IMAGEM DE O VOODOCORVO
OPINIÃO
António Costa é o maior num país cada vez mais pequeno
Não admira que os sírios, os afegãos, os líbios ou
quaisquer outros pobres imigrantes que aterrem em Portugal por engano
desapareçam daqui num piscar de olhos para se irem atirar para os braços de
Angela Merkel.
João Miguel
Tavares
2 de Setembro de
2021, 6:16
Há 20 dias peguei
no carro e nos filhos e fui passear pela Europa, enquanto em Portugal o PS
preparava a entronização de António Costa num congresso em que os dois grandes
momentos foram, segundo pude ler na imprensa especializada: 1) uma ministra
muito curvada a receber um cartãozinho de plástico das mãos do
primeiro-ministro; e 2) a colocação de certas pessoas em determinadas cadeiras
na mesa principal do congresso. Não pude assistir em directo, porque por essa
altura estava a circular pelo estado de Baden-Württemberg, no sudoeste da
Alemanha, a conhecer a famosa Floresta Negra.
Penso ter ganho
com a troca. Foi uma viagem particularmente instrutiva. A minha mulher
encontrou uma casinha maravilhosa numa aldeia a 40 quilómetros de Estugarda,
onde ficámos instalados com todo o conforto – somos seis – por 145 euros a
noite. O gasóleo na Alemanha anda na casa dos 1,30 euros. As autoestradas são
gratuitas. E os produtos essenciais nos supermercados da zona – cuja variedade
bate qualquer hipermercado da Grande Lisboa – eram mais baratos (repito: mais
baratos) do que em Portugal.
Acreditem se
quiserem: passei meia-dúzia de dias magníficos numa das regiões mais ricas e
bonitas da Europa a gastar menos dinheiro do que se tivesse ido para o Algarve.
Não admira que os sírios, os afegãos, os líbios ou quaisquer outros pobres
imigrantes que aterrem em Portugal por engano desapareçam daqui num piscar de
olhos para se irem atirar para os braços de Angela Merkel. Não são só os
salários alemães que são muitos mais altos – à boleia de taxas e taxinhas, impostos,
portagens e tributações, o custo de vida em Portugal, após tudo ser bem
espremido, está pela hora da morte.
Os meus filhos
adolescentes, de queixo caído com o que viam na Alemanha, perguntavam-me como
era aquilo possível – salários tão elevados com um custo de vida tão baixo –, e
eu mandava-os contar os camiões nas autoestradas (milhares), as empresas nas
margens do Reno (centenas) ou os terrenos agrícolas abandonados (zero). E
depois contava-lhes histórias bonitas de há trinta anos, sobre o Portugal das
décadas de 80 e 90, quando tinha a idade que eles têm hoje e acreditava
ingenuamente que um dia o nosso país poderia ficar parecido com aquilo que
estavam a ver. Nos dias que correm, para a sua geração, é mais Dante e a Divina
Comédia: “Ó, vós que entrais, abandonai toda a esperança.”
Ler numa aldeia
alemã as notícias do congresso do PS e a auto-satisfação do povo socialista com
o estado da governação, num grande júbilo celebratório por tudo aquilo que têm
oferecido a Portugal, dá vontade de uma pessoa se barricar numa cabana enxaimel
a comer salsichas Bratwurst até à morte. A telenovela venezuelana acerca da
“sucessão” do chefe é de uma futilidade absurda, e a inconsciência da
mediocridade que tem sido este país ao longo dos últimos 20 anos conduz os mais
velhos ao desespero ou à constante resmunguice (olhem para mim a levantar o
braço) e os melhores dos mais novos à emigração.
Sim, sei bem que
há uma longa tradição do português deslumbrado com o “estrangeiro”, e que estas
minhas palavras são, também elas, um sintoma do impasse em que nos encontramos.
De vez em quando há leitores que me perguntam: e soluções? Reparem: soluções há
imensas. Só que a maior parte do país votante já nem sequer percebe que há um
problema. É isso que dói. António Costa cresce cada vez mais pela simples razão
de que os portugueses ambicionam cada vez menos.
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