar e para compensar a poluição sonora e ambiental que vai trazer, vai ser
preciso gastar 48 milhões em coisas boas para o imbiente.
A Zero, em cuja
seriedade confio inteiramente, diz que esses 48 milhões já eram obrigações do
Estado, que não são novidade nenhuma.
Sejam ou não,
abomino a contabilidade, a fixação no dinheiro, o esquecimento das pessoas, dos
animais e das paisagens, da frescura do ar, do sossego dos habitantes e,
repito, da dignidade dos portugueses e dos seres humanos em geral.
Esses míseros 48
milhões são como os milhões que as empresas contabilizam para compensar os
roubos e os negócios fracassados. Sem pestanejar, passam essas despesas para os
clientes, para nós, sem apelo ou agravo.
O novo aeroporto
é uma ofensa aos turistas, (a cada um deles), tratados como hordas de
pinga-notas, estúpidos e facilmente enganados e satisfeitos com
pseudo-portuguesices que todos fingimos ser inofensivas mas que corroem a nossa
cultura e ameaçam substitui-la.
Vão dar banho à
foca!
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ICNF deu luz
verde ao aeroporto do Montijo sem estudo de soluções alternativas
ICNF terá mudado
parecer entre primeiro e segundo EIA. Localização em zona costeira contraria
Plano Metropolitano de Adaptação às Alterações Climáticas. Recorde de
sobrelotação na Portela confirma urgência do aeroporto complementar
Francisco Alves
Rito 1 de Novembro de 2019, 6:06
Uma possível
mudança de parecer do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas
(ICNF) entre o primeiro e o segundo Estudo de Impacte Ambiental (EIA), a
localização do aeroporto numa das freguesias da Área Metropolitana de Lisboa
mais vulneráveis às alterações climáticas, e o recorde de tráfego de
passageiros no aeroporto da Portela que, pela primeira vez, teve mais de 30
milhões em 12 meses consecutivos, podem colocar em causa a proposta de
Declaração de Impacte Ambiental (DIA) apresentada pela Agência Portuguesa do
Ambiente (APA).
No parecer ao
primeiro EIA, que acabou por ser declarado “não conforme” pela APA, levando à
elaboração de um segundo estudo, o ICNF defendeu a obrigatoriedade de o
projecto fazer “o exame de soluções alternativas”, nos termos do regime
jurídico da Rede Natura 2000 (artigo 10.º, n.º 6, alínea d), tendo em conta que
o aeroporto do Montijo fica localizado na proximidade imediata da Zona de
Protecção Especial (ZPE) do Estuário do Tejo e que, sendo exigível uma
Avaliação de Impacto Ambiental, teriam de ser estudadas “as soluções
alternativas (de localização ou de layout)”.
O segundo
parecer, em que o ICNF viabiliza o segundo EIA, não é ainda publicamente
conhecido, mas neste último documento continuam sem ser estudadas as “soluções
alternativas” que a lei impõe, e que o ICNF exigia, pelo que a diferença, neste
aspecto, estará na posição do instituto.
A aparente
mudança de posição do ICNF do primeiro para o segundo Estudo de Impacte
Ambiental, pode mesmo ser usada pela associação ambientalista Zero na batalha
jurídica contra o procedimento ambiental. Em declarações ao PÚBLICO, Carla
Amado Gomes, professora de Direito do Ambiente da Faculdade de Direito da
Universidade de Lisboa diz que, “a confirmar-se este vício, pode invalidar a
Declaração de Impacte Ambiental” emitida pela APA.
“Aguardamos
conhecer o parecer do ICNF para confirmar que houve violação da lei”, disse
ontem ao PÚBLICO Acácio Pires, da associação ambientalista, que vai reforçar a
queixa que já apresentou em Bruxelas, por violação da legislação comunitária e
está a ponderar avançar com uma providência cautelar para travar o projecto.
