Se Isaltino for eleito, posse pode ser decidida por ministra
Juiz tem cinco dias para decidir admissão de candidatura. PS diz que o movimento quer "enganar" munícipes e manter poder
O movimento independente Isaltino, Oeiras Mais à
Frente, encabeçado por Paulo Vistas, que se candidata às autárquicas em Oeiras
entregou ontem o dossier no tribunal e, além de manter Isaltino Morais no nome,
insiste na candidatura do ex-autarca, agora preso, à liderança da assembleia
municipal. O acto foi de imediato considerado pelo concorrente do PS ao
município, Marcos Sá, como uma tentativa de "enganar" e de "explorar até ao
limite uma relação afectiva de muitos munícipes de Oeiras com o seu anterior
presidente, para tentar a todo o custo sobreviver no poder".
À saída do Tribunal de Oeiras, Paulo Vistas, que gere o município em
substituição de Isaltino, disse acreditar que a Justiça "terá mecanismos para
salvaguardar" que Isaltino possa exercer as funções de presidente da assembleia
municipal, caso seja eleito. Citado pela Lusa, acrescentou saber que pode ser
candidato, mas o modo como poderá desempenhar o cargo "é um assunto que diz
respeito aos tribunais e aos serviços prisionais".A Lei Eleitoral Autárquica não impede que Isaltino, apesar de preso, se possa candidatar. Mas impede que possa exercer o cargo. "É igualmente incompatível com o exercício de funções autárquicas a condenação, por sentença transitada em julgado, em pena privativa de liberdade, durante o período do respectivo cumprimento", estipula a lei.
O juiz da comarca de Oeiras tem agora cinco dias úteis para apreciar a candidatura e decidir pela elegibilidade ou não de Isaltino Morais. Se recusar, o movimento tem 48 horas para recorrer para o Tribunal Constitucional, que se deverá pronunciar num prazo inferior a cinco dias.
O constitucionalista Jorge Miranda disse ao PÚBLICO considerar que uma candidatura deste tipo não deve ser aceite. É certo que a lei não o impede, mas, realça, "não faz sentido admitir uma candidatura de alguém que está preso e que por isso não pode tomar assento no órgão para que pode vir a ser eleito". Pode-se argumentar que isso será uma restrição de um direito, liberdade e garantia, consignados na Constituição, mas Jorge Miranda argumenta que tal situação é "condição da reclusão" e que os direitos fundamentais estão limitados ao sentido da condenação que implica a perda da liberdade de movimentação.
Isaltino Morais foi detido no final de Abril e tem de cumprir dois anos de pena efectiva no Estabelecimento Prisional da Carregueira, no concelho de Sintra, a escassas duas dezenas de quilómetros da Câmara de Oeiras, por fraude e branqueamento, crimes cometidos no exercício de funções autárquicas.
Porém, poderá beneficiar de saída a meio da pena e também de saídas precárias antes, no caso de bom comportamento. Se for eleito, terá de tomar posse para poder suspender o mandato enquanto cumpre a pena. Para tomar posse terá de pedir autorização para uma saída precária ao director do estabelecimento prisional. Este pode decidir por si, ou, tendo em conta a delicadeza do caso, passá-lo ao director-geral dos Serviços Prisionais, que também pode recorrer à decisão, em última instância, da ministra da Justiça, a social-democrata Paula Teixeira da Cruz.
Isaltino Morais vê assim o seu destino autárquico nas mãos da pessoa que motivou o seu afastamento do PSD. O ex-presidente da Câmara de Oeiras deixou o PSD e passou a independente quando nas autárquicas de 2005, o então líder do PSD, Marques Mendes, proibiu as candidaturas de pessoas envolvidas em processos judiciais, como acontecia já com Isaltino. Esta decisão interna do partido teve como principal defensora Paula Teixeira da Cruz, à data vice-presidente do PSD.
Deputados e ministros ameaçam demitir-se em apoio a Berlusconi
Membros do Povo da Liberdade vão pedir ao Presidente da República para perdoar o líder da direita e admitem romper pacto com o centro-esquerda, deixar cair o Governo de Letta e forçar eleições
Silvio Berlusconi já regressou das cinzas demasiadas
vezes para aceitar a morte política, por mais certa que esta seja. Um dia depois
de o Supremo Tribunal italiano ter confirmado a sua condenação a um ano de
prisão por fraude fiscal - o que o impede de se candidatar a eleições durante
seis anos - o empresário-político foi ovacionado pelos grupos parlamentares do
seu Povo da Liberdade. Num encontro repleto de declarações dramáticas, ministros
e deputados do partido ameaçaram demitir-se, se o Presidente não perdoar o seu
líder.
