EDITORIAL
Um governo em circuito fechado
Ninguém acredita que, depois do regabofe da TAP, o
desgaste do Governo se resolva com escolhas que transpiram comodismo,
resignação, falta de opções ou enfado.
Manuel Carvalho
2 de Janeiro de
2023, 19:02
https://www.publico.pt/2023/01/02/politica/editorial/governo-circuito-fechado-2033508
Quando se
esperava um golpe de asa para superar a indecorosa crise da indemnização a
Alexandra Reis, o primeiro-ministro foi igual a si próprio e escolheu a
banalidade do óbvio. Entra João Galamba para o lugar de Pedro Nuno Santos,
Marina Gonçalves sobe a ministra e muda-se o suficiente para que tudo permaneça
na mesma. A sensação de que o Governo navega à vista, que não arrisca, que não
consegue recrutar para lá do aparelho do PS, que prefere o conforto prudente
dos pequenos equilíbrios à incerteza do rasgo e da visão, confirmou-se:
habituemo-nos, pois, ao conformismo.
Na grelha de
avaliação que o Presidente da República criou na mensagem de fim de ano para
determinar o que “enfraquece ou esvazia” a estabilidade do Governo, as escolhas
de Costa passam com suficiente menos. Marina Gonçalves dá resposta a “erros de
orgânica” – a habitação merece um ministério; as nomeações são neutras quanto à
“descoordenação”; mantêm activas as tropas de Pedro Nuno Santos para evitar a
“fragmentação interna”; mas não respondem aos perigos da “inacção” ou, talvez,
da “descolagem da realidade”.
Quando o Governo
mais precisava de abrir as janelas e deixar entrar ar, quando lhe interessava
fazer prova da sua força junto da sociedade civil, António Costa andou ao
contrário. Rapou o tacho e, como seria de esperar, encontrou socialistas. Em
vez de académicos ou gestores com provas dadas nas obras públicas ou nos
transportes, tratou de dar a mão a dois apoiantes de Pedro Nuno Santos para
manter os equilíbrios internos. A paz da tribo antes da eficiência, o cartão do
PS antes do currículo.
Não sabemos se o
fez por opção ou por falta de alternativas. A subida de Marina Gonçalves, vá
lá, percebe-se, mas o risco da escolha de Galamba é enorme. Pegar num jovem
secretário de Estado da Energia, sem mundo nem vida na gestão, para o levar
para o ninho de vespas da TAP, ou para gerir milhares de milhões de euros na
ferrovia ou no novo aeroporto é jogar na roleta. Não se trata de depreciar o
valor de Galamba, que na Energia desfez muitas dúvidas. Trata-se de ler a sua
biografia profissional. E de constatar que lhe falta saber técnico ou estatuto
para as Obras Públicas.
O pior para
António Costa, para o Governo e para o país é que esta é a percepção que paira
no ar. Ninguém acredita que, depois do regabofe da TAP, o desgaste do Governo
se resolva com escolhas que transpiram comodismo, resignação, falta de opção ou
enfado. O pior do “habituem-se” de António Costa é mesmo essa terrível sensação
de que a maioria vive numa bolha e respira apatia. Ele quer mesmo chegar
ao fim da legislatura?

Sem comentários:
Enviar um comentário