Entre os dois
pareceres, o ICNF, que é autoridade em matéria ambiental, com poder
vinculativo, mudou de presidente.
Risco de cheias
A localização do
aeroporto do Montijo numa das freguesias da Área Metropolitana de Lisboa mais
vulneráveis às alterações climáticas é, por outro lado, um sinal contrário ao
espírito do Plano Metropolitano de Adaptação às Alterações Climáticas (PMAAC)
que a Área Metropolitana de Lisboa concluiu recentemente e que tem apresentação
pública marcada para 6 de Dezembro.
O mesmo estudo
aponta ainda o Montijo e Afonsoeiro como uma das freguesias da AML com “índices
de vulnerabilidade actual e futura a cheias rápidas” no estuário do Tejo.
Na fase final do
decurso do procedimento de elaboração do EIA agora avaliado, o Aeroporto da
Portela vivia o período de maior lotação da sua história. De acordo com a Vinci
Airoports, empresa detentora da ANA Aeroportos, em Março de 2019, o Aeroporto
Humberto Delgado completou, pela primeira vez, doze meses consecutivos com uma
movimentação mensal de passageiros superior a 30 milhões de passageiros.
Os números da
empresa indicam um crescimento homólogo de passageiros, no primeiro trimestre
de 2019, de 7,7%, explicado com a “excelente época turística” e com um período
em que “o aeroporto de Lisboa beneficiou do recente acréscimo de destinos,
incluindo uma ligação com Doha operada pela Qatar Airways”.
Autarcas
comunistas falam em decisão “concertada” e “condicionada”
Os autarcas
comunistas ouvidos ontem pelo PÚBLICO falam numa decisão “concertada” e
“condicionada”. O presidente da Câmara Municipal do Seixal diz que “estava já
tudo concertado entre o Governo e a Vinci Aeroportos”. É a única explicação que
encontra para a “insistência num aeroporto no Montijo, com todos estes
problemas, que não existiriam na opção Alcochete”. Joaquim Santos aponta os
desenvolvimentos públicos do processo, ontem, como “encenação”.
Aeroporto de
extremos: da satisfação de Montijo e Barreiro à frustração de Seixal e Moita
Aeroporto de
extremos: da satisfação de Montijo e Barreiro à frustração de Seixal e Moita
“As
contrapartidas são ridículas e ainda fica mais ridículo quando a ANA coloca em
causa os dois barcos para a Transtejo. Parece uma encenação, um golpe de teatro
entre a APA e a ANA. Parece uma novela, não apenas com um mau início, mas
também com um mau fim”, disse ao PÚBLICO o presidente da Câmara do Seixal.
Também Rui Garcia
(PCP), presidente da Câmara da Moita e da Associação de Municípios da Região de
Setúbal (AMRS), arrasa a decisão da avaliação ambiental.
“Perante os
enormes impactos negativos, o que deveria ter acontecido era um parecer
desfavorável, mas o que veio a prevalecer foi uma forte pressão e
condicionamento da parte do Governo e da ANA para conduzir a esta solução”,
afirma.
“Quando se decide
primeiro e avalia depois, quando sistematicamente se diz que não há
alternativa, na prática, o que acontece é que se está a condicionar as decisões
da APA e a fazê-lo com argumentos que são falsos, dado que a alternativa do
Campo de Tiro de Alcochete existe e é melhor”, defende Rui Garcia.
O autarca da
Moita, o concelho mais afectado com o ruído do novo aeroporto, não acredita que
as medidas de mitigação possam garantir o bem-estar das populações.
“Os efeitos vão existir de forma tremenda
junto da população das freguesias da Baixa da Banheira e Vale da Amoreira. É
possível atenuar alguns efeitos nas habitações, com o necessário isolamento através
da colocação de vidros duplos ou caixilharias novas, mas a verdade é que não
vivemos permanentemente dentro de casa ou estamos no interior dos edifícios.
