quinta-feira, 2 de setembro de 2021

Moedas pede transparência no urbanismo, Medina responde com acusações de “oportunismo político”

 


AUTÁRQUICAS 2021

Moedas pede transparência no urbanismo, Medina responde com acusações de “oportunismo político”

 

Primeiro debate sobre as eleições autárquicas em Lisboa, na SIC, juntou sete candidatos. Discussão em torno da habitação municipal, tema que mais dividiu os candidatos, e do destino a dar ao aeroporto da Portela ocupou grande parte do debate.

 

Sofia Rodrigues e Cristiana Faria Moreira

2 de Setembro de 2021, 22:05 actualizado a 2 de Setembro de 2021, 23:30

https://www.publico.pt/2021/09/02/politica/noticia/moedas-pede-transparencia-urbanismo-medina-responde-acusacoes-oportunismo-politico-1976145

 

O primeiro debate entre sete candidatos à câmara de Lisboa, esta noite, na Praça do Município e transmitido pela SIC, aqueceu quando Carlos Moedas pediu maior transparência nas questões do urbanismo e Fernando Medina ripostou, acusando o candidato do PSD/CDS de “oportunismo político”.

 

“A maneira como o urbanismo é trabalhado precisa de ser mudado. As pessoas entregam um processo e não sabem para onde vai. Temos casos suspeitos e pessoas arguidas”, disse o antigo comissário europeu, depois de o candidato do Chega, Nuno Graciano, ter falado em “indícios de corrupção” na câmara de Lisboa. Nuno Graciano referiu as ligações da número dois da lista de Fernando Medina, Inês Lobo, ao antigo vereador Manuel Salgado, que é arguido em processos de urbanismo.

 

O presidente da câmara escusou-se a responder ao candidato do Chega – “não lhe quero dar palco” – o que motivou uma troca de palavras entre os dois candidatos. Mas quando Carlos Moedas disse que é preciso repensar a transparência na área do urbanismo, embora salvaguardando que a forma como Nuno Graciano abordou o tema “não será a melhor”, Fernando Medina acusou a candidatura do centro-direita personificar o “oportunismo político”.

 

Os dois candidatos já tinham tornado evidente uma divergência em torno do envio dos dados pessoais de activistas russos para a embaixada em Portugal. Fernando Medina considerou que tomou as medidas necessárias para que o “erro” não se volte a repetir enquanto Carlos Moedas defendeu que se devia ter demitido do cargo. Neste ponto, Bruno Horta Soares, da Iniciativa Liberal, sustentou que o caso é um problema de “liderança” que Medina “ainda não percebeu a gravidade”.

 

Na primeira ronda do debate, o vereador e candidato da CDU João Ferreira reclamou os louros de medidas como o programa de renda acessível, a contenção do alojamento local e o passe metropolitano, o que foi considerado como uma “apropriação excessiva” pelo presidente da câmara. Já Beatriz Gomes Dias, a candidata estreante do Bloco, assumiu que se vai bater por um programa de habitação acessível “100% público” e mostrou-se contra o envolvimento de PPP. Sobre habitação, a candidata do PAN, Manuela Gonzaga, concordou com Fernando Medina quando disse não ter preconceitos ideológicos na área da habitação e defendeu que é preciso fazer um levantamento de pessoas em risco de despejo, criando um gabinete de acompanhamento.

 

Falhas na habitação

O tema habitação ocupou boa parte do debate com os adversários de Medina a acusarem o autarca recandidato de não ter cumprido com as promessas feitas há quatro anos. 

 

“Medina disse que ia fazer 6000 fogos e não fez. O Programa de Renda Acessível falhou, o urbanismo está estagnando e depois temos os bairros municipais. São realmente vergonhosos”, atirou Carlos Moedas, lembrando que nos últimos meses tem visitado estes bairros onde viu pessoas a viver em condições “inumanas" na cidade. O que, entende, revela que a empresa que os gere, a Gebalis, não está a cumprir a sua função. Propõe, por isso, mudar a gestão desta empresa, responsável pela gestão de 25 mil fogos municipais. 

 

Além disso, lembrou o social-democrata, há centenas de fogos devolutos pela cidade que poderiam ser colocados o mercado a renda acessível. E reforçou que a solução para fazer funcionar o PRA é agregar investimento público e privado. 

 

O candidato comunista, João Ferreira, considerou que o programa da câmara em matéria de habitação (resultante do acordo de gestão da cidade feito com o BE no início do mandato) foi um "rotundo fracasso”, por ter ficado muito aquém do objectivo de assegurar o acesso à habitação a mais 25.000 pessoas. E notou a necessidade de reforçar a propriedade pública e a propriedade cooperativa, rejeitando também a intervenção privada na promoção pública de habitação. E lembrou o polémico caso das Torres do Restelo, cujo projecto foi reformulado, depois de grande pressão popular. “Conseguimos converter este projecto num programa inteiramente público”, retirando a alienação de 30% das casas a privados, como previsto inicialmente, disse João Ferreira. 

 

Já o candidato liberal, Bruno Horta Soares, disse defender um modelo build to rent, ou seja, construir para arrendar. “Nós achamos que a CML tem o dever de ter políticas públicas de habitação e não políticas de habitação pública”, atirou, defendendo que a construção e gestão do parque habitacional deve ficar em mãos privadas. 

