Mensalão: A rede
luso-angolana-brasileira
Miguel Horta e Costa, antigo presidente da Portugal Telecom, hoje
administrador do BESI e presidente da Fundação Luso-Brasileira, foi constituído
arguido num processo que investiga corrupção no comércio internacional.
11 de Janeiro,
2015 - Jorge Costa / http://www.esquerda.net/artigo/mensalao-rede-luso-angolana-brasileira/35421
Horta e Costa
esteve na sexta-feira no Departamento
Central de Investigação e Ação Penal para responder às perguntas do Ministério
Público brasileiro, que chegaram a Lisboa em carta rogatória. Esta investigação
começou em 2012, depois do publicitário brasileiro Marcos Valério, condenado
como o executor do "mensalão", ter afirmado num depoimento que a
Portugal Telecom financiou o Partido dos Trabalhadores (PT) com 2,6 milhões de
euros, durante o Governo de Lula da Silva. Segundo Valério, esse dinheiro foi
negociado diretamente entre o ex-presidente do Brasil e o então presidente da
Portugal Telecom, Miguel Horta e Costa, no Palácio do Planalto, em Brasília.
Nos depoimentos
de Marcos Valério, surgiram os nomes de Ricardo Salgado, António Mexia e Miguel
Horta e Costa, com os quais Valério alega ter-se reunido entre 2002 e 2006 para
organizar financiamentos ao Partido dos Trabalhadores, de Lula da Silva. Todas
aquelas figuras foram testemunhas de defesa de José Dirceu e outros
“mensaleiros”. Horta e Costa é agora constituído arguido.
Os órgãos sociais
da Fundação Luso-Brasileira, a que Horta e Costa preside, são o retrato
das proximidades que a Fundação quer
cultivar. Na vice-presidência da fundação está outro ex-presidente da PT
(1996-2002), Murteira Nabo. Foi sob estas presidências que a PT se tornou uma
empresa luso-brasileira, acabando por se fundir com a gigante Oi e por cair
depois sob domínio de capital brasileiro. Como assinala Horta e Costa no site
da Fundação, a FLB “promove o relacionamento institucional, político e
económico entre os dois povos”. O peso de representantes de interesses
angolanos é também grande na FLB, onde têm cargos, entre outros, António
Monteiro, ex-MNE do PSD indicado pela Sonangol para chairman do BCP, e Miguel Relvas,
vindo da Finertec angolana, um dos braços empresariais da Fundação Eduardo dos
Santos.
Dirceu próximo de
Relvas e de interesses angolanos
Segundo o jornal
Público, José Dirceu foi em 2008 operacional na venda da operadora da PT no
Brasil, a Vivo. Para apoiar o negócio, a PT contratou o escritório de advogados
de Fernando Lima. Já em finais de 2011, encontramos de novo Lima a representar
os interesses brasileiros, então na privatização da TAP. Foi Lima quem
providenciou o primeiro encontro de Gérman Efromovich, candidato à TAP apoiado
por Brasília, com o ministro Miguel Relvas, então titular do processo no
governo. Semanas depois, o próprio irmão de José Dirceu veio a Lisboa
representar Efromovich numa reunião com o então presidente do BES, Ricardo Salgado
(P, 2.8.2012). Até ser preso, o escritório de advogados de José Dirceu
representava no Brasil o escritório de Fernando Lima, o LSF & Associados.
Lima foi
presidente da construtora Engil e também grão-mestre do Grande Oriente
Lusitano. Quando o BPN foi nacionalizado, a parte rentável do grupo SLN,
incluindo os negócios do grupo em Angola, foi mantida nas mãos dos seus donos
de sempre - o grupo cavaquista de Oliveira e Costa, Joaquim Coimbra e outros. O
grupo mudou de nome para Galilei, e contratou o advogado Fernando Lima para
presidir à sua administração.
O mensalão chega
a Angola
Angola foi o
segundo país mais profundamente atingido pelo escândalo do “mensalão”, o
esquema de corrupção e financiamento ilegal de partidos e governantes. Uma
comissão parlamentar brasileira investigou as movimentações financeiras do
empresário Marcos Valério, o operacional do ministro José Dirceu neste
escândalo. Muitas transferências realizavam-se através do Trade Link Bank,
offshore nas ilhas Caimão detido pelo Banco Rural brasileiro.
As investigações
da justiça brasileira ao TradeLink/Banco Rural acabaram por detetar também o
trânsito de vultuosas transferências precisamente para Angola, para contas
bancárias do ex-ministro angolano das Finanças, José Pedro Morais, e do
ex-governador do banco central angolano (BNA), Amadeu Maurício. Segundo a
imprensa brasileira, foram 21 remessas entre 2003 e 2005, num total de 2,7
milhões de dólares. Os dois políticos acabaram afastados dos seus cargos por
José Eduardo dos Santos.
O caso angolano
não parece ter relação direta com o “mensalão”, mas os empresários brasileiros
que realizavam aqueles pagamentos serviam-se do mesmo canal offshore por onde
Marcos Valério fazia circular os seus subornos.
A rede
luso-brasileira da Fundação Eduardo dos Santos
Um dos condenados
no “mensalão” foi o presidente do Banco Rural, José Roberto Salgado. Este
banqueiro brasileiro, hoje na prisão, presidiu também à filial de Lisboa, o
Banco Rural/Europa (BR/E). Até 2012, o BR/E era um offshore na Madeira, mas em
2012 abriu portas em pleno Saldanha, em Lisboa.
O único português
na administração do Banco Rural/Europa é um veterano corretor de Bolsa e
banqueiro, Luís Rodrigues. Além de administrador do BR/E, Luís Rodrigues está
no conselho de administração do cabo-verdiano Banco Fiduciário Internacional
(BFI). Segundo Paulo Silva, inspetor tributário arrolado como testemunha pelo
Ministério Público no processo BPN/Insular, o BFI era um dos canais da elite
angolana em Cabo Verde para tirar dinheiro do seu país. O BFI é uma das
entidades acionistas da Finertec, o grupo de capitais angolanos que teve Miguel
Relvas foi administrador até 2011 e de onde veio também Paulo Pereira Coelho,
contratado pelo governo português em Outubro de 2013 como consultor na área da
diplomacia económica junto dos países lusófonos, sem remuneração. Estávamos em
plena crise diplomática luso-angolana, e a contratação surge como um esforço de
apaziguamento.
A rede
BFI-Finertec é um dos braços financeiros do palácio presidencial angolano. Nos
postos-chave desta rede vamos encontrar o pessoal político-empresarial em torno
da Fundação Eduardo dos Santos, associado a gestores de topo portugueses e
responsáveis com boas relações políticas em Lisboa.
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