domingo, 1 de março de 2015

Tristes figuras em Atenas, Lisboa e Madrid / Tsipras fez denúncias ridículas e Passos e Rajoy foram fazer queixinhas a Bruxelas. / Grécia apela ao diálogo após queixas a Juncker por Portugal e Espanha. / Governo grego diz que não procura "inimigos externos" em resposta a Rajoy.

Tristes figuras em Atenas, Lisboa e Madrid
DIRECÇÃO EDITORIAL 02/03/2015 - PÚBLICO

Tsipras fez denúncias ridículas e Passos e Rajoy foram fazer queixinhas a Bruxelas.

Depois dos disparates e das rasteiras de Passos Coelho e Mariano Rajoy ao Governo grego em benefício do seu campo político, coube agora a Alexis Tsipras igual dose de dislates também em nome de interesses políticos particulares. Para justificar os problemas em casa, o chefe do Governo grego usou do estratagema clássico da conspiração externa. Já não é só a Alemanha, a Comissão, o Eurogrupo, agora, segundo Tsipras, também Portugal e Espanha encabeçam uma espécie de conspiração contra Atenas cujo objectivo é derrubar o Executivo do Syriza. É o eixo do mal, versão ibérica, para distrair as atenções de quem, em Atenas, já contesta os acordos feitos com as autoridades europeias. Pelo meio houve queixas a Bruxelas por parte de dos governos de Madrid e Lisboa tudo a contribuir para elevar o ridículo da situação a níveis absolutamente desproporcionados.

As primeiras provocações partiram dos governos ibéricos. Dentro e fora de portas não perdiam ocasião para isolar os gregos, rejeitando qualquer compromisso que pudesse comprometer a versão de que não há alternativa ao modelo de austeridade desenhado pela troika, mesmo se é a própria Europa a mostrar que as regras estão a mudar.

A repetição ad nauseaum da frase “Portugal não é a Grécia” e a deselegância do primeiro-ministro português ao qualificar de “conto para crianças” o programa que o povo grego sufragou nas urnas são, para além de tudo o mais, reveladoras da indisfarçável fragilidade da situação caseira. Por muito que Portugal esteja melhor do que a Grécia – e está, nada é tão mesquinho e até vil do que servir-se das dificuldades de quem é mais fraco para se promover junto dos mais fortes. O método costuma ter efeito boomerang e jamais serviu para ganhar o respeito de quem se quer impressionar. O sr. Schäuble até pode ter palavras de simpatia para com os seus amigos do Governo português, mas isso não impede a Comissão Europeia de continuar a exibir a nossa miséria secular, como ainda fez esta semana ao incluir Portugal no clube de países sob vigilância por “desequilíbrios macroeconómicos excessivos”, com considerações e avisos contraditórios entre si, a velha hipocrisia de sempre.

O Syriza, simpatize-se ou não com as suas causas, parecia uma lufada de ar fresco. Tinha a vantagem de não estar ligado à crise, novos protagonistas, uma informalidade surpreendente. Nas duras negociações com Bruxelas foi ganhando simpatia de milhões de europeus. Em Portugal, uma sondagem deu larga vantagem aos que se diziam do lado dos gregos e esse facto foi decisivo para o governo suavizar o seu discurso sobre a Grécia. Mas não basta tirar a gravata e vestir casaco de couro para ser diferente, se à primeira contrariedade, se deita mão ao estafado método de sempre. Tsipras deu um tiro no pé e uma inesperada ajuda aos seus “adversários”. Quanto aos três governos envolvidos, todos fizeram uma triste figura.

Grécia apela ao diálogo após queixas a Juncker por Portugal e Espanha
LEONETE BOTELHO e RITA SIZA 01/03/2015 - PÚBLICO

Depois de um dia de contactos diplomáticos no eixo Portugal-Espanha-Bruxelas e palavras duras do primeiro-ministro espanhol, o Governo grego veio desculpar-se e falar em "más interpretações" do discurso de Tsipras.

Foi um domingo em cheio. Ao longo de todo o dia, houve contactos entre as delegações de Portugal e de Espanha e o gabinete do presidente da Comissão Europeia Jean-Claude Juncker. Ninguém escreveu cartas, mas houve mensagens, emails e muitos contactos telefónicos. E palavras duras de Mariano Rajoy. Ao fim do dia, o Governo grego veio tentar minimizar a polémica: afinal, tudo não passou de “más interpretações” do discurso do primeiro-ministro Tsipras na véspera, em Atenas.

