sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Consegue explicar-me? Por Luís Osório.

"A pergunta que faço é simples e directa. Com tudo o que se sabe, apesar de todos os alegadamentes desta vida e das outras, gostaria de saber o que leva Ricardo Salgado a não estar preso preventivamente? Não é que o deseje, o país está coberto de lobos sedentos de vingança e ajustes de contas, mas adoraria entender melhor os pesos e as medidas."
Luís Osório

Consegue explicar-me?
Por Luís Osório
publicado em 23 Jan 2015 in (jornal) i online

Ricardo Salgado alegadamente ocultou um passivo da ESI num valor acumulado de 1,3 mil milhões de euros entre 2008 e 2013. Recebeu uma prenda generosa de um amigo construtor que, em troca de aconselhamento e bons contactos em Angola, lhe ofereceu 14 milhões de euros que, alegadamente, se esqueceu de declarar ao fisco. Desobedeceu alegadamente ao Banco de Portugal quando foi implementada uma estratégia que obrigava à separação das actividades financeiras do grupo das actividades não financeiras. Durante esse período, alegadamente, aumentou milhares de milhões a exposição do BES ao GES. Fez também um acordo com a "sua" PT, alegadamente com Henrique Granadeiro, para garantir 900 milhões de euros de financiamento à Rioforte. A Rioforte caiu e a PT foi um ar que lhe deu. Explodiu a credibilidade da PT, de Zeinal Bava e de Granadeiro. Destroços de um navio à deriva que perdeu 80 por cento do seu valor em menos de um ano. É obra.

Depois, como o i noticiou em primeira mão, os cinco ramos da família receberam um milhão cada um pelo negócio dos submarinos. Tudo alegadamente patrocinado por Ricardo Salgado, que, alegadamente, esteve também envolvido no escândalo do Mensalão, um esquema de financiamento partidário ao partido de Lula da Silva. O "Expresso" noticiou na altura e Salgado, alegadamente, retirou toda a publicidade do BES do grupo Impresa, o que motivou o corte de relações com Pinto Balsemão.

As notícias não se limitaram ao que descrevo. Lembramo- -nos da Operação Furacão, um megaprocesso de investigação de fraude fiscal. Alegadamente o homem foi falado. E do célebre caso Monte Branco, onde alegadamente Ricardo Salgado constava da lista de clientes da Akoya, rede suíça de fraude fiscal e branqueamento de capitais.

Continua a acompanhar-me? Então lembra-se do caso de venda das acções da EDP pelo BES Vida, feita dias antes da aprovação da dispersão em bolsa da EDP Renováveis, que, alegadamente, levantou suspeitas de abuso de informação privilegiada. Ou o caso da recente multa (1,1 milhões de euros) em Espanha, devido a alegadas infracções de uma norma para a prevenção de branqueamento de capitais (em 2006, a Guardia Civil já havia feito uma rusga a uma dependência espanhola do BES).

Alegadamente, milhares de milhões perdidos. Centenas de clientes com uma mão à frente e outra atrás. Mais de um século de uma história de família arrastada na lama. Dinheiro que se escondeu, ocultou, inventou. Uma fábrica de mentiras que se foram alimentando umas às outras até criar um monstro de várias cabeças. Traições. Alegadas corrupções, traficância de influências, homens caídos em desgraça, empresas que perderam o seu valor, a possibilidade de um efeito dominó nas empresas portuguesas.


A pergunta que faço é simples e directa. Com tudo o que se sabe, apesar de todos os alegadamentes desta vida e das outras, gostaria de saber o que leva Ricardo Salgado a não estar preso preventivamente? Não é que o deseje, o país está coberto de lobos sedentos de vingança e ajustes de contas, mas adoraria entender melhor os pesos e as medidas. A Sílvia Caneco, que ajudou o país a perceber toda a história através das páginas do i, já me explicou a razão - a mim e aos leitores. A Margarida Vaqueiro Lopes, que tem acompanhado a comissão parlamentar nas páginas do i, já me simplificou a história como se eu fosse uma criança. Porém, cá para nós, não entendo. A culpa pode ser minha. E das notícias truncadas. Salgado pode estar inocente. Alegadamente.

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