ALTERAÇÕES
CLIMÁTICAS
Para cumprir as suas metas, Lisboa vai ter mesmo de parar
os carros que entram na cidade
Plano de Acção Climática Lisboa 2030 foi aprovado pelo
executivo camarário esta quarta-feira e nele estão previstas zonas de emissão
reduzidas, vários planos como o Solar, o de Drenagem ou o de Renda Acessível.
Assim com algumas medidas de combate à pobreza energética e de aposta nos
transportes públicos para reduzir os carros que entram todos os dias na cidade.
Cristiana Faria
Moreira
23 de Março de
2022, 21:27
É expectável o agravamento das cheias em Lisboa ao longo
do século, devido à ocorrência de eventos de precipitação extrema e o aumento
do nível médio da água do mar, provocados pelas alterações climáticas
Se se olhar para
o palavreado mais técnico, o Plano de Acção Climática Lisboa 2030 é um
“instrumento de integração e gestão das políticas da cidade em matéria de
mitigação, adaptação, erradicação da pobreza energética e promoção da qualidade
de vida e bem-estar”. O que quer isto dizer? Que quer pôr a cidade no caminho
da neutralidade carbónica em 2050 e que traça para 2030 uma meta intermédia de
redução das emissões na cidade em 70%. Para se atingir esse cenário, cada
lisboeta terá de ter reduzido, em cerca de 30 anos (o ano de referência é
2002), a emissão de 2,3 toneladas de dióxido de carbono. Será possível lá
chegar? Num extenso plano, com perto de 200 páginas, herdado do anterior
executivo, está traçado o diagnóstico, as metas e algumas formas para o
conseguir.
Sabendo que os
transportes e serviços representam 74% das emissões de gases de efeito de
estufa na capital e que, ainda assim, ao longo da última década se verificou
“um decréscimo significativo das emissões da maioria dos poluentes,” estas
continuam ainda a ser “relativamente elevadas”. O principal responsável é o
trânsito automóvel, tendo na Avenida da Liberdade o exemplo mais flagrante de como
se excedem limites muito além do estipulado.
O objectivo, em
2030, é que apenas 34% das deslocações na cidade sejam realizadas em veículo
automóvel próprio e 33% em modos activos (10% em bicicleta), suportadas por
10.000 lugares de estacionamento. Para tal, a estratégia passa, claro está,
pelos transportes públicos. Na próxima década, o município quer electrificar o
transporte público, com mais autocarros eléctricos — frota da Carris com
emissões zero em 2038 — e com a expansão do metropolitano. E ter um posto de
abastecimento urbano de hidrogénio verde.
O plano prevê
ainda a implementação de mais Zonas de Emissões Reduzidas (ZER), considerada
uma medida chave para reduzir as emissões provenientes do tráfego rodoviário. E
onde consta a polémica ZER Avenida-Baixa-Chiado que, segundo o documento,
permitirá reduzir 40 mil carros a circularem diariamente neste eixo (menos
cerca de 40% do que actualmente).
A par disso, quer
continuar-se a ligar os corredores verdes da cidade. Até 2030, nove corredores
serão concluídos, assim como dez novas pontes para bicicletas e peões (seis já
estão prontas), e um total de 200 km de ciclovias.
Sol e água
Uma forma de reduzir
os cerca de 400 mil veículos que entram todos os dias na capital, seria fixar a
população que nela entra todos os dias. Por essa razão, o “município de Lisboa
chama a si a responsabilidade de promover habitação a custos acessíveis”,
comprometendo-se com “a progressiva reabilitação energética do parque edificado
existente dedicado a habitação social”, que tem hoje cerca de 23 mil casas
(cerca de 7% dos alojamentos familiares clássicos existentes).
Desta forma, um
dos projectos é implementar um sistema que permita que “consumidores
vulneráveis beneficiem de electricidade solar nas suas habitações”. Ao mesmo
tempo, numa cidade em que as casas foram, maioritariamente, construídas antes
de 2006, sem grandes preocupações com o desempenho energético, a câmara diz
querer aproveitar o “sol de Lisboa”.
O programa Lisboa
Cidade Solar, “uma das medidas bandeira” para chegar à neutralidade carbónica e
“erradicar a pobreza energética”, fixa o documento, tem sobretudo foco nas
energias renováveis. O município quer criar uma Comunidade de Energia Lisboa
para partilha da produção da central solar fotovoltaica de Carnide e de outros
sistemas fotovoltaicos existentes ou a construir. A câmara fará também um
projecto-piloto nas 128 habitações municipais que estão em construção em
Entrecampos.
Outras medidas do
Plano de Acção Climática Lisboa 2030
Estas são outras
das medidas que contam no plano para serem implementadas até 2030:
·
Expansão dos sistemas de recolha
selectiva, incluindo sistema de recolha porta-a-porta de biorresíduos (50% até
2030);
·
Aumento da taxa de reciclagem e
preparação para reutilização até 60%;
·
Melhoria da rede de saneamento de águas
pluviais para a minimização e controlo de inundações:
·
Instalação de 200 novos bebedouros e
reabilitação de chafarizes;
·
Redução da actividade do Aeroporto de
Lisboa;
·
Reabilitação de chafarizes históricos;
Em curso, com a
construção de um dos dois túneis de drenagem previstos, está o Plano Geral de
Drenagem e Lisboa, aprovado em 2015 e que implicará um investimento de 185 milhões
de euros.
Perante os riscos
de aumento do nível médio da água do mar, a ocorrência de eventos de
precipitação extrema, provocados pelas alterações climáticas, juntamente com a
crescente ocupação do território, é expectável o agravamento das cheias em
Lisboa ao longo do século.
Além da
construção dos túneis, cada um com 5,5 metros de diâmetro, está previsto o
reforço da capacidade de colectores e a construção de bacias de retenção a céu
aberto, importantes para uma melhor gestão do ciclo da água e para atenuar os
efeitos das ondas de calor. Em curso estão projectos no Parque Urbano da Quinta
da Granja e no Campo Grande, a naturalização do escoamento no Parque Eduardo
VII, a bacia de retenção integrada no Parque do Alto da Ajuda e a
requalificação da linha de água e das bacias de retenção do Parque do Vale da
Ameixoeira. Por isso não estranhe se em dias de muita chuva os vir alagados.
Será mesmo para recolher as chuvas que servem.
A implementação
do Plano de Acção Climática Lisboa 2030 está orçada em quase 774 milhões de
euros. Na próxima década, o foco de investimento estará na adaptação de
edifícios e transportes, consideradas áreas prioritárias. Entre investimento
público e privado estima-se que seja superior a 4100 milhões de euros. O
investimento público será parcialmente feito através do Plano de Recuperação e
Resiliência (PRR) e de outros fundos comunitários.
A proposta foi
aprovada esta quarta-feira por todas as forças políticas do executivo, com
excepção do Bloco de Esquerda que se absteve. Na base dessa decisão está a
participação da Galp na consulta pública deste plano. A empresa pediu “à Câmara
de Lisboa que abandonasse a sua meta de eliminação do gás natural das
estruturas da Câmara de Lisboa até 2035. [O município] aceitou este pedido da Galp
que significa a manutenção do uso de combustíveis fósseis pela autarquia e
lucros milionários para a empresa, mais ainda num momento de especulação com os
preços do gás devido à guerra na Ucrânia”, alertou o BE, numa nota aos
jornalistas.

Sem comentários:
Enviar um comentário