“O novo Governo grego não categoriza os países e os povos como amigos ou inimigos”, afirmou uma fonte do executivo helénico à agência Reuters, ao fim da tarde. “Qualquer má interpretação do discurso do primeiro-ministro grego não ajuda o diálogo”.

Palavras repetidas à agência espanhola Efe, mas com uma nova expressão: "O executivo grego não está à procura de inimigos externos". Era a resposta directa ao presidente do Governo espanhol que, num acto de pré-campanha do PP em Sevilha, tinha sido duro com Tsipras. "Ir à procura de um inimigo externo é um truque que já vimos muitas vezes ao longo da história, mas que não nos resolve os problemas, apenas os agrava", afirmou Mariano Rajoy. "A única forma de resolver os problemas é ser sério, dizer a verdade, não prometer o que não depende de ti e não podes cumprir, e governar”.

"O novo Governo grego não classifica os países e os cidadãos da Europa como amigáveis ou hostis. Por isso, não procura inimigos externos, mas sim soluções para toda a Europa através da cooperação e o diálogo entre os povos e os governos", acrescentaram fontes gregas à Efe.

Era a água na fervura que fazia falta e que pode ter sido o resultado da intervenção da Comissão Europeia, que durante o dia se recusou a fazer comentários à polémica, sublinhando apenas o seu papel de “mediador”. "Para a Comissão Europeia", disseram fontes comunitárias citadas pela Efe, "é difícil comentar os comentários dos outros, especialmente porque a Comissão quer agir como um mediador e facilitador de acordos". "Não somos surdos nem cegos e ouvimos o mundo todo. Sabemos que há vozes construtivas e vozes menos construtivas. Mas não vamos comentar", ressalvaram as mesmas fontes.

Ao PÚBLICO, a porta-voz do presidente da Comissão Europeia, Mina Andreeva, confirmou que houve “vários contactos entre as delegações de Portugal e Espanha e o gabinete do presidente Jean-Claude Juncker”, que nas suas palavras “tem conhecimento das reclamações” dos dois Governos ibéricos relativamente às declarações do primeiro-ministro da Grécia perante o comité central do Syriza.

Quem tomou a inciativa?
A polémica rebentou pela manhã em Espanha, quando a agência Efe divulgou que fontes do Governo espanhol anunciaram ter enviado um protesto conjunto de Espanha e Portugal aos presidentes da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, e do Conselho Europeu, Donald Tusk, depois de Tsipras ter dito perante o comité central do partido Syriza que as "forças conservadoras europeias minaram" cada passo para um acordo com a Grécia, para evitar que o exemplo grego criasse escola em Espanha e Portugal.

À Lusa, fonte do Governo espanhol confirmou que foi enviado um protesto conjunto de Portugal e Espanha e acrescentou que a iniciativa partiu de Lisboa. "Espanha aderiu à iniciativa portuguesa", disse a mesma fonte de Madrid.

Em Portugal, aquilo que terá sido uma fuga de informação indesejada foi recebida com incómodo. Do gabinete do primeiro-ministro veio o desmentido da existência de qualquer carta ou que Pedro Passos Coelho tivesse falado com Jean-Claude Juncker ou Donald Tusk. Mas foram confirmados contactos com “instituições europeias através dos canais diplomáticos” para sublinhar a “perplexidade perante acusações infundadas”.

O PÚBLICO sabe que as mensagens de desagrado, tanto pelo telefone como por via electrónica, foram transmitidas pelos respectivos representantes permanentes em Bruxelas. A Representação Portuguesa (Reper), dirigida pelo embaixador Fezas Vital, recusou-se no entanto a confirmar ter sido o canal diplomático do Governo português.  “Não temos nada a acrescentar à posição que o gabinete do senhor primeiro-ministro transmitiu hoje”, respondeu ao PÚBLICO o porta-voz da Reper.

O que o gabinete de Passos Coelho não desmentiu é que tenha tido a iniciativa de fazer chegar o assunto à Comissão Europeia. Mas o incómodo nos dois países já vinha da véspera.

