terça-feira, 20 de agosto de 2013

Quatro anos depois a crise atinge mercados emergentes. Incerteza atira bolsas mundiais para mínimos das duas últimas semanas. Wolfgang Schauble confirma terceiro resgate à Grécia.

Bolsas mundiais estão a navegar num mar de incógnitas; Tóquio liderou as perdas na sessão de ontem

Quatro anos depois a crise atinge mercados emergentes
Rui Barroso e Marta Marques Silva  
21/08/13 in Diário Económico

Governos tentam estancar perdas cambiais através da subida das taxas de juro, pressionando o consumo interno alimentado nos últimos anos por uma política de crédito fácil.

"Parece que agora a dor vai ser sentida nos mercados emergentes", comentava Nitin Mathur, analista do Espírito Santo Investment Bank em Mumbai, em declarações à Bloomberg. Nos últimos anos a fraqueza da economia norte-americana alimentou o êxodo dos investimentos para activos de maior risco e maior retorno, com benefício dos mercados emergentes - 3,9 biliões de dólares nos últimos quatro anos. Mas agora as perspectivas de recuperação nos EUA, com a consequente diminuição na política de estímulos económicos, ameaça provocar uma verdadeira retirada massiva destes investimentos, à medida que os capitais retornam à origem.

Este movimento de "recuo da maré" está a deixar a nu as economias mais vulneráveis. A rupia indiana bateu ontem um novo mínimo histórico, pressionada por um défice recorde e por várias tentativas do governo indiano de estancar as perdas cambiais em detrimento da economia doméstica. A economia tailandesa entrou em recessão no segundo trimestre, o mercado accionista indonésio perde 20% desde o pico, o crédito malparado não pára de crescer na banca chinesa e a Malásia acaba de registar o segundo trimestre consecutivo de crescimento abaixo de 5%.

Confrontados nos últimos anos com a falta de procura por parte das economias desenvolvidas, muitos dos emergentes optaram por alimentar o consumo interno através da liberalização do crédito barato. Procurando agora estancar a desvalorização cambial - despoletada pela venda de activos nestas moedas - países como a Índia, Indonésia e até mesmo o Brasil, têm lançado mão da subida das taxas de juro de referência. A consequência imediata é o aumento dos encargos para a população que, perante o crédito fácil, se endividou nos últimos anos para comprar carro e casa. Diminui assim o rendimento disponível e o consumo interno, com as necessárias consequências no crescimento económico dos emergentes, mais dependentes do que nunca da economia doméstica.

"A tendência já lá estava. Mercados emergentes como a Índia, Brasil e China têm dado sinais de um crescimento menor e têm mostrado dados económicos abaixo das previsões. A preocupação é que estas economias atingiram um nível de crescimento máximo e que não conseguirão continuar a crescer ao mesmo ritmo do passado devido aos dados decepcionantes que têm mostrado", explica Agostinho Leal Alves, analista do BPI, ao Diário Económico. Uma tendência que está, no entanto, a ser acelerada pelas "incertezas sobre a alteração de política monetária nos EUA, que tem causado muita volatilidade nos mercados. O que tem acontecido é uma fuga de activos de mercados emergentes, que implica a venda dessas moedas", adianta. Na mais recente sondagem feita pela Bloomberg, 65% dos economistas acreditam que o início da retirada de estímulos económicas nos EUA comece já em Setembro.

Na última semana o índice de referência indiano caiu mais de 5%, enquanto na Tailândia as perdas chegaram aos 6% e na Indonésia aos 10%. Todas as principais moedas de economias emergentes perdem frente às moedas de referência, dólar e euro, no último mês (ver gráfico), e as ‘yields' da dívida pública de países como a Índia estão agora ao nível mais alto desde a crise de 2008.

"Vamos entrar num período de estagnação nos próximos anos. Foi uma boa região para investir e agora está a chegar ao fim. As economias asiáticas tiveram um ‘passeio no parque' porque compraram crescimento através da alavancagem. Deveriam antes ter utilizado esse tempo para realizarem reformas estruturais. Mas preferiram usar o dinheiro barato e desfrutar das altas taxas de crescimento. Essa oportunidade faz agora parte do passado", comentava o economista-chefe do HSBC para a Ásia, Fred Neumann, ao "Financial Times".

Incerteza atira bolsas mundiais para mínimos das duas últimas semanas
Por José Manuel Rocha
21/08/2013 in Público
A Ásia abriu o dia a descer e contaminou a Europa, com várias praças a caírem mais de 2%. A abertura positiva de Nova Iorque amaciou as perdas. Futuro do programa de estímulo da Fed preocupa investidores

As bolsas europeias e asiáticas tiveram ontem um dia para esquecer, com recuos em todas as praças, descendo para mínimos de duas semanas. Tóquio liderou as perdas, com Hong-Kong, Lisboa e Madrid a curta distância. O facto de as principais cadeias retalhistas norte-americanas estarem a divulgar resultados positivos, acabou por ditar uma abertura em ligeira alta nas duas plataformas de negociação de Nova Iorque.

Numa semana em que os analistas apontam o facto de muitos investidores estarem a protagonizar movimentos de consolidação de carteiras, há muitas razões que explicam este sobe e desce nas principais praças mundiais, que parecem navegar à vista, sem um rumo definido.

