quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Let's SWAP again, like we did last summer ...

Joaquim Pais Jorge, o terceiro a contar da direita, não resistiu e demitiu-se ontem

Mais um dia, mais um swap, mais uma baixa 

Editorial / Público
Ainda estão por explicar as razões que levaram à saída do secretário de Estado do Tesouro
Era o desfecho previsível. Joaquim Pais Jorge apresentou a demissão. Numa altura em que o secretário de Estado do Tesouro deveria estar mais preocupado com o regresso de Portugal aos mercados e com a preparação do Orçamento para 2014, Joaquim Pais Jorge enredou-se numa polémica cheia de contradições, falhas de memória, desmentidos e confirmações.
Depois de na terça-feira Pedro Lomba ter falado em "inconsistências problemáticas", pensava-se que o Governo iria deixar cair o secretário de Estado do Tesouro. Mas numa espécie de reviravolta, com contornos quase teatrais, o Governo não só não o demitiu, como ainda pôs cá fora um comunicado a dizer que alguém tinha manipulado um dos documentos que ligavam Pais Jorge à tentativa de venda dos polémicos swaps ao Governo de José Sócrates. O Governo passava a ideia de que ia segurar o secretário de Estado. Mas eis que, aparentemente vinda do nada, fomos ontem surpreendidos com a carta de demissão.
À política o que é da política, e à justiça o que é da justiça. Se alguém forjou algum documento, cabe à Justiça investigar a existência de algum ilícito criminal.
Mas em termos políticos, e de substância, para justificar (ou não) a demissão, nem o comunicado das Finanças, nem a carta de demissão confirmam ou desmentem a questão central neste enredo: Joaquim Pais Jorge esteve ou não envolvido na tentativa de venda dos swaps para mascarar as contas públicas?

Se Pais Jorge não teve quaisquer responsabilidades, então por que é que se demitiu? Se o secretário de Estado estava inocente, por que é que a ministra das Finanças aceitou a sua demissão? Não seria inédito não aceitar uma demissão, como nos mostra a nossa história recente. Infelizmente, este caso vai terminar com mais dúvidas do que certezas.

