Bruxelas
admite grandes divergências com Washington sobre o TTIP
PÚBLICO 02/05/2016
- 11:40 (actualizado às 17:26)
Documentos
divulgados mostram as pressões dos EUA para que a UE suavize as suas
regras comerciais. Processo negocial está praticamente estagnado.
A Comissão Europeia
admitiu esta segunda-feira que continuam a existir grandes
divergências entre Bruxelas e os Estados Unidos sobre a Parceria
Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP). "Não posso
dizer que tenhamos resolvido qualquer das grandes questões em que
divergimos dos Estados Unidos", disse o negociador europeu,
Ignacio García Bercero.
Bercero foi forçado
a dar algumas explicações depois de terem sido divulgados
documentos sobre as negociações que indicavam a existência de
pressões da parte de Washington para suavizar as regras comerciasi
europeias. Porém, diz o El País - um dos jornais que teve acesso
aos documentos, através da Greenpeace Holanda -, ao tentar dar
explicações o negociador europeu também lhe disferiu um duro golpe
ao confirmar que o processo está parado.
Há muito que
organizações como a Greenpeace exigiam maior transparência quanto
ao que estava a ser negociado entre as duas partes. O jornal espanhol
diz ter tido acesso à posição americana no TTIP “pela primeira
vez, perto no branco”, através de documentos confidenciais que
mostram a “enorme influência dos lobbies europeus e
norte-americanos sobre os negociadores do acordo”.
A documentação
conta com 248 páginas e mostra que os assuntos mais polémicos são
os relacionados com as áreas de meio ambiente e saúde, com os EUA a
forçarem uma redução dos padrões de regulamentação.
Entre as áreas
mencionadas estão as indústrias de cosméticos (nos EUA podem ser
usados animais em testes laboratoriais, por exemplo) e o uso de
pesticidas na agro-indústria. Nestes temas, os negociadores
admitiram que não poderiam tomar uma decisão sem consultar a
indústria, diz o mesmo diário.
O documento recebido
pela Greenpeace Holanda representa dois terços do acordo que estava
em cima da mesa na abertura da 13.ª ronda negocial, em Abril, e que
incluía 13 capítulos do tratado, adianta a AFP. Mostra que o texto
prevê a supressão de uma regra que permite aos países “regular o
comércio” para “proteger a vida, e a saúde de humanos, animais
e plantas”.
Em geral, a União
Europeia tem padrões mais elevados relativamente ao ambiente e à
protecção da saúde, o que implica, por exemplo, a proibição de
importação de carne tratada com hormonas, e restrições maiores à
entrada de alimentos geneticamente modificados ou submetidos a certos
pesticidas, explica El País. Para os EUA, essas regras são
“barreiras ao comércio”.
Apesar da assinatura
do Acordo de Paris para a redução das emissões de dióxido de
carbono, será abandonado o “princípio de precaução”, que
permite impedir a distribuição ou retirar do mercado produtos
potencialmente perigosos ainda que sem dados científicos para uma
avaliação completa dos riscos, denuncia a Greenpeace.
Desde meados de 2013
que os dois lados têm tentado chegar a um acordo que suprima as
barreiras comerciais e regulamentares. A posição norte-americana
tem sido mantida em segredo por exigência do Presidente Barak Obama,
que durante a sua recente visita à Alemanha vincou a necessidade de
acelerar as negociações.
Mas, como aponta o
jornal espanhol, dificilmente o acordo será assinado este ano, não
só devido à oposição da opinião pública europeia, como pelas
restrições que têm sido levantadas por vários partidos que em
breve poderão formar governo. “Apesar de a Europa se mostrar muito
conciliadora em público, o texto cita ‘discussões muito difíceis’
em muitos assuntos” e “há uma possibilidade muito limitada de
chegar a uma posição comum”.
O director europeu
da Greenpeace, Jorgo Riss, afirma num comunicado que “os documentos
confirmam" o que a organização tem "vindo a dizer há
muito tempo": "O TTIP coloca os interesses corporativos no
centro da tomada de decisões políticas, em detrimento do meio
ambiente e da protecção do consumidor. Sabíamos que a posição de
partida da Europa era má, com poucas linhas vermelhas. Agora sabemos
que a posição dos Estados Unidos é ainda pior e que não respeita
essas linhas."
Os defensores do
acordo argumentam que abater tarifas e regulações de mercado entre
os dois lados do Atlântico vai acelerar o comércio ao ponto de se
criar milhares de novos postos de trabalho e gerar mais de 80 mil
milhões de euros anuais aos Estados Unidos e mais de 100 mil milhões
para a UE. Mas para os seus críticos, vai mais além dos tratados
tradicionais de livre-comércio, dando novos poderes a empresas sobre
os Estados e ameaçando interferir nos padrões europeus em matérias
como o ambiente, saúde, protecção dos consumidores e de
trabalhadores. O documento obtido pela Greenpeace dará mais uma arma
para ser usada na sua contestação.
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