sexta-feira, 1 de abril de 2022

A “pipa de massa” do Novo Banco

 


 EDITORIAL

A “pipa de massa” do Novo Banco

 

O legado de António Ramalho é este: muita massa e pouca ética. No fundo, somos todos lesados.

 

Amílcar Correia

1 de Abril de 2022, 5:30

https://www.publico.pt/2022/04/01/economia/editorial/pipa-massa-novo-banco-2000904

 

António Ramalho deixa a liderança do Novo Banco com a certeza de missão cumprida e uma “pipa de massa” na instituição. O Novo Banco registou lucros de mais de 184 milhões euros no ano passado, o que aconteceu pela primeira vez e, apesar disso, e como sempre, voltou a pedir mais de 200 milhões de euros ao Fundo de Resolução.

 

Como diz o comunicado da instituição, António Ramalho concluiu, nos últimos quatro anos, a “limpeza do balanço do banco de todos os problemas do legado herdado do antigo BES, conduziu o Novo Banco a um caminho de rentabilidade sustentável e concluiu os compromissos acordados entre a República Portuguesa e a Comissão Europeia. O comunicado ignora o que mais importa.

 

O mandato do CEO só terminava daqui a dois anos e o próprio dizia, ainda há poucas semanas, que estava “comprometido totalmente com o sucesso do banco até 2024”. António Ramalho está a ser investigado pela suspeita de ter auxiliado Luís Filipe Vieira, um dos maiores devedores, a responder às perguntas incómodas dos deputados da comissão parlamentar de inquérito à sua gestão como CEO, e a quem o banco vendeu a sua dívida ao desbarato, sem nunca executar as garantias que possuía.

 

O comunicado também omite o facto de o Banco de Portugal ter remetido para o Banco Central Europeu uma avaliação da sua idoneidade, por causa de escutas telefónicas comprometedoras. As escutas dão conta de uma duvidosa relação de proximidade com o ex-presidente do Benfica e o teor das conversas com Vítor Fernandes, que deixou a sua administração quando estava na calha para presidir ao Banco Português de Fomento, com o qual falava sobre a “pipa de massa” dos fundos europeus que Fernandes iria gerir.

 

Não há, igualmente, alusão à venda simpática de activos aos incumpridores da dívida, negociados em circuito fechado, a exemplo do caso do Nata 2; à venda de activos com 70% de desconto a um fundo ao qual o chairman esteve associado; ou aos 13 mil imóveis transaccionados nas ilhas Caimão com empréstimos concedidos aos compradores.

 

Muito menos uma palavra de reconhecimento ao Fundo de Resolução, financiado pelos contribuintes, que entre 2018 e 2021 injectou no capital do banco mais de 3,4 mil milhões. “Saque ao fundo” foi como Vítor Fernandes classificou a tentativa de Ramalho de imputar ao Fundo de Resolução o custo do desinvestimento da operação em Espanha, por questões éticas e não legais. O legado de António Ramalho é este: muita massa e pouca ética. No fundo, somos todos lesados.

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