As "inconsistências" de Joaquim Pais Jorge
No curto prazo de uma semana, o secretário de Estado do Tesouro entrou numa espiral de hesitações e contradições que culminou com o seu pedido de demissão. É a terceira vítima política do caso dos swaps
O secretário de Estado do Tesouro demissionário, Joaquim Pais Jorge, é agora o exemplo máximo de que a transparência que o ministro Miguel Poiares Maduro procura incentivar com os briefings à comunicação social se pode voltar politicamente contra o Governo. Na sexta-feira da semana passada, no briefing do Governo, Joaquim Pais Jorge mostrou-se nervoso (com frequência não se lembrava de uma das perguntas acabadas de colocar), deu respostas lacónicas às questões dos jornalistas, por vezes até entrando em contradição. E a saída apressada da sala incentivada pelo secretário de Estado adjunto Pedro Lomba não permitiu grandes esclarecimentos. O resultado foi deixar ainda mais dúvidas no ar, em especial por se apresentar publicamente para esclarecer uma notícia da véspera e dar várias vezes a resposta "não me lembro". Anteontem, em novo briefing, Pedro Lomba dava uma "machadada" na credibilidade de Pais Jorge admitindo que tinham sido "detectadas inconsistências problemáticas" nas versões da história. Depois de ter segurado o secretário de Estado durante mais umas horas, foi o próprio que ontem se atirou (ou foi levado a atirar-se) para fora da equipa com algum estrondo.
Funções
Joaquim Pais Jorge garantiu que em 2005 as suas responsabilidades incidiam "sobre a relação com os clientes do banco" e a sua "função era conhecer os clientes em Portugal, tentar conhecer as áreas de actuação que lhes poderiam interessar e conhecer os limites dessa actuação". "As responsabilidades relativamente à concepção, à elaboração e à negociação de produtos derivados não eram e nunca foram da minha competência. Repito não eram e nunca foram da minha competência." Não explicou como é que, sendo o elo entre o Citigroup e os clientes, não tinha conhecimento dos produtos oferecidos pelo banco a um cliente. Paulo Gray, então director executivo do Citigroup em Portugal e agora gestor da Stormharbour (que o actual Governo contratou para assessorar o IGCP na renegociação dos contratos swap de empresas públicas), disse ao PÚBLICO que era a equipa com base em Londres "a fazer e a apresentar propostas, normalmente acompanhada por profissionais do Citi Portugal, especificamente da área de mercados".
Reuniões
Na sexta-feira, Joaquim Pais Jorge disse não ter conhecimento de qualquer proposta de compra de swaps feita pelo Citigroup ao "gabinete" de José Sócrates. "Não posso evidenciar que tenha estado sequer nessa apresentação. Não me lembro se estive nessa apresentação. Não posso confirmar [se a apresentação aconteceu], se eu não estive lá... Admito que a apresentação existiu, uma vez que consta do ficheiro do IGCP."
Paulo Gray, ao fim do dia, afirmava ao PÚBLICO: "Do que me recordo, confirmo que o Joaquim Pais Jorge não esteve envolvido [na elaboração, negociação ou entrega de qualquer proposta]."
Na segunda-feira, na sequência da notícia da SIC que garantia que Pais Jorge teve três reuniões na residência oficial do primeiro-ministro em 2005, o agora ex-secretário de Estado do Tesouro acabou por se lembrar. E enviou uma declaração, por escrito, para a estação de televisão admitindo ter tido reuniões com os assessores de José Sócrates, para financiamentos para grandes investimentos em infra-estruturas, recapitalização da banca e para produtos derivados de antecipação de receita fiscal.
Joaquim Pais Jorge e Paulo Gray tiveram pelo menos três reuniões na residência de São Bento com os assessores económicos de Sócrates, Óscar Gaspar e Vítor Escária, revelou anteontem a revista Visão: a 1 de Julho de 2005, a 21 do mesmo mês e a 25 de Outubro.
Proposta
"Nego que entreguei essa proposta, sim", garantiu Joaquim Pais Jorge no briefing de sexta-feira. "É imprópria e abusiva a leitura feita pela Visão", apontou, sobre o facto de ter participado na apresentação de swaps. Paulo Gray garantiu ao PÚBLICO, logo na sexta-feira, que Joaquim Pais Jorge "não esteve envolvido" na proposta e acrescentou que ele próprio não podia "precisar" se esteve "presente nesta apresentação, em particular".
Os encontros foram pedidos pelo banco. No primeiro, diz a Visão, falou-se sobre o problema dos créditos fiscais (1,3 mil milhões de euros) e da Segurança Social (9,4 mil milhões) vendidos por Durão Barroso ao Citigroup em 2003 (por 1,76 mil milhões).
Nessa altura foi também feita a apresentação de "uma proposta para a gestão da dívida da República Portuguesa" - um contrato swap - para manter fora do balanço os financiamentos imediatos e fazê-los reflectir na dívida pública durante 30 anos. O tema foi aprofundado no segundo encontro. Na última reunião, já depois da recusa do Governo - Ministério das Finanças e IGCP -, Pais Jorge, Paulo Gray e os assessores de Sócrates voltaram ao assunto dos créditos fiscais.
O documento da proposta do Citi ao Governo e ao IGCP, a que o PÚBLICO também teve acesso, contém o nome de Joaquim Pais Jorge. Mas as Finanças disseram anteontem que se trata de um documento manipulado. A única diferença é que no original não aparece o nome do governante demissionário.
Demissões
O caso dos swaps, que o actual Governo começou por usar para responsabilizar os socialistas, acabou por se tornar, nestes dois meses, numa verdadeira pedra no sapato da equipa de Passos Coelho. Depois das demissões, em Abril, de dois secretários de Estado (Juvenal Peneda e Braga Lino - que já voltou à Metro do Porto) e de três gestores públicos (Silva Rodrigues, Paulo Magina e João Vale Teixeira), a polémica fez ontem nova vítima.
Debaixo do fogo da oposição devido a falhas nas explicações que deu nas duas vezes que esteve na comissão parlamentar de inquérito, a credibilidade da ministra das Finanças estava a ficar ainda mais desgastada com a situação constrangedora em que se encontrava o secretário de Estado do Tesouro, uma escolha pessoal de Maria Luís Albuquerque para ocupar o seu anterior cargo. Resta saber se a demissão de Pais Jorge vai contribuir para pacificar o Governo ou, como diz a oposição, é a própria ministra que continua em causa.

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