Marine Le Pen
quer fechar as fronteiras da França e impedir que "entrem terroristas no
País"
AFP/Getty Images
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Frente Nacional. Sede escondida,
discurso afiado e um cofre aberto
SÓNIA SIMÕES / 13/1/2015,
OBSERVADOR
A filial da Frente Nacional em Paris está escondida, por "razões de
segurança". As funcionárias dizem que os atentados fizeram disparar os
cheques de adesão ao partido, que já fala de pena de morte.
Não existe
qualquer placa de identificação na filial da Frente Nacional, em Paris. A porta
fica ao lado de umas janelas baças pelo tempo, há uma campainha e nada mais. Estamos
na Rua Jeanne D’Arc e não há um único sinal de que ali fica o partido francês
mais à direita, aquele que defendeu o regresso da pena de morte e a
reintrodução de fronteiras na Europa.
A mulher que abre
a porta, ao fim de alguma insistência, justifica: “Entre rápido, por razões de
segurança não gostamos de nos expor”. Desde o ataque ao semanário satírico
Charlie Hebdo, há uma semana, que o correio transborda e o telefone não para de
tocar, garantem.
“Há dois tipos de
telefonemas: os das pessoas que se querem mostrar solidárias com o partido e os
que querem informações ou formulários para aderirem”, explica ao Observador
Bernadette de la Bourdonnaye, responsável pelas relações com a imprensa.
“Estamos cheias
de trabalho e sem mãos a medir. Desde a semana passada que não param de chegar
cheques com adesões e o telefone não para”, conta.
Ainda não há
números de adesões após os ataques em Paris, mas, em setembro de 2014, o
partido contava já com mais de 83 mil adesões, um recorde desde 2011 – o
partido recebeu uma média de 20 mil inscritos por ano.
O número de
telefonemas levou a que a Frente Nacional organizasse um encontro em Nanterre,
onde funciona a sede o partido, para que as pessoas pudessem obter informações
e pudessem inscrever-se.
Bernadette de la
Bourdonnaye, responsável pelas relações com a imprensa da FN.
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Bernadette de la
Bourdonnaye, que abre envelopes enquanto fala ao Observador, tem nas mãos
cheques com vários valores. A maior parte é de 250 euros. “A Marine Le Pen
sempre disse que o dinheiro não seria um problema para quem quisesse aderir ao
partido. Assim, um estudante paga 30 euros anuais. Depois, há vários valores,
consoante o que cada um pode dar”, refere. Há vários tipos de adesão possível:
além de estudante, há preços para adesões de “casais” ou para adesões “de
suporte”. A do valor mais elevado chama-se “adesão prestígio”.
Quem está na sede
diz que, entre quarta-feira e sábado, grande parte dos telefonemas que chegaram
foram por solidariedade. Porquê? Na quinta-feira, o Presidente francês,
François Hollande, reuniu com vários partidos para organizar a marcha da
República (que se realizou no domingo, mas chegou a estar prevista para
sábado), e não convidou a Frente Nacional. A líder do partido, Marine Le Pen,
que tinha já agendado um encontro com o Presidente na manhã de sexta-feira,
decidiu não ir à marcha. Trocou-a por uma outra, precisamente em Nanterre, onde
o partido joga em casa. “Foi uma querela política. Mas Hollande esteve mal,
porque numa manifestação pela união e pela liberdade de expressão, não ter
vontade que a Frente Nacional esteja presente…”, opina Bernardette, antes de
fazer questão de mostrar um “cartaz antigo” onde Marine Le Pen apela à “união
do povo francês” – o mote da marcha da República.
As duas mulheres
que trabalham ao cimo de umas escadas de madeira, que ligam uma biblioteca aos
escritórios, passaram a manhã na Prefeitura de Paris, numa homenagem aos
polícias mortos. Já estiveram em vários locais a prestar homenagem às vítimas
dos ataques registados na última semana. “Não fomos à marcha, mas temos feito
homenagens por todo o País”, garante Bernadette.
No discurso da
Frente Nacional, tudo é medido. A responsável ressalva, por exemplo, que os
“ataques não são bons para ninguém”. Mas é óbvio para todos que, desde
quarta-feira, o partido não larga o assunto, procurando reforçar o discurso
mais radical de França – um dos mais duros da Europa contra a imigração. “O que
dá pena é que há muito que a Marine Le Pen diz que o extremismo islâmico é
perigoso, que há pessoas a serem recrutadas nas prisões. Ela fez um diagnóstico
e não foi ouvida ou levada a sério”, diz.
“O que queríamos
era fechar as fronteiras para impedir os terroristas e as armas de entrarem no
País. E controlar melhor quem sai e quem entra”, diz. “Isto não é simples?”,
interroga.
Mas é mais
complicado do que isso. Marine Le Pen pediu já a suspensão dos acordos de
Schengen, que permitem a livre circulação entre países europeus, e que deve ser
impedido o regresso a França aos cidadãos com dupla nacionalidade que vão para
países terceiros lutar em células terroristas. Disse, também, que “os islamitas
abriram guerra contra França”, justificando que seja dada — palavras de Le Pen
— “aos franceses a oportunidade de se pronunciarem sobre o regresso da pena de
morte” através de um referendo – e que a pena de morte devia fazer parte do
“arsenal penal” francês. Jean-Marie Le Pen, pai de Marine Le Pen e fundador da
Frente Nacional, até utilizou, por exemplo, um conhecido slogan britânico para
apelar ao voto na sua filha no Twitter: “Keep calm and vote Le Pen”.
“Discurso perigoso e enganador”
Paulo Sande,
antigo diretor do Gabinete em Portugal do Parlamento Europeu, olha para o
discurso adotado pela Frente Nacional, e não só não vê simplicidade como
considera mesmo que a radicalização defendida, “na linha do que sempre foi
defendido pelo partido”, é altamente contraproducente. “É um discurso perigoso,
e enganador. Pretende levar as pessoas a pensarem que acabar com Schengen é
acabar com os atentados. Isso não é verdade. E é um discurso de demagogia, que
usa os argumentos tradicionais de um partido de extrema-direita, as pessoas não
vão ficar mais seguras.”
Paulo Sande
sublinha que a argumentação de Marine Le Pen se baseia em pressupostos errados:
“Dizer que as fronteiras nacionais protegem mais que um espaço alargado, com
reforço nas fronteiras, partilha de informação, é um erro. O que acontece é
justamente o oposto, é precisamente com fronteiras alargadas que se consegue
lutar contra ameaças destas”. E o antigo diretor do Gabinete em Portugal do
Parlamento Europeu aponta um perigo: “É evidente que há uma radicalização, as
sociedades europeias estão muito radicalizadas, a crise também trouxe isso, os
imigrantes são muitas vezes culpabilizados. Se nós apontarmos os islâmicos como
inimigos, estamos a falar de muitos milhões na Europa. Só em França são quase
quatro milhões. Pessoas a quem a República francesa reconheceu a nacionalidade.
Isto é um problema de fundo. Estaremos a dar razões para os islamitas
recrutarem, ao radicalizarmos o discurso.”
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