Web Summit:
vendedora de ilusões
A Web Summit não
é mais que uma espécie de centro de turismo tecnológico. Não deixa de ser
turismo porque não produz nada.
Fernando Teixeira
Advogado
estagiário, licenciado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de
Coimbra. Autor do livro “Ponto de Fuga”. Militante do PCP
7 de Novembro de
2019, 8:19
Segundo dados da
Informa D&E, noticiados no transacto ano, cerca de uma em cada três
startups portuguesas encerra ao fim de um ano. Entre outros factores, é
apontada a falta de financiamento como um dos principais constrangimentos para
o sucesso destas microempresas. Mas, afinal, o que nos traz a Web Summit? Além
de um mediatismo vazio de conteúdo, o que pode realmente oferecer uma
conferência que apresenta oradores como Tony Blair ou Ronaldinho? Ou mesmo o
negociador da União Europeia para o “Brexit"?
“Na Web Summit não se paga a quem ajuda a construir o
evento, são voluntários. Mas porquê voluntários? Não terão receita para poder
pagar a trabalhadores? Ou estamos perante mais uma forma de exploração, desta
feita dupla.”
Desde o início
deste evento em Portugal questiono qual a sua real utilidade se não lavar a
cara suja do capitalismo selvagem e pintá-lo como se de uma geração cool se
tratasse. Actualmente, é cool ir à Web Summit, embrenhar-se por aplicações
adentro e expurgar todos os males do mundo a partir de um computador. Vendem-se
as mais burlescas ilusões de que se não formos nós a criar o nosso emprego ou a
desenvolver a nossa microempresa (de preferência tecnológica) estaremos
condenados para sempre a viver à luz de relacionamentos laborais arcaicos e
caducos que mais não fazem do que contribuir para o desperdício de tempo,
enquanto podíamos estar a realizar algo de mesmo importante para o planeta,
para o mundo e para a sociedade.
É deste tipo de
ilusões que se pretende alimentar a sociedade — aponta-se o caminho do
instantâneo, do digital, porque o resto dá muito trabalho e não releva. Não
ouvi ninguém na Web Summit a criticar as políticas de baixos salários
praticadas pela Google ou pelo Facebook, dirão que é outra forma de trabalho e
que, portanto, o conceito de remuneração será diferente. Mentira, onde há
trabalho há necessariamente direito a um salário, a condições laborais e a uma
relação laboral entre patrão e trabalhador. A Web Summit ajuda a mitificar a
ideia de que não existem relações laborais como as que até aqui tinham lugar,
até porque devemos ser cada vez mais flexíveis, a saltar de um desafio para o
outro. Dizem eles desafio, dizemos nós explorações.
Na Web Summit não
se paga a quem ajuda a construir o evento, são voluntários. Mas porquê
voluntários? Não terão receita para poder pagar a trabalhadores? Ou estamos
perante mais uma forma de exploração, desta feita dupla, pois consegue-se
explorar pessoas economicamente, explorando o seu lado mais fantasioso, aquele
que as leva a acreditar que estão realmente a contribuir para algo que pode
fazer a diferença nas nossas vidas.
As startups
portuguesas não têm conseguido vingar porque, mais uma vez, estão a competir
com o grande capital, ou seja, se te endividas ou gastas o pouco que tens na
criação de uma destas microempresas tecnológicas, és rapidamente arredado por
aquelas que realmente contam com financiamento de milhões para levar a cabo o
seu objectivo. Com isto, fizeram-te perder um ano ou dois da tua vida,
vendendo-te a ideia de uma economia tecnológica florescente que, no fundo,
apenas floresce para os mesmos de sempre e, quiçá, roubaram-te uma ou outra
ideia que ruma direitinha para o seu sucesso. Não seria inédito.
A Web Summit não
é mais que uma espécie de centro de turismo tecnológico. Não deixa de
ser turismo porque não produz nada.
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