Um drama com episódios repetidos
Por Luís Rosa
publicado em 7 Jan
2015 in
(jornal) i online
Temos mais um
psicodrama grego em curso. O caro leitor já terá perdido a conta ao número de
vezes em que se discutiu a possível saída da Grécia do euro e da União
Europeia. Seja por ameaças da Alemanha ou dos gregos, esta é uma telenovela com
muitos episódios repetidos, mas ainda sem final à vista, desde o início da
crise da dívida soberana, em 2008/2009.
O drama actual
prende-se com a possibilidade de os radicais do Syriza, uma espécie de irmãos
do Bloco de Esquerda, ganharem as eleições antecipadas que foram marcadas para
o dia 25 de Janeiro. É uma realidade que Alexis Tsipras, o líder do Syriza,
ameaçou por diversas vezes rasgar ou não cumprir o segundo memorando de
entendimento que a Grécia assinou com a troika, aumentando os salários dos
funcionários públicos, recusando-se a cortar na despesa pública e anulando a
maioria das reformas laborais que foram realizadas por acordo com a troika. Tsipras
também ameaçou anular parte importante da dívida pública grega - detida em mais
de 80 por cento por instituições internacionais.
Perante a
possibilidade de estas propostas radicais terem o apoio eleitoral dos gregos no
final do mês, Angela Merkel mandou dizer, através de uma revista alemã, que o
seu governo pode deixar de ajudar a Grécia, recusando colaborar com novos
apoios financeiros. É importante referir que a Grécia já teve dois resgates,
sendo certo que os empréstimos já alcançaram cerca de 240 mil milhões de euros.
Pelo meio, um porta-voz oficial da nova Comissão Europeia, liderada por Jean-
-Claude Juncker, avisou que a manutenção de qualquer Estado-membro é
"irrevogável", aumentando o fogo da discussão pública em vez de
apagá-lo.
Começando por
este último ponto. É óbvio que a Comissão Europeia não pode impedir a Grécia de
sair do euro e da União Europeia. Basta uma eventual vitória do "sim"
à saída num referendo convocado pelo governo do Syriza para uma negociação para
a saída se tornar inevitável. Seria impossível repetir um eventual referendo
até que o resultado agradasse a Berlim e Bruxelas, como aconteceu na Dinamarca
(por duas vezes), Irlanda (por duas vezes) e até em França.
Resta saber se
esse perigo de saída é real. Num clima eleitoral, interessa ao Syriza acicatar
os ânimos ressentidos de muitos gregos com as medidas da troika e com a
constante atitude de mestre-escola de Angela Merkel em relação ao aluno
malcomportado chamado Grécia. Alexis Tsipras ganhará votos se mantiver Berlim e
Bruxelas sob pressão. Interessa também a Merkel manter um discurso duro para
contentamento dos seus eleitores, que não querem emprestar mais dinheiro aos
gregos. Veremos o que acontece, mas esta poderá apenas ser mais uma negociação
dura que, por entre muitas ameaças, levará a um novo acordo. Outra questão é o
referendo sobre a permanência da Grã-Bretanha na União Europeia: uma ameaça
mais complexa e real do que a Grécia.
Bruxelas garante que “não toma
posição” nas eleições gregas
JOÃO MANUEL ROCHA
e SÉRGIO ANÍBAL 06/01/2015 - PÚBLICO
No final do ano passado, o comissário Pierre Moscovici pediu aos eleitores
gregos “um largo apoio” às reformas. Agora afirma que essa não foi uma tomada
de posição em relação às eleições.
O comissário
europeu dos Assuntos Económicos, Pierre Moscovici, afirmou, esta terça-feira,
que a Comissão “não toma posição” na campanha para as eleições legislativas
gregas do próximo dia 25, em que o favoritismo vai para o partido da esquerda
radical Syriza.
A declaração foi
feita um dia depois de uma porta-voz da Comissão ter dito que a adesão da
Grécia ao euro é “irrevogável”. E parece ser mais uma tentativa para acabar com
as acusações de que a Comissão está a pressionar os eleitores gregos.
No dia em que
foram anunciadas as eleições, 29 de Dezembro, Moscovici disse que era
“essencial” um “largo apoio” dos eleitores e dos políticos gregos a reformas
“favoráveis ao crescimento”.
A declaração foi
entendida como um apoio à continuidade das políticas que têm sido seguidas pelo
Governo de Atenas, liderado pelo conservador Antonis Samaris. Até porque se
somou à afirmação do presidente Jean-Claude-Juncker de que “não gostaria que
forças extremistas chegassem ao poder” na Grécia e preferia “rever rostos
familiares em Janeiro”.
Mas a posição então
assumida “não foi uma tomada de posição no debate político grego”, garantiu
agora, num encontro com jornalistas, em Bruxelas. Não foi, insistiu, citado
pela AFP, “um apelo ao voto neste ou
naquele” e os “eleitores vão escolher livremente os seus dirigentes”.
Se o líder do
Syriza, Alexis Tsipras, se tornar primeiro-ministro, “discutiremos com ele com
base nas nossas propostas”, disse ainda o comissário socialista francês.
O ex-presidente
da Comissão Europeia, Durão Barroso, também se pronunciou sobre a Grécia e
disse concordar com a afirmação de que “a adesão ao euro é irrevogável”. Mas
acrescentou que um eventual incumprimento dos compromissos assumidos pelo
Governo de Atenas com a União Europeia pode levar a que alguns países da zona
euro “desistam da Grécia”.
“Aceitamos todos
os resultados, mas os países devem assumir as suas responsabilidades e
obrigações internacionais”, disse também, em Lisboa, à margem do Seminário
Diplomático organizado anualmente pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Nos mercados, o
ambiente geral continua a ser de preocupação, mas mais por causa das
perspectivas de crescimento económicas bastante fracas para a zona euro do que
especificamente por causa das eleições gregas.
De qualquer modo,
depois das fortes quedas registadas na bolsa na segunda-feira, assistiu-se a
uma estabilização dos principais índices. Em Frankfurt, a descida foi de 0,04%
e em Paris de 0,68%.
A bolsa de Atenas
continuou a ser a que mais perde, com mais uma redução de 5,63% no seu índice,
enquanto em Lisboa o PSI 20 caiu 1,33%.
As taxas de juro
da dívida pública registaram poucas alterações nos países da periferia da zona
euro, ocorrendo descidas nos países do centro, o que é explicado pela
antecipação pelos mercados das compras de obrigações europeias por parte do
Banco Central Europeu. Pelo mesmo motivo, o euro continuou a cair face ao
dólar, embora de forma mais moderada do que na segunda-feira. A divisa europeia
continua abaixo dos 1,20 dólares e perto dos mínimos dos últimos nove anos.
Os dados
económicos relativos à actividade económica na zona euro nos últimos meses de
2014 publicados esta terça-feira vieram ainda confirmar os sinais de
abrandamento já existentes. É este facto que está a criar alguma ansiedade nos
mercados bolsistas, ao mesmo tempo que contribui para a descida do preço do
petróleo, que se aproxima rapidamente da barreira dos 50 dólares por barril.
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