quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Durão Barroso odeia Durão Barroso Por Luís Osório / VÍDEO / Um Clássico: Durão Barroso (Fujão Barroso) nos tempos de MRPP


Durão Barroso odeia Durão Barroso
Por Luís Osório
publicado em 28 Jan 2015 in (jornal) i online


Numa frase,o jovem Durão Barroso, esta semana homenageado por Angela Merkel, seria o primeiro a gritar palavras de ordem e a organizar motins contra o Durão Barroso maduro

A chegada ao poder de Alexis Tsipras é uma tragédia para Durão Barroso. Até ao passado domingo era indesmentível que os revolucionários jamais poderiam alcançar o poder numa sociedade plural e burguesa por meio do voto. Essa foi talvez uma das razões para que centenas de rapazes e raparigas tivessem mudado com os anos de azimute e convicções.

Jovens revolucionários poderiam baptizar os filhos com o nome de Ernesto ou Rosa, ter posters iconográficos da Revolução de Outubro, viajar de inter-rail ou à boleia, ver sessões contínuas de Bergman, acompanhar os sucessores de Sartre ou Camus, defender os direitos das minorias e acreditar em novas palavras e numa sociedade livre e sem amos. Poderiam tudo defender na sua juventude, mas continuarem a acreditar nisso aos 40 seria uma prova de demência, um insuportável ridículo. Quantas vezes ouvi dizer, até por respeitável gente de direita, que é saudável ser-se revolucionário até aos 20 e despropositado depois? Aos 40 anos é tempo de estarem bem colocados, de vestirem bons fatos, de ter carros e poder, de alcançar a maior quantidade de poder que lhes for possível. Essa é a história de vários jovens revolucionários de outrora, é a história de Durão Barroso, um dos mais relevantes maoistas do MRPP, que, com engenho e talento, fez uma transição pragmática para o grande poder.

Barroso, se nos dias que correm fosse jovem, estaria na linha dos que exultam com Tsipras. Teria estado nas manifestações de Atenas e celebrado a oportunidade de mudar o mundo e lançar a primeira pedra da construção de uma nova sociedade. Se porventura não estivesse a vitoriar a Grécia, as razões não seriam as que imagina - seria por achar, como bom jovem maoista, que o Syriza personifica um ideal burguês, frágil e cobarde na essência. Contudo, nem por um instante hesitaria em combater a troika, o imperialismo. Numa frase, o jovem Durão Barroso, esta semana homenageado por Angela Merkel, seria o primeiro a gritar palavras de ordem e a organizar motins contra o Durão Barroso maduro.

Tsipras fez o que mais nenhum revolucionário de esquerda conseguiu pelo voto: alcançou o poder. A primeira consequência só será visível dentro de umas décadas: quantos jovens sedentos de poder, e hoje revolucionários, continuarão a acreditar por saberem que, mesmo pensando o que pensam, terão a oportunidade de alcançar o poder? Só o tempo nos oferecerá respostas. Mas entre Tsipras e Durão prefiro o primeiro. Prefiro um vírus que ajude o mundo burguês, em que acredito, a ser melhor, a alguém que é condecorado pela representante de um país que, em primeira análise, está interessado na manutenção de um statu quo .

Precisamos de escrever um novo livro. De uma nova Europa. Mais justa e solidária. Que arrisque nas ideias e que não deixe ninguém para trás. Foi isso que nos fez progredir no século xx, foi a ameaça do comunismo que detonou a vontade de criação de uma sociedade mais justa. Tsipras ganhará se permitir que, mais uma vez, a Europa tenha a vontade de matar o marasmo que a tem ligada à máquina. Que o comunista Tsipras permita que Durão Barroso passe à história e seja substituído por outros líderes com a capacidade de ver para lá dos mercados e do polvo que nos ameaça o progresso, o bem-estar e a própria democracia.

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