Macroscópio
Por José Manuel
Fernandes, Publisher
Boa noite!
Foi mais uma longa
maratona do Eurogrupo, que entrou pela noite dentro com momentos em
que se comentava se Euclid Tsakalotos (na foto a falar com
Dijsselbloem) não teria de aguentar uma negociação tão longa como
a enfrentada por Alexis Tsipras há um ano, mas o fumo branco lá
apareceu já de madrugada, em boa parte porque foi necessário
telefonar a Christine Lagarde, a directora-geral do FMI e esta estava
no Cazakistão e foi muito difícil estabelecer a ligação. No final
o FMI acabou por ceder muito na sua exigência de reestruturação da
dívida grega, já que tudo ficou adiado para 2018 e só se os gregos
cumprirem mais alguns condicionalismos. Poul Thomsen, diretor do
departamento europeu do FMI, a reconhecer que, “do lado do FMI,
fizemos uma enorme cedência”. O que significa que Wolfgang
Schäuble levou novamente a melhor.
A verdade porém é
que, desta vez, poucos foram os que deram real atenção a mais esta
longa e tensa reunião em Bruxelas, e em boa parte percebe-se porquê:
A Grécia é um caos. “E a Europa está pelos cabelos”, como
disse ao Observador o antecessor de Varoufakis, Gikas Hardouvelis,
numa entrevista cuja leitura considero indispensável. O ministro das
Finanças do último governo da Nova Democracia faz um relato muito
cru do que se passa no país, um país a que verdadeiramente deixámos
de prestar atenção apesar da multiplicação das medidas de
austeridade e das greves gerais. Primeiro explica que o que se passa
no país é consequência do “comportamento errático que [o
governo de Tsipras] teve na primeira metade de 2015 e pela atitude de
confrontação [de Varoufakis]”. Depois conta como a economia
voltou a afundar, pois o que se fez foi que, “Em vez de se cortar
na despesa e nos salários da função pública, e fechar empresas
que não acrescentam qualquer valor social, [os líderes europeus]
deixaram o governo seguir pela via dos aumentos de impostos, o que
cria um enorme desincentivo para as pessoas trabalharem.” Sendo que
fora da Grécia isso já não parece incomodar ninguém:
A Europa, agora,
parece que já não quer saber. Já não há contágio nos mercados
financeiros, a Grécia está isolada. Muita Europa está farta até
aos cabelos de ouvir falar da Grécia, dos gregos, dos políticos
gregos, da economia grega… Não querem saber — é como se
dissessem: “Façam o que quiserem, não queremos saber se vão
promover o crescimento da economia, se fazem o ajustamento todo pela
via dos aumentos de impostos, força… Querem criar mais uma
recessão? Força… A escolha é vossa. O problema é vosso.
Deixem-nos em paz“.
Este leitura não é
muito diferente da de Alexis Papachelas, colunista do diário grego
Ekathimerini que, hoje mesmo, em An insane country, nota que “Outside
of Greece, no one cares anymore whether the country is governed by
the right or the left. They just want to get on with their business.”
E depois acrescenta: “Things that should have been done,
irrespective of who’s in charge, will be done, though at a cost.
Political time in the bailouts era is running at a vertiginous speed
and the beast keeps “swallowing” prime ministers and
administrations. A leftist government is carrying out the most
right-wing policies anyone could imagine, overturning the entire
post-dictatorship pattern. History is moving along, albeit in an
insane manner. But it is moving on and that is what matters most.”
É como se se
vivesse numa espécie de ficção de que tudo corre conforme o
previsto, e é exactamente essa a perspectiva do editorial do Wall
Street Journal, The Greek Fiction. Onde escreve, depois de descrever
a futilidade do que se discute entre a Europa e o FMI sobre o que
deve ser feito por Atenas: “Mr. Tsipras’s statist ideology is as
hostile as ever to the supply-side reforms Greece needs, and both the
IMF and other creditors seem to be giving up hope that any other
Greek politician could enact such reforms. Which means Greece’s
crisis will drag on no matter what happens next with Greece’s
debts.”
(Já agora, para
conhecer melhor os pormenores do acordo do Eurogrupo há um bom
descodificador do que passou na mesma edição europeia do Wall
Street Journal, The Short Answer: How Greece Got Another Debt Deal.
Vejamos uma das suas perguntas e respostas:
Why Did the IMF Give
So Much Ground?
Despite the IMF
staff’s deep skepticism about Greece’s solvency and the math of
the bailout plan, they ultimately answer to the IMF board, where
Western governments such as Germany and the U.S. have a voting
majority.
Behind the scenes,
German Chancellor Angela Merkel has pressed in recent weeks for the
IMF to announce that it will rejoin the bailout, so that she can get
the Greek issue off the table quickly without controversy in Germany.
Ms. Merkel and U.S.
President Barack Obama are eager to avoid a new drama over Greece
when the European Union is looking unusually politically fragile
given the refugee crisis, the rise of populist parties across the
bloc, and the U.K.’s referendum on whether to leave or remain an EU
member.
Under pressure from
its dominant board members, the IMF had little choice but to accept
Germany’s preferred formula on Greek debt.)
A análise do outro
grande jornal económico europeu, o Financial Times, ajuda, em Messy
Greek debt deal leaves key questions unanswered, a perceber o que
foram as cedências alemãs, que também as houve: “For Germany
too, the deal amounted to a trade-off. Wolfgang Schäuble, German
finance minister, met his two main red lines: no haircuts and no
Bundestag votes before the German federal elections in 2018. But to
secure the IMF’s political participation, he made a concession: an
implicit commitment to meeting a DSA that will be hard to retreat
from. And language was softened on the requirement for Greece to meet
a 3.5 per cent budget surplus target for at least the next 10 years;
this would now be reviewed in 2018.”
De resto este jornal
acrescenta um delicioso pormenor sobre a forma como as negociações
decorreram, já que boa parte do tempo foi consumido em encontros
bilaterais fora da sala do Eurogrupo entre Dijsselbloem, Schäuble e
Poul Thomsen: “For the others present, the tedium gradually turned
to farce as they passed the midnight hour. The strut of “Zorba’s
dance” rang out across the room from one mischievous official’s
iPad, only to be clapped on by colleagues. The deal came soon after,
but most negotiators knew they would be back for another debt dance
soon enough.”
A fechar a minha
selecção de hoje, a análise de Xavier Vidal-Folch no El Pais,
Pasar del “no pasarán” al “cosa hecha”, onde nos fala da
“esquizofrenia política de la UE, el FMI y Atenas”. E onde
procura explicar o contorcionismo de cada um dos protagonistas, assim
enquadrado: “Cuando el severo ministro alemán de Finanzas, herr
Nein, anuncia paz, es que la paz es cosa hecha. Aunque se deba a la
urgencia de no estropear su agenda electoral, a la de no enrarecer
más la cuestión británica presentando a Europa como madrastra, o a
ambas. Además del calendario, otras fuerzas empujan al acuerdo. Como
la esquizofrenia —o contradicciones internas— de cada actor, que
les dificulta mantener posiciones.”
E por hoje é tudo.
Reencontramo-nos na sexta-feira, que o Macroscópio não faz ponte.
Aproveitem o feriado para descansarem e, também, para porem as
leituras (algumas) em dia.
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