Quando saímos à rua, quando as crianças vão ao recreio brincar, praticar
desporto no espaço público ou estamos a passear no jardim, não há mitigação
possível para essas situações e o bem-estar da vida das pessoas da zona
afectada vai ser severamente prejudicado.”
No capítulo das
acessibilidades, Rui Garcia acrescenta a falta da nova ponte sobre o Tejo. “É
inaceitável que se pretenda instalar uma infra-estrutura desta dimensão sem
considerar, sequer a médio prazo, a questão da Terceira Travessia do Tejo”
“O que a APA
afirma ser necessário são os barcos da Transtejo, entre outras medidas pontuais
que são sempre positivas, mas o cerne da questão é a necessidade da terceira
travessia, com a componente ferroviária, porque só isso é que pode desbloquear
a situação para ligar as duas margens”, defende o autarca comunista.
AEROPORTO DO
MONTIJO
Novo aeroporto.
Sociedade para o Estudo das Aves admite recurso aos tribunais: “Isto não é só
dinheiro”
A Sociedade
Portuguesa para o Estudo das Aves defende que medidas compensatórias
apresentadas já configuram obrigações do Estado, pelo que não podem ser
encaradas como tal. E não descarta a possibilidade de agir judicialmente
Patrícia Carvalho
Patrícia Carvalho
31 de Outubro de 2019, 14:45
Sociedade
Portuguesa para o Estudo das Aves está preocupada
Nada no
comunicado da Agência Portuguesa do Ambiente sobre a Declaração de Impacte
Ambiental (DIA) relativa ao aeroporto do Montijo faz desaparecer as
preocupações sobre o projecto que já tinham sido tornadas públicas pela
Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA). Salvaguardando que a DIA
ainda não é pública e que a SPEA quer conhecê-la primeiro, o director executivo
da associação, Domingos Leitão, adianta, contudo, que o que é traduzido no
comunicado são “falsas medidas compensatórias” e admite que a sociedade avance
judicialmente contra a construção do aeroporto.
“Não concordamos com falsas medidas
compensatórias. O que está lá previsto são obrigações do Estado português. Não
podemos compensar um problema criado pelo projecto pagando uma obrigação que já
existe. O aeroporto vem criar novos problemas, novos impactos e não podemos
compensar a afectação de uma área com outra área que o Estado português já
tinha a obrigação de estar a gerir bem”, diz Domingos Leitão.
Segundo a nota à
comunicação social divulgada pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA) na noite
de quarta-feira, a agência emitiu uma DIA favorável condicionada à aplicação de
“um pacote de medidas de minimização e compensação ambiental que ascende a
cerca de 48 milhões de euros”.
Esclarecendo que
a Avaliação de Impacte Ambiental que esteve na origem desta DIA se debruçou
sobre três preocupações principais – avifauna (e seu habitat), ruído e
mobilidade – a APA impõe como medidas para compensar a perda estimada de 2500
hectares para “nidificação e alimentação das diferentes espécies de avifauna
que ocorrem no estuário do Tejo” três pontos em concreto: a definição de “áreas
de compensação física com a extensão de 1600 hectares (incluindo, por exemplo,
o Mouchão da Póvoa)”; a constituição de um mecanismo financeiro a pagar pelos
promotores do aeroporto que dotará o Instituto de Conservação da Natureza e das
Florestas (ICNF) de um montante inicial de 7,2 milhões de euros, acrescido de
200 mil euros ao ano, destinados a gerir a área afectada; e a dinamização do
CEMPA – Centro de Estudos para a Migração e Protecção de Aves, gerido pelo
ICNF.
É sobretudo
contra a primeira e a última destas três medidas que Domingos Leitão se
insurge, quando diz que o que a APA está a apresentar são medidas que já
constituem obrigações do Estado. “O Mouchão da Póvoa faz parte da Reserva
Natural do Estuário do Tejo e tem um problema numa comporta há quatro anos, que
é obrigação do Estado resolver. O CEMPA existe há mais de 40 anos, o que o
Estado tem de fazer é colocar recursos humanos e financeiros suficientes. Não é
um projecto que tem um impacte ambiental que vai financiar isso, não pode ser
considerada uma compensação. É uma obrigação do Estado português”, advoga.