Portugal respondeu logo no sábado a Tsipras, através do porta-voz do PSD, Marco António Costa, que afirmou que a "conturbação e dificuldades internas do Syriza não justificam a invenção de histórias nem de desculpas para envolver terceiros". "Está na hora de os responsáveis assumirem as suas próprias responsabilidades e não continuarem a sacudir a água do capote e enjeitar as responsabilidades que são próprias das suas decisões", frisou o vice-presidente do PSD.

Neste domingo, apenas se ouviu da maioria lusa mais uma voz a criticar Alexis Tsipras. Nuno Melo, eurodeputado e dirigente do CDS, escreveu no Facebook um post em que acusa o primeiro-ministro grego de “entrar no domínio da alucinação”. “ Ficcionando adversários externos, Tsipras pode tentar resolver a contestação que já tem na rua e sente no interior do Syryza. Não resolve é os problemas da Grécia”

Governo grego diz que não procura "inimigos externos" em resposta a Rajoy

01 Março 2015, 20:28 por Lusa / Jornal de Negócios

O Executivo grego afirmou este domingo que não está à procura de "inimigos externos", respondendo desta forma ao presidente do Governo espanhol, Mariano Rajoy, que contestou as críticas a Espanha e Portugal feitas pelo primeiro-ministro helénico.
"O novo Governo grego não classifica os países e os cidadãos da Europa como amigáveis ou hostis. Por isso, não procura inimigos externos, mas sim soluções para toda a Europa através da cooperação e o diálogo entre os povos e os governos. Portanto, qualquer má interpretação não ajuda ao diálogo", disseram fontes do Executivo helénico à agência de notícias espanhola EFE.

Esta foi a via encontrada por Atenas para responder às declarações de Rajoy que, hoje, num comício de pré-campanha do Partido Popular em Sevilha, reagiu a uma crítica prévia de Alexis Tsipras, primeiro-ministro grego, que acusou Espanha e Portugal de tentarem levar a Grécia ao "abismo" para "evitar um risco político interno".

Rajoy realçou: "Procurar um inimigo fora é um truque que temos visto muitas vezes ao longo da história, mas não resolve os problemas, só os agrava, e a única forma de resolver os problemas é ser sério, dizer a verdade, e não prometer o que sabes que não podes cumprir porque não depende de ti".

As referidas fontes governamentais gregas salientaram que Tsipras, no seu discurso, apenas quis explicar com detalhe ao povo grego a "negociação dura de um Eurogrupo decisivo que acabou em acordo".

Já Rajoy tinha dito que o Governo espanhol não é responsável pela "frustração que gerou a esquerda radical grega, que prometeu aos gregos aquilo que sabiam que não podiam cumprir, como ficou demonstrado".

Em Portugal também houve uma reacção às declarações de Tsipras, com uma fonte do gabinete do primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, a indicar hoje à Lusa que o Governo português manifestou a sua perplexidade perante "acusações infundadas" do primeiro-ministro grego através de canais diplomáticos, mas não escreveu qualquer carta de protesto.

Segundo a mesma fonte, Pedro Passos Coelho, não falou nem com o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, nem com o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, nem lhes endereçou qualquer missiva de protesto sobre as acusações de Alexis Tsipras de que Portugal e Espanha teriam tentado bloquear um acordo no Eurogrupo.

O gabinete do primeiro-ministro confirmou, contudo, a existência de "contactos através de canais diplomáticos" para sublinhar a perplexidade do Governo português perante acusações de Alexis Tsipras que classifica de infundadas.

No sábado, numa reunião do comité central do seu partido, Syriza, Tsipras afirmou que, no Eurogrupo, a Grécia se deparou "com um eixo de poderes, liderado pelos governos de Espanha e de Portugal que, por motivos políticos óbvios, tentou levar a Grécia para o abismo durante todas as negociações".


"O seu plano era e é desgastar-nos, derrubar o nosso Governo e levá-lo a uma rendição incondicional antes que o nosso trabalho comece a dar frutos e antes que o exemplo da Grécia afecte outros países, principalmente antes das eleições em Espanha", previstas para o final deste ano, acrescentou, citado pela agência espanhola Europa Press.

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