Na Europa, todos parecem concordar que a sessão cinzenta de ontem fica a dever-se, entre outros motivos, aos receios de que o bom desempenho das economias no segundo semestre não tenha correspondência directa no próximo. As perspectivas na zona euro mantêm uma forte dose de indefinição, dadas as dificuldades inerentes à execução dos programas de ajustamento financeiro, especialmente em Chipre e na Grécia (ver texto ao lado). Num quadro em que parece inevitável um novo resgate à Grécia, a banca foi o sector que saiu mais penalizado. Em Portugal também foi este o rumo, numa sessão em que o PSI-20 caiu 1,77%, com apenas a Sonae e a Sonaecom no verde.

As bolsas europeias foram também influenciadas pela aproximação do momento em que serão divulgadas as minutas da última reunião do comité de política monetária da Reserva Federal (Fed) norte-americana. Há, neste campo, uma forte expectativa de que a autoridade liderada por Ben Bernanke possa ter discutido já a data em que será reduzido o actual programa de estímulo económico, que se tem traduzido num programa de compra de títulos do Tesouro ao ritmo de 85 mil milhões de dólares mensais. As minutas são divulgadas hoje.

Para além de reflectirem este facto, as bolsas asiáticas (que perderam mais de 2%) acusaram também o impacto da divulgação de dados económicos que mostram que algumas das mais importantes economias da região estão a abrandar de uma forma significativa, havendo até casos de situações de recessão em países como a Tailândia e a Malásia - que no passado ostentaram níveis de crescimento muito assinaláveis.

O abrandamento significativo da economia chinesa, onde a situação do crédito malparado assume proporções preocupantes, e o défice público de quase 5% na Índia - onde a rupia está em queda livre no confronto com o dólar - compõem o resto do quadro em que as bolsas se movimentam actualmente.

Ontem, vários jornais revelavam que muitos investidores que, há quatro ou cinco anos, moveram os seus capitais para os mercados da economias emergentes estão neste momento a fazê-los regressar aos Estados Unidos, precisamente porque as perspectivas de crescimento sustentado na maior economia do mundo são agora muito mais sólidas. Dos mais de 150 mil milhões de dólares que foram aplicados em produtos financeiros nos primeiros sete meses do ano, cerca de dois terços tiveram como destino empresas norte-americanas, avançava ontem a agência Bloomberg, citando dados do BlackRock Investment Institute.

Estes dados, associados a um melhor desempenho das cadeias retalhistas - o que faz supor uma recuperação mais sólida do consumo privado -, justificaram a abertura em alta ligeira em Nova Iorque, que depois evoluiu para ganhos mais significativos.

As bolsas europeias, embaladas por este sentimento, recuperaram um pouco as perdas acumuladas, mas sem amaciarem os traços negros que acabaram por marcar a sessão.




Wolfgang Schauble confirma terceiro resgate à Grécia
Por José Manuel Rocha
21/08/2013 in Público

A rentrée política na zona euro poderá ficar marcada por novos acidentes de percurso na novela já longa da crise do euro. A situação em Chipre, defendem várias instituições, está a ficar fora de controlo. E a Grécia poderá regressar ao centro do debate com a iminência de ter de pedir um terceiro resgate financeiro.

Ontem, para que não restassem lugares a dúvidas, o ministro das Finanças alemão confirmou a ideia. Num comício de campanha para as eleições de Setembro, na cidade de Ahrensburg, Wolfgang Schauble afirmou que "haverá, mais uma vez, um programa de ajuda à Grécia" e, citado pela agência Bloomberg, acrescentou que a ideia já tinha sido defendida pelo Bundesbank.

Há cerca de dois meses, na sequência da libertação de mais uma tranche de ajuda à Grécia, o banco central alemão afirmava que a avaliação da troika que lhe deu lugar foi concluída sob intensas "pressões políticas" e defendia que os problemas do país não estavam em vias de ser solucionados. Por isso, o Bundesbank defendia que a Grécia não iria sobreviver sem um novo empréstimo dos parceiros internacionais.

Schauble alertou, no entanto, que ao contrário do segundo resgate, desta feita não haverá lugar a um novo perdão de dívida. Esse foi, sublinhou o ministro das Finanças alemão, um acontecimento "único" e irrepetível.

Ontem também, a agência Reuters noticiava que a Grécia não dispõe de financiamento suficiente para colmatar as necessidades no período 2014/2016. E acrescentava que o país e os seus credores "estão a analisar várias formas de resolver esta escassez de financiamento". No final de Julho, o Fundo Monetário Internacional situava necessidades não cobertas de 4,4 mil milhões de euros em 2014 e 6,5 mil milhões em 2015.


Ontem, o Tesouro Público espanhol conseguiu baixar os juros médios para colocar 4147,8 milhões de euros em títulos de dívida a seis e 12 meses, numa altura em que o risco de dívida está nos níveis mais baixos em dois anos. Na semana passada o risco da dívida em Espanha - medido pela diferença entre os títulos espanhóis e os alemães a 10 anos - caiu para perto dos 250 pontos base, o nível mais baixo desde Agosto de 2011. com Lusa

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