Matar elefantes com mata-moscas
Por Eduardo Oliveira Silva
publicado em 14 Ago 2013 – in (jornal) i online
A ilusão da lei de limitação de mandatos, que, além de mal
feita, não renova a classe política
Há várias entidades culpadas da confusão que está instalada
à volta de algumas candidaturas a presidências de câmaras.
Em primeiro lugar os partidos políticos e os elementos que
participaram na feitura de uma lei obviamente mal concebida, e de forma
eventualmente propositada, tais as suas indefinições e ambiguidades, pois a
qualidade e a inteligência dos integrantes nos trabalhos não poderia em nenhuma
circunstância permitir tamanho absurdo.
Em segundo lugar, a culpa cabe à Assembleia da República
enquanto órgão de soberania colectivo, que não soube chamar o assunto a si
para, ainda a tempo de evitar toda a confusão que se verifica, alterar o texto,
clarificando-o para que não subsistissem quaisquer dúvidas de interpretação,
que só desprestigiam a democracia e o país.
Subjacentes à lei estão obviamente duas leituras muito
diferentes do problema. Uma que limita os mandatos executivos de presidente a
três e que não permite mais nenhuma candidatura a essa função em qualquer outra
autarquia, e outra que entende ser legítima a candidatura a mais mandatos,
desde que noutro município.
É bom dizer-se que, além dos presidentes de câmara que são
executivos, a medida se aplica aos presidentes de junta, o que suscita dúvidas
exactamente iguais, além de outras específicas destes cargos em algumas
situações novas. Isto porque se questiona a legalidade das candidaturas dos
presidentes de junta que se candidatem a mais de três mandatos às novas
freguesias resultantes de agregações.
Como se verifica, há pano para mangas nesta matéria, para a
qual se alertou neste jornal e em muitos outros órgãos de comunicação social
através de notícias e de espaços de opinião há mais de um ano, sem qualquer
efeito prático.
A última palavra cabe ao Tribunal Constitucional, que terá
de decidir se vinga a tese de mera restrição quanto a lugares executivos em que
se exerceram funções durante três mandatos ou se há uma proibição total e
absoluta.
Seja qual for a decisão, a ideia subjacente à lei é, de
forma mais ou menos alargada, a limitação de mandatos para obrigar à renovação
da classe política.
Ora é certo que para esse propósito a medida é inútil,
porque haverá sempre quem salte das câmaras para as assembleias municipais, das
assembleias municipais para o parlamento (onde não há limite de mandatos), do
parlamento ou de uma empresa pública ou privada que precise de influência para
o governo ou vice-versa e daí para uma simpática fundação ou (para quem tenha
preparação) para o próprio Tribunal Constitucional.
Essa implacável lógica sempre existiu, continuará a existir
e nenhuma lei de limitação de mandatos irá impedir a sua perpetuação por muitos
anos. Basta ler os currículos da maioria dos governantes para perceber que a
intenção desta lei é matar elefantes com um mata-moscas. As questões
substanciais são obviamente outras, como toda a gente sabe e percebe, e não se
resolvem com leis.
As incompatibilidades eleitorais e a judicialização da
política
Por José Mouraz Lopes
14/08/2013 in Público
Em Março passado alertámos publicamente para o problema
jurídico da lei das incompatibilidades eleitorais e o desgaste que a
indefinição legal iria provocar sobre a atuação dos tribunais.
Invocámos, então, a tentativa de judicialização da política
que a questão iria suscitar.
Em pleno processo eleitoral, as primeiras decisões
confirmaram o que então se previu. Há decisões a interpretar a lei de
determinada forma e há decisões a interpretar a mesma lei de forma contrária.
Argumenta-se e comenta-se a judicialização da política por
via das decisões judiciais tomadas.
Se, juridicamente, nada há de estranho nestas decisões,
tendo em conta a elaboração dúbia da lei e o princípio da independência dos
tribunais, os cidadãos dificilmente compreendem estas situações e as suas
perplexidades naturais recaem sobre os juízes que, de forma diferente,
interpretam a mesma lei.
O que acontece é que o legislador quis provavelmente que
fosse este o resultado de uma lei que todos sabiam que viria provocar esta
situação.
Deixando, propositadamente, aos tribunais, o ónus de
interpretar uma lei que o legislador não quis oportunamente clarificar,
remeteu-se para a justiça uma decisão que tem um reflexo político-partidário
imediato e que poderá servir como justificação para derrotas ou vitórias
partidárias e concretamente para um "saldo" político que convém a
muitos.
Os tribunais foram empurrados e envolvidos para um jogo
partidário que não lhes pertence e que não querem mas que, por força das suas
competências, têm que decidir.
Os juízes, aplicando a lei, decidem, juridicamente e sempre
de forma livre e independente, ainda que de forma diversa. Sejam as leis bem ou
mal feitas!
Os tribunais cumprem as leis e a Constituição. Os resultados
eleitorais estarão nas mãos dos cidadãos e só nestes.
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