 

No debate, entrou também Nuno Graciano, candidato do Chega, para perguntar a Medina por que faz promessas que não consegue cumprir, referindo-se às casas que não foram entregues. 

 

Na resposta a todos os “ataques” dos adversários, o candidato socialista foi lembrando não só os obstáculos colocados pela pandemia, como o facto de a vertente privada do PRA ter sido, por diversas ocasiões, travada pelo Tribunal de Contas, atrasando o arranque das empreitadas. 

 

Ainda em matéria de habitação, Fernando Medina e João Ferreira haviam de juntar-se na crítica a uma proposta de Carlos Moedas: a de isentar os jovens até 35 anos do pagamento do IMT quando comprem uma casa em Lisboa. “Não sei como é que isso pode resolver o problema a alguém”, disse Medina, para rapidamente João Ferreira concordar: “Até tira recursos à câmara para construir casas”, notou. 

 

Que destino para a Portela?

O debate entre candidatos à câmara da capital havia de focar-se também numa questão que ultrapassa os limites do município: o que fazer com o aeroporto da Portela? Que lugar tem na expansão aeroportuária que se preconiza para a área metropolitana de Lisboa? 

 

Fernando Medina acabou por reconhecer ter mudado de opinião à ideia consensualizada pelo Governo: Portela mais Montijo – entretanto bloqueado pelas câmaras da Moita e do Seixal e sendo agora objecto de uma análise estratégica (muito pedida pelas associações ambientalistas). 

 

“Estamos a viver um tempo de intervalo. Quando passarmos esta fase da pandemia vamos ter uma recuperação rápida do turismo. Não temos capacidade aeroportuária para receber 30 milhões de passageiros”, reconheceu o autarca recandidato. Portela principal e Montijo com menos capacidade está fora de questão, disse o autarca, considerando ainda ser “incompatível com a qualidade de vida na cidade”. 

 

Nesta matéria, Carlos Moedas disse-se defensor da solução Portela + 1, podendo o aeroporto secundário localizar-se no Montijo ou Alcochete, consoante a “avaliação que for feita pelos técnicos”. 

 

Já João Ferreira voltou a defender a solução de Alcochete, lembrando que em nenhuma capital europeia há um aeroporto e crescer dentro da cidade. “Até hoje a Portela era temporária. A única solução que permite a libertação de Lisboa é o campo de tiro de Alcochete”, disse, defendendo uma desactivação faseada da Portela. 

 

Do lado do Bloco de Esquerda, Beatriz Gomes Dias disse não ser possível continuar “neste ziguezague”. “Temos de ter uma decisão inequívoca sobre o que queremos fazer com o aeroporto”, admitindo que a opção por Alcochete deve ser a solução.

 

No entanto, lembrou, a parte desta opção deve ser feito um esforço apara a reduzir os voos provenientes da Europa, oferecendo outras opções de mobilidade, mais sustentáveis, como o reforço da ferrovia que permitam a ligação a outras cidades europeias. 

 

Para o candidato do Chega, a Portela deve ser desactivada. Entre Montijo e Alcochete, o que defende o partido? “O que os estudos mostrarem”, respondeu Nuno Graciano. 

 

Do lado dos liberais, Bruno Horta Soares defendeu ser preciso “perceber a importância que o turismo tem para a cidade”, admitindo por isso que é preciso continuar a “ter muita Portela e muito Montijo”. “Quem sabe se daqui a 15 anos os aviões serão solares ou eléctricos”, atirou, acusando-o João Ferreira de estar a pensar em “ficção científica”.

 

O “aeroporto feito e perfeito de Beja” é, para a candidata do PAN, a solução mais viável, rejeitando tanto a opção Montijo como Alcochete, dados os elevados custos ambientais que representam. 

 

Transportes gratuitos versus “ubers” de autocarros

Nas questões da mobilidade, Fernando Medina defendeu que só uma solução em conjunto com os 18 municípios da Área Metropolitana de Lisboa pode resolver os problemas, referindo obras como o metro do Sul de Almada e de Loures. Mas as promessas não convenceram Carlos Moedas que acusou o socialista de não ter cumprido medidas como os quatro mil lugares de estacionamento para evitar a entrada de automóveis na cidade. 

 

Defendendo que os transportes públicos e gratuitos são a solução para a mobilidade na cidade – tal como reiterou a candidata bloquista – João Ferreira criticou a linha circular do metro ao dizer que os moradores das freguesias mais populosas vão perder o acesso directo ao centro, o que também mereceu a concordância de Moedas. Já o candidato da Iniciativa Liberal mostrou-se contra a ideia da gratuitidade e defendeu a liberalização dos transportes, falando em “ubers” de autocarros. 

 

No minuto final, em que os candidatos podiam falar livremente sobre uma das suas bandeiras, Nuno Graciano aproveitou o tema da mobilidade e insurgiu-se contra a profusão de ciclovias na cidade. Já Manuela Gonzaga pegou na causa animal do PAN e defendeu uma cidade “livre de touradas”.

 

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