Sobre a verba de
48 milhões que os promotores do aeroporto terão de pagar para ver a DIA efectivada,
Domingos Leitão não se deixa entusiasmar. “Nada do que está naquele comunicado
de imprensa é novo relativamente ao que se conhecia do Estudo de Impacte
Ambiental. Há ali mais dinheiro do que estava falado, mas isto não é só
dinheiro, são precisas verdadeiras medidas de compensação”, argumenta.
Sem referência à
segurança
O responsável da
SPEA diz ser também “estranho” que o comunicado da APA “não tenha qualquer
referência à segurança”, que considera ser “algo muito importante” no projecto
do Montijo, já que o choque entre aeronaves e os milhares de aves que vivem no
estuário – algumas das coisas de espécies protegidas e de grande porte – é uma
probabilidade que sempre esteve em cima da mesa. “Parece que o único problema
deste projecto é a conservação da natureza, quando não é. Estranhamos muito que
não haja referência nesta manobra de comunicação a esse problema muito grande”,
diz.
E essa é mais uma
razão para a SPEA querer consultar a DIA, que só se tornará pública dentro de
dez dias, antes de emitir uma avaliação final sobre a mesma. Inclusive sobre os
passos que a sociedade poderá vir a tomar e que Domingos Leitão admite que
possam vir a passar pelo recurso à justiça. “Não está posta de parte a
intervenção judicial com recurso aos tribunais para parar este projecto. Não o
queremos fazer, preferimos que haja boas decisões administrativas e políticas,
mas se tiver de ser, fá-lo-emos, o estuário do Tejo é demasiado importante para
a biodiversidade em Portugal e no mundo para não o fazer”, diz.
Em Setembro, após
o encerramento da consulta pública ao Estudo de Impacte Ambiental (EIA) do
aeroporto, a SPEA, em conjunto com outras organizações não-governamentais do
ambiente – a GEOTA, FAPAS, A Rocha e a Liga para a Protecção da Natureza –
tinham anunciado que davam parecer negativo àquele documento e à construção do
aeroporto do Montijo, considerando que o EIA “falha em todas as vertentes
relacionadas com a avaliação de impactes, a mitigação e as medidas
compensatórias”.
Na altura, as
associações contestavam também o facto de o EIA não ter sido precedido de uma
Avaliação Ambiental Estratégica, ou seja, uma avaliação que comparasse a
proposta em cima da mesa com outras alternativas possíveis. Argumento que
Domingos Leitão volta a utilizar, para deixar bem claro: “Nós não concordamos
com o aeroporto naquele local, para a SPEA não está provado que este seja o
único local onde o projecto é viável. O Estado está a falhar ao não comparar
todas as alternativas possíveis e depois escolher. Escolheu primeiro e isso não
é legal nem aceitável.”
Na quarta-feira
também a Zero - Associação Sistema Terrestre Sustentável se manifestara contra
a DIA favorável condicionada apresentada pela APA, lembrando que tem acções
judiciais em curso e que pondera avançar com uma providência cautelar para
travar o processo. Já o presidente da Quercus, Paulo do Carmo, em declarações à
Lusa, afirmou que a informação divulgada pela APA “não é a solução ideal”, mas
que pode ser “positivo” se as medidas apresentadas forem efectivamente postas
em prática. “Em termos globais não é a melhor solução, mas, atendendo a esta
urgência de que o país precisa de aumentar a sua capacidade aeroportuária e se
todas as medidas de minimização de impacto forem implementadas de forma
rigorosa, penso que acabará por se aceitar esta decisão que é favorável
condicionada e tem parecer ICNF”, disse.
tp.ocilbup@ohlavrac.aicirtap
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