“Os terrenos que existem perto de Lisboa estão a ser
vendidos pelo dobro ou mais do que custavam antes da pandemia”
01.09.2021 às
09h02
MARISA ANTUNES
Projeto no Belas
Clube de Campo com 3 pisos, que englobam cinco suites, sala de jogos,
garrafeira, escritório e sala de cinema Foto DR
No ateliê de
arquitetura Traçado Regulador do arquiteto João de Sousa Rodolfo, a pandemia
não foi sinónimo de crise. O ateliê tem projetado casas de sonho nas periferias
de Lisboa e tem acompanhado de perto a dinâmica deste mercado
Éportuguês,
projeta casas de sonho e está entre os ateliês de arquitetura mais seguidos nas
redes sociais. O Traçado Regulador, com sede em Paço de Arcos, tem mais de um
milhão de seguidores não só em Portugal mas em todo o mundo e o segredo do
sucesso está precisamente em fazer sonhar quem tem e quem não tem capacidade
para adquirir uma destas habitações. Porque sonhar não tem preço e está à
distância de um clique.
A pandemia trouxe
ainda mais visibilidade ao elevar ainda mais o estatuto das moradias e a Traçado
Regulador viu o trabalho a aumentar significativamente em projetos deste tipo
de imóveis desde que os confinamentos começaram a empurrar as pessoas para
dentro dos seus apartamentos.
“Até à pandemia,
as pessoas não tinham muita consciência da importância do conforto e do espaço
nas suas habitações. Com a permanência prolongada nas suas casas, muitas vezes
sobrelotadas, os conflitos entre as pessoas, acabaram por aumentar. E isso
levou à necessidade de mais espaço e conforto. Mas não só. Também a ligação com
a Natureza não era sentida por muita gente. As pessoas tinham um dia cheio
entre solicitações, entre a casa e o trabalho e numa constante mudança de
ambientes. Mas quando se fica durante um mês em casa, aí sim, percebe-se que
essa ligação à Natureza é mesmo necessária”, aponta arquiteto João de Sousa
Rodolfo, fundador do ateliê Traçado Regulador, que neste momento tem cerca de
70 projetos em curso, 70% dos quais na região da grande Lisboa, em zonas como
Cascais, Aroeira (onde tem sete obras em curso), o Belas Clube de Campo, em
Queluz (mais quatro), entre outras.
Estas novas
necessidades aliadas ao teletrabalho têm levado muitos a questionar a
necessidade da centralidade, reforça ainda o arquiteto, levando a uma dinâmica
nunca vista de venda de terrenos nas periferias de Lisboa.
“Praticamente não
há lotes de terreno à venda ao redor de Lisboa. Esgotou praticamente tudo na
Quinta do Perú, no Belas Clube de Campo, no Oeiras Golf, na Aroeira… E os
terrenos que existem estão a ser vendidos pelo dobro ou mais do que custavam
antes da pandemia, foram adquiridos nessa altura por investidores” refere o
arquiteto.
E dá exemplos:
“Um lote com 1.600 m2 na Aroeira custava em 2017 cerca de 220 mil euros,
atualmente uma área equivalente no mesmo empreendimento está a ser vendida por
um milhão!”.
Ao aumento dos
terrenos soma-se também o valor acrescido dos custos de construção, uma queixa
que já era habitual junto dos operadores do mercado e que se veio a
intensificar com a pandemia.
“Em 2017/2018 o
preço por metro quadrado de construção de uma casa rondava os 1.000 ou 1.100
euros. Neste momento situa-se nos 1.500, 1.600 euros. São valores especulados
para o mercado nacional mas que estão abaixo do que é praticado lá fora, em
Espanha ou em França. E isso reflete-se numa maior procura por parte dos
clientes estrangeiros que no caso do nosso ateliê representam 30% da nossa
faturação”, realça ainda João de Sousa Rodolfo.
Os portugueses
representam assim uma fatia significativa da clientela da Traçado Regulador e
estes começam a procurar outros locais para construir uma casa à medida dos
seus desejos, esgotadas que estão as localizações já referenciadas.
“Temos cada vez
mais projetos em Azeitão, Sesimbra, Setúbal ou Vila Franca de Xira. Com o
teletrabalho criou-se, sem dúvida, um novo paradigma e a acessibilidade mais
imediata foi colocada em causa. Há cada vez mais pessoas a questionar o que
ganham em estar no centro da cidade”, acentua o responsável.
Moradia
localizada no Oeiras Golf & Residence virada sobre o campo de golfe
E quanto custa
uma casa, das tais que geram milhares de ‘likes’ e reforçam a legião de
seguidores da Traçado Regulador? “O custo da habitação é determinado pela
qualidade das infraestruturas e pelos metros quadrados que as pessoas pretendem.
Hoje em dia, por exemplo, toda a gente quer um escritório em casa e às vezes
até dois. Quanto mais área construída mais irão pagar, claro”, diz o arquiteto,
acrescentando que as habitações que projetam podem começar nos 400 mil até
vários milhões de euros, ainda que o padrão se situe entre os 600 e os 800 mil
euros”.
Moradia premium
situada num lote com cerca de 1600m2, em Soltroia, Troia
A aposta nas
redes sociais que trouxe popularidade ao ateliê dentro e fora de Portugal
começou em momentos de crise. “Foi quase uma obra do acaso. Eu sempre recusei
projetar moradias porque dava pouco dinheiro e muito trabalho mas em 2011, por
alturas da Troika, quando o imobiliário caiu a pique, deixei de recusar.
Depois, e apesar de ser um bocadinho velho para as redes sociais, aprendi a
explorá-las e percebi que eram uma excelente fonte de divulgação”, recorda o
arquiteto.
E a partir daí o
número de seguidores multiplicou-se. Hoje, o site da Traçado Regulador está no
top 10 dos ateliês de arquitetura com mais fãs no Facebook, alguns dos quais se
tornaram clientes vindos de diferentes geografias e que aqui compraram casa, desde
americanos, franceses e libaneses. “O nosso sucesso nas redes sociais tem mesmo
a ver com as partilhas e as casas de sonho. As pessoas querem sonhar. Se
partilhasse imagens de cemitérios, ninguém queria partilhar”, remata, a
gracejar, o arquiteto.
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