terça-feira, 29 de março de 2022

O esclarecimento que falta sobre a “lei dos sefarditas”

 ATENÇÃO! Ver também :   Constança Urbano de Sousa: “Sofri pressões ao mais alto nível para não alterar Lei da Nacionalidade”   http://ovoodocorvo.blogspot.com/2022/03/constanca-urbano-de-sousa-sofri.html

 



EDITORIAL

O esclarecimento que falta sobre a “lei dos sefarditas”

 

A Assembleia e o anterior Governo não viram ou não quiseram ver esse monstro. Têm culpa neste cartório. Fosse por conivência, por incompetência ou por cegueira.

 

Manuel Carvalho

28 de Março de 2022, 21:30

https://www.publico.pt/2022/03/28/sociedade/editorial/esclarecimento-falta-lei-sefarditas-2000498

 

Constança Urbano de Sousa decidiu falar sobre o chumbo às alterações que, como deputada do PS, propusera à Lei da Nacionalidade em 2020. O que disse torna o silêncio sobre a atribuição da nacionalidade a judeus sefarditas ainda mais insustentável: as investigações do PÚBLICO sobre o escandaloso negócio da nacionalidade portuguesa ganham outro significado; a pretexto de uma legítima e meritória reparação da memória histórica, criou-se um monstro para alimentar escritórios de advogados e milionários desejosos de ter as portas abertas da União Europeia; sob a capa de bons propósitos, transformou-se a nacionalidade portuguesa numa simples mercadoria.

 

Que a lei tenha sido aprovada em 2013 sem o mínimo de exigências de verificação e controlo, compreende-se. O que não se compreende é que em 2020, quando estava à vista de todos a escandalosa mercantilização da nacionalidade e quando se tinha percebido que a Espanha suspendera o processo, ninguém tenha mexido uma palha para corrigir as fragilidades da lei. Constança Urbano de Sousa ficou praticamente sozinha nessa defesa. Pior: foi atacada por “muitas pessoas que se estavam a sentir afectadas do ponto de vista pessoal, mas também patrimonial”.

 

Se hoje todos consideram fundamental mexer na lei é apenas porque as investigações do PÚBLICO, o inquérito do Ministério Público, que já levou a detenções, e o espantoso processo da nacionalidade de Roman Abramovich expuseram o que estava em causa. Mas se é saudável constatar que os erros foram cometidos e vão ser corrigidos, é igualmente obrigatório que a Assembleia da República averigúe o que correu mal.

 

Afinal, uma lei aprovada em sua sede acabaria por se revelar num alfobre de negociatas e numa fraude de dimensões incalculáveis. A Assembleia e o anterior Governo não viram ou não quiseram ver esse monstro. Têm culpa neste cartório. Fosse por conivência, por incompetência ou por cegueira, permitiram que advogados em Lisboa, no Porto ou em Telavive continuassem a vender passaportes a quem os pudesse pagar. Ora, um passaporte não é um bem transaccionável: é um direito de pertença, uma ligação afectiva e cultural que se herda ou se conquista, que não se compra.

 

Nesta indispensável necessidade de escrutínio e transparência, é importante saber o papel que figuras gradas do PS tiveram na desvalorização dos problemas da lei. A apologia de Manuel Alegre a que tudo ficasse igual pode justificar-se pelo idealismo. Já Maria de Belém Roseira tem neste caso ligações e interesses familiares que a deixam numa posição desconfortável. Deve-se esclarecer também o combate que esse cavaleiro do legado heróico da portugalidade, Ribeiro e Castro, moveu contra as alterações da lei. Será por se ter sentido “afectado do ponto de vista patrimonial”, na sua condição de advogado?

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