A tese é a mesma de há 20 anos: Berlusconi é um mártir alvo de uma
perseguição sem tréguas dos juízes. "Esta condenação é destituída de qualquer
fundamento e vai privar--me da minha liberdade e dos meus direitos políticos",
disse o três vezes primeiro-ministro de Itália, na sua primeira reacção à
sentença. "Devemos continuar a combater, a fazer política, para realizar todas as reformas necessárias, em primeiro lugar a da Justiça", prometeu o actual senador. Depois, como esperado, convocou as tropas para lhe jurarem lealdade. Ao final do dia, em Roma, repetiu a exigência da reforma da Justiça. "[Caso contrário], estamos prontos a ir a eleições", disse.
Em seguida, "numa atmosfera surreal", descreve o Corriere della Sera, "deputados e senadores do PdL entregaram as suas demissões aos chefes das bancadas parlamentares, Renato Brunetta e Renato Schifani". Ambos anunciaram que levarão as demissões ao Presidente, Giorgio Napolitano, já na segunda-feira, para lhe pedir "que seja restaurada a democracia, posta em causa nesta sentença". Brunetta e Schifani vão pedir ainda o perdão presidencial para Berlusconi. "Se o nosso pedido não tiver resposta positiva, todos sabemos o que haverá a fazer: defender a democracia e o nosso país."
"Os ministros do PdL estão prontos a demitir-se do Governo", precisou o secretário-geral do partido, Angelino Alfano, que é também ministro da Justiça e vice-primeiro-ministro.
"Relançaremos o Força Itália", já dissera Berlusconi na primeira reacção, referindo-se ao seu primeiro partido. O formato da declaração, transmitida através de um dos seus canais de televisão, foi, aliás, o mesmo que usou há 20 anos, quando anunciou a sua entrada na política.
Factos e consequências
Com todas as incógnitas que a condenação judicial abre na política italiana, a única certeza, tinham dito logo na quinta-feira à noite alguns dos seus próximos, é que Berlusconi permanece como líder indiscutível do maior partido da direita, o PdL, membro do Governo de coligação liderado por Enrico Letta, do Partido Democrático. Entre as ameaças proferidas ontem é cedo para perceber quais poderão ser concretizadas.
Berlusconi especializou-se em desafiar a realidade. Não desiste. Ignorar factos tornou-se ainda mais necessário, agora que os factos são cada vez mais duros.
Facto: Berlusconi não vai poder candidatar-se a cargos políticos até completar 83 anos (faz 77 em Setembro). Depois de 23 anos de batalhas jurídicas, com mais amnistias e prescrições de delitos do que absolvições, a condenação do Supremo é mesmo definitiva - o procurador de Milão já assinou a execução da sentença e Berlusconi tem até 16 de Outubro para decidir se cumpre serviço público ou se permanece em prisão domiciliária durante a pena. Se dúvidas houvesse, já teve de enfrentar a primeira consequência prática, ao ficar sem passaporte.
Facto: o Supremo decidiu reenviar para um tribunal de Milão a decisão sobre a interdição de exercer cargos públicos durante cinco anos a que o político tinha sido condenado. Mas mesmo que a Justiça ainda anule essa condenação, o Senado poderá entretanto expulsá-lo. A lei obriga o Parlamento a pronunciar-se sempre que um dos seus membros é condenado. A questão será primeiro debatida na Comissão de Ética e Eleições da câmara alta, onde a oposição (Movimento 5 Estrelas, de Beppe Grillo, e Esquerda, Ecologia e Liberdade, de Nichi Vendolla) está em maioria.
Berlusconi e o PdL não são os únicos a tentar ignorar factos por estes dias. Letta é primeiro-ministro há três meses e já teve de dizer várias vezes que o destino do seu Governo não depende dos problemas de Berlusconi com a Justiça. Mas nem todos no seu PD concordam. Afinal, o partido que começou por recusar coligar-se com o PdL depois das eleições de Fevereiro admite agora manter-se no poder aliado a um partido que tem como líder um homem condenado por ter enganado o fisco quando era chefe do Governo.
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