terça-feira, 12 de novembro de 2019

Imigração sobe 18%. Indianos entre os que mais chegam a Portugal


Há ruas de São Teotónio onde os portugueses são a minoria. E isso está a causar desconforto



Imigração sobe 18%. Indianos entre os que mais chegam a Portugal

Dados provisórios do SEF mostram que até fim de Outubro tinham sido concedidas 110.813 novas autorizações de residência. Brasil continua no topo. O Reino Unido, que estava em quarto lugar no ano passado, passa para segundo. Nepal continua em quinto. Agricultura e necessidade de mão-de-obra explicam subidas.

Joana Gorjão Henriques 12 de Novembro de 2019, 6:30

Há mais imigrantes a trabalhar nas estufas em São Teotónio MIGUEL MANSO

A dois meses de acabar o ano, os dados provisórios do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) apontam para uma tendência de crescimento de 18% na imigração.

Segundo números fornecidos ao PÚBLICO, até 31 de Outubro já tinham sido concedidas 110.813 novas autorizações de residência (AR), quase mais 17 mil do que em todo o ano de 2018 (93.154), mantendo-se assim uma tendência de subida nos últimos quatro anos. Já no ano passado se tinha registado o maior número de imigrantes de sempre em Portugal, que chegaram aos 480 mil. Os números de residentes devem ultrapassar os 566 mil, segundo a estimativa de 18% do SEF que não especificou números concretos em relação às nacionalidades.

Os brasileiros continuam no topo da tabela dos que mais estão a imigrar. Estes cidadãos são a maior comunidade imigrante em Portugal com mais de 105 mil residentes em 2018.

A maior novidade é a entrada da Índia para o top 5 da tabela das autorizações concedidas, ficando em quarto lugar e à frente do Nepal que ocupa o mesmo quinto lugar que em 2018. O Reino Unido, que estava em quarto lugar no ano passado, passa para segundo. A Itália também se mantém neste ranking, passando de segundo para quarto lugar. França sai da tabela dos cinco que mais pediram a residência.

Porém, os novos pedidos não correspondem todos, necessariamente, aos grupos de imigrantes que já vivem em Portugal. Nesta lista há ligeiras mudanças. Em 2019 as maiores comunidades são Brasil, Cabo Verde, Reino Unido, Roménia e Ucrânia – em 2018 também o eram, mas estavam em posições diferentes na tabela, também liderada pelo Brasil e Cabo Verde, mas seguida da Roménia, Ucrânia e Reino Unido.

Indianos e agricultura
O aumento do fluxo da imigração de indianos explica-se, em parte, com a subida de população estrangeira que vem trabalhar na agricultura. Aliás, em Odemira, onde estão concentradas grandes produções de frutos vermelhos que atraem mão-de-obra imigrante – ao ponto de o Governo ter aprovado a construção de alojamentos nas propriedades agrícolas, o que está a criar polémica – os dados provisórios de 2019 apontam para mais 28% de residentes estrangeiros (ou seja, devem passar de 6124 para 7838, e são sobretudo do Nepal, Índia, Bulgária, Tailândia e Alemanha). Os novos pedidos neste concelho subiram de 1807 para 2077 e vieram sobretudo de Índia, Nepal, Alemanha, Bangladesh e Reino Unido. 

Satbir Singh, 29 anos, indiano a viver em São Teotónio desde 2016 nota que de facto a imigração do seu país está a crescer desde há dois anos naquela zona, pelo menos. “Porque há muitas empresas aqui, há trabalho”, afirma ao PÚBLICO por telefone este trabalhador numa das estufas de frutos vermelhos.

Há ruas de São Teotónio onde os portugueses são a minoria. E isso está a causar desconforto
Nos últimos três anos houve sim um aumento de indianos a procurar a Solidariedade Imigrantes (Solim), associação que tem uma sucursal em Beja e que é uma das que tem mais sócios. Timóteo Macedo afirma, porém, que tem sentido um abrandamento na procura de imigrantes destes países. Os dados a que se refere o SEF podem corresponder a pedidos efectuados no ano passado ou em anos anteriores – porque entre a entrada do pedido e a concessão da autorização podem passar-se vários meses. “Não houve efeito-chamada, foram as necessidades objectivas porque apareceu trabalho em Portugal. Os fluxos migratórios movimentam-se entre a oferta e a procura”, afirma. Os indianos vêm também para a restauração. “Quem está nas cozinhas?”, interroga o dirigente.

O mesmo acontece com os nepaleses, analisa Kubber Karki, da Associação dos Nepaleses. “Continuam a chegar nepaleses. Vêm por causa do trabalho, da comida, do tempo.” O Alentejo e o Algarve são alguns dos destinos preferidos, e aí trabalham na agricultura, mas também na restauração ou em pequenos negócios como mercearias. Mas segundo Kubber Karki, há muita gente qualificada, engenheiros ou advogados, a trabalhar nas estufas ou em restaurantes. “Até terem o cartão de residência não arranjam bons trabalhos”.

As estatísticas e a realidade
Já em relação ao Reino Unido há duvidas sobre se os dados significam novas entradas ou se correspondem a residentes que se foram registar por causa do Brexit. Totalizados em 22.500 em 2017 e em mais de 26 mil em 2018, os britânicos são a terceira maior comunidade imigrante a viver em Portugal, segundo os dados provisórios do SEF em relação a 2019 (mais uma vez não forneceram números específicos). Ao PÚBLICO, o gabinete de imprensa da embaixada britânica calcula que a comunidade seja muito maior e chegue aos 50 mil. “Desde o referendo que a embaixada tem desenvolvido um esforço para que os britânicos não registados o façam de modo a que os seus direitos sejam garantidos. Esse esforço terá produzido efeitos”, referem.

Para Michael Reeve, director executivo da Afpop, a associação de proprietários estrangeiros em Portugal, há razão para que mais britânicos queiram mudar-se porque o país está entre os seus três destinos preferidos. Referindo-se aos imigrantes britânicos em Portugal como expatriados, Michael Reeve afirma que terá funcionado “o boca-a-boca” de quem vive no país. “A Câmara de Comércio Luso-Britânica tem feito uma boa campanha de marketing, este ano fez quatro eventos [no Reino Unido] para promover Portugal e quando as pessoas vêm que é um dos países mais seguros do mundo isso tem efeito positivo”.

Também em relação ao Brasil, Carlos Vianna, membro do Conselho das Migrações, e fundador da Casa do Brasil, acha que os dados estão bem abaixo das estatísticas. Calcula que haverá 200 mil brasileiros em Portugal, cerca de 2% da população, entre imigrantes não regularizados, imigrantes com AR e brasileiros que obtiveram a nacionalidade portuguesa. “Acredito que haja em Portugal cerca de 40 a 50 mil portugueses de origem brasileira como eu, que já sou português há quase 20 anos. No Brasil há imensos novos portugueses porque não há família com portugueses que não incentive os filhos a ter a nacionalidade. Quem tem avô brasileiro vai pedir a nacionalidade. Apelo ao Governo que faça um reforço dos consulados portugueses.”

Para Portugal têm vindo imigrantes de todos os perfis, mas ultimamente também pessoas da classe média e classe média alta que “compra lojas, apartamentos”. “A espiral de crise económica e política no Brasil tem empurrado a imigração brasileira para Portugal”.

E vai continuar a crescer, estima. “A dinâmica de chegada de gente está forte. As pessoas vêm bem informadas. Quando há um certo número de população num país isso gera um fluxo porque são os próprios que trazem amigos e parentes.”

tp.ocilbup@hgj

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