sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

BES. Contabilista "muito arrependido" diz que Salgado sabia de tudo. Salgado, Ricciardi e Carlos Costa vão ser chamados de novo a depor na AR.

Machado da Cruz (ao centro) responsabilizou directamente Ricardo Salgado pela "ocultação do passivo" no grupo

BES. Contabilista "muito arrependido" diz que Salgado sabia de tudo

Machado da Cruz garante que a ideia de ocultar o passivo, em 2008, foi de Ricardo Salgado. Assumiu os erros por "absoluta lealdade"

Por Margarida Vaqueiro Lopes
publicado em 9 Jan 2015 in (jornal) i online

O contabilista da Espírito Santo International, tornado famoso pelo próprio Ricardo Salgado, apontou ontem, mais uma vez, o dedo ao antigo banqueiro e garante que este sempre soube da ocultação das contas no grupo.

Francisco Machado da Cruz, que Salgado afirma ter sido o homem responsável por tudo, esteve ontem perante os deputados da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à gestão do BES e do GES, para desmentir o antigo presidente do BES.

Numa audição que decorreu à porta fechada, Machado da Cruz, que trabalhou no grupo durante 21 anos, disse-se "muito arrependido" por tudo o que fez e entregou aos deputados uma carta datada de Janeiro de 2014, dirigida a Ricardo Salgado e a José Castella, onde apresenta a sua demissão, apurou o i. E, referindo-se aos contactos com os auditores, que entretanto começaram a escrutinar as contas, escreveu Machado da Cruz na mesma carta: "Tenho alegado perante os auditores que existiu um certo descontrolo e que foram cometidos erros na contabilidade ao longo de alguns anos. Em consequência, e porque os auditores não aceitam uma explicação sem responsável, vi-me forçado a assumir pessoalmente esses 'erros' em diferentes ocasiões". E, remata o contabilista: "fi-lo por absoluta lealdade aos meus superiores hierárquicos e ao grupo".

Foi esta a mensagem que repetiu perante os deputados, na tarde de ontem. A de que estava arrependido, a de que tinha agido sempre sob ordens superiores e com o conhecimento de Salgado e de José Castella - controller financeiro do GES e que esteve no parlamento um dia antes de Machado da Cruz - e a de que assumiu publicamente culpas que lhe não pertenciam por "lealdade". Afirmou ainda o contabilista que a ideia de ocultar passivo, em 2008, veio do próprio presidente do BES e que aceitou esconder a dívida para bem do grupo. Algo que Machado da Cruz já tinha dito, aliás, aos advogados da ESI no Luxemburgo, em Março de 2014, tal como o i noticiou no início de Dezembro.

Na ocasião, o commissaire aux comptes garantiu aos advogados que agiu sempre sob as ordens de Salgado e que José Castella sabia de tudo. Declarações que fizeram a sociedade de advogados Arendt & Medernach entregar à ESI um parecer sobre o diferencial das contas da instituição desde 2008 onde apontavam para a existência de práticas criminais. Depois disso, a sociedade de advogados demitiu-se.

Quando foi confrontado com este facto concreto pelos deputados da CPI, Ricardo Salgado desvalorizou e lembrou que uns meses depois Machado da Cruz assumiu publicamente a responsabilidade por tudo.

Foi o suficiente para que o contabilista telefonasse a Fernando Negrão, presidente da CPI, logo no dia seguinte, a dizer-se disponível para responder aos deputados.

Durante a audição no parlamento, Machado da Cruz explicou ainda que a ideia inicial era ocultar passivo apenas em 2008, porque o Grupo Espírito Santo (GES) estava a registar perdas consideráveis, mas que esse cenário acabaria por repetir-se durante os anos seguintes.

O contabilista referiu ainda que aquilo que fez é algo de que não se orgulha e assumiu que a maquilhagem das contas foi feita para ocultar os prejuízos da ESI que não conseguiu enfrentar a crise internacional de 2008 como seria desejável.

Estas operações estão agora sob investigação judicial tanto em Portugal como no Luxemburgo. Aliás, recorde-se que Fernando Negrão informou os jornalistas que tanto José Castella como Machado da Cruz tinham requerido audições à porta fechada - e portanto sem a presença da comunicação social - alegando terem sido constituídos arguidos em ambos os países, o que os colocava sob segredo de justiça.


Na audição de ontem, aliás, e após algumas informações terem sido passadas para o exterior, o presidente da comissão parlamentar pediu aos deputados que desligassem os telefones.

Salgado, Ricciardi e Carlos Costa vão ser chamados de novo a depor na AR
CRISTINA FERREIRA e PAULO PENA 09/01/2015 - PÚBLICO

Anúncio foi feito pelo presidente da comissão de inquérito no final da audição do antigo contabilista do GES.

O presidente da comissão parlamentar de inquérito ao colapso do BES e do GES, o social-democrata Fernando Negrão, anunciou às primeiras horas da madrugada desta sexta-feira que os deputados vão chamar novamente Ricardo Salgado, José Maria Ricciardi e o governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, a depor no Parlamento.

A decisão foi comunicada no final da audição do antigo contabilista do Grupo Espírito Santo (GES), Francisco Machado da Cruz, que foi ouvido nesta quinta-feira à porta fechada durante perto de nove horas pelos deputados que integram a comissão.   

“Foi uma sessão de muitas horas, profícuas, com declarações com interesse para a descoberta dos factos”, disse Negrão no final dos trabalhos aos jornalistas que o aguardavam à saída da sala 6 da Assembleia. “Todas as perguntas foram respondidas” e “não vemos necessidade de voltar a chamar o Dr. Machado da Cruz”, acrescentou Negrão, sublinhando a relevância desta intervenção, tal como das anteriores, para o trabalho da comissão.

Francisco Machado da Cruz, o contabilista do GES que o ex-líder do Banco Espírito Santo (BES) acusou de ter manipulado as contas do grupo, foi ao Parlamento dizer que o conselho superior sabia de tudo e que a decisão de "ocultação do passivo" da Espírito Santo International não foi ideia sua, e sim de Salgado, "em 2008".

A audição de Machado da Cruz na AR foi a segunda em dois dias a decorrer sem a presença de jornalistas na sala, depois de na quarta-feira o antigo secretário do Conselho Superior do GES, José Castella, ter também invocado o regime do segredo de justiça para ser ouvido na mesma condição. Negrão avançou entretanto que na comissão de inquérito não deu entrada mais nenhum pedido de audiências à porta fechada.

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