GOVERNO
Na despedida da “geringonça”, Costa quer continuar a ser
o protagonista do futuro
Proposta do OE2022 deverá ser chumbada esta quarta-feira,
com os partidos à esquerda a manterem a intenção de votarem contra. No debate
desta terça-feira, a direita já vê a morte da maioria parlamentar de apoio ao Governo.
Sofia Rodrigues e
Liliana Borges
27 de Outubro de
2021, 0:42
António Costa
garantiu que se houver eleições antecipadas, irá liderar o PS
Com a ameaça do
chumbo do Orçamento do Estado para 2022 a pairar no ar, o ministro Pedro Nuno
Santos foi o primeiro membro do Governo a entrar no hemiciclo e a dirigir-se
aos líderes do PCP e do Bloco, já sentados nas bancadas, para os
cumprimentar calorosamente. A imagem pode ser a da despedida da “geringonça” ou
do princípio de um novo ciclo, minutos antes de o debate revelar já um ensaio
de campanha eleitoral. António Costa garantiu que não se demite e até já desfez
o tabu: será o líder do PS a ir às legislativas antecipadas se se confirmarem.
Enquanto no
debate em plenário o primeiro-ministro e os parceiros do PCP e BE ainda
esgrimiam argumentos sobre as negociações orçamentais, nos bastidores parecia
desenhar-se ainda um cenário alternativo. O presidente do governo regional da
Madeira, Miguel Albuquerque, mostrava-se disponível para negociar com António
Costa, abrindo a porta a que os três deputados do PSD-Madeira pudessem ter um
sentido de voto diferente do da bancada do PSD, que é contra.
Só que o líder
social-democrata, Rui Rio, veio colocar água na fervura, assegurando ter a
garantia de que o PSD-Madeira será solidário com o partido nacional e que a
Madeira “não está à venda”. Já sobre as diligências do Presidente da República
para tentar a viabilização do OE, o líder do PSD compreende esse esforço se o
mesmo for feito junto dos partidos, mas seria estranho se fosse realizado
“avulsamente”.
Ao mesmo tempo, a
bancada do PAN quase assumia as dores do Governo e lamentava o chumbo do
Orçamento, o que foi lido como um sinal de que o sentido de voto podia mudar da
abstenção para o voto favorável, o que poderia afastar a garantia de chumbo.
Neste cenário em que PAN e os deputados do PSD-Madeira votavam a favor, só
era necessário mais um voto favorável de uma deputada não inscrita para salvar
o OE. Mas até ao fecho desta edição, Cristina Rodrigues mantinha a intenção de
se abster.
Com ou sem OE
para 2022 aprovado, a direita já vê o fim da actual maioria parlamentar que
suportou o Governo nos últimos seis anos. A “geringonça”, apontou Rui Rio, “não
tem pernas para andar, está numa cadeira de rodas à espera que alguém a empurre
e ninguém a quer empurrar”.
O líder
social-democrata questionou Costa: “Como é que quer governar neste cenário?
Está tão agarrado ao lugar que não consegue ver o que todo o Portugal está a
ver?”. António Costa reiterou que não se demite e não quis dar como certa –
“veremos” - a decisão do Presidente da República de dissolver o Parlamento.
Mais à direita, Telmo Correia, líder da bancada do CDS, concluiu: “A
‘geringonça’ matou a ‘geringonça'”. O líder do Chega também declarou o óbito à
solução de Governo gerada em 2015: “Esta maioria parlamentar conheceu hoje o
seu dia fúnebre”.
A mesma
constatação levou o deputado da Iniciativa Liberal, João Cotrim Figueiredo, a
questionar o primeiro-ministro sobre o seu estado de alma. “Se a maioria que se
formou em Novembro de 2015 se considerar esgotada, e se já não tem mais caminho
para andar, é uma enorme frustração pessoal”, admitiu o também líder
socialista.
No arranque do
debate – e ainda antes de ouvir as interpelações das bancadas – o
primeiro-ministro assegurou que o Governo não faz “chantagens ou ultimatos”,
nem tão pouco fecha “as portas ao diálogo” e disse que se a esquerda está
genuinamente preocupada em aprovar as suas propostas, então a solução é
viabilizar o orçamento, para que as negociações possam avançar para a próxima
fase. “A fase da especialidade é o momento adequado para a discussão em detalhe
das propostas e redacções”, desafiou António Costa, dirigindo-se às bancadas do
BE, PCP e PEV.
Esquerda
responsabiliza Governo
Pelo BE, a
deputada Mariana Mortágua lamentou os “ataques” do Governo e a “incapacidade de
assumir compromissos viáveis”, acrescentando que "cada frase dos
ministros ou deputados a condenarem a esquerda ribomba no país como a
demonstração de que o Governo prefere a acusação à solução”.
Já o deputado
comunista Duarte Alves – depois de o socialista Ascenso Simões ter apelado
à mudança de voto com um “Avante, camarada! Juntem a vossa à nossa voz” –
justificou que “não se pode esperar que seja o PCP a desistir de lutar”
pelas suas prioridades. E culpou "a opção feita pelo Governo” de
“seleccionar isoladamente algumas dessas soluções, na sua maior parte de forma
parcial”. A mensagem chegaria já depois de o primeiro-ministro ter afirmado que
“ninguém compreende” o voto contra do PCP num OE que traz medidas de
“gratuidade das creches, progresso fiscal e reforço na função pública”.
Antes ainda, em
resposta ao BE – que insistiu no fim do factor de sustentabilidade, nas
alterações à legislação laboral e reforço do SNS –, Costa ironizou que o
partido estava a ter dificuldades em justificar o seu voto contra e registou
que, na sua intervenção, a coordenadora bloquista, Catarina Martins, não
falara do Orçamento, mas de discussões extra-orçamentais, “que constam do
estatuto do SNS e de alterações laborais”. E lançou um repto e uma
acusação: “Se está contra as nossas propostas de legislação laboral, porque é
que não reserva o voto contra e quer votar contra o orçamento que não tem nada
a ver?”
O mesmo desafio
seria feito repetidamente em resposta ao PCP, desafiando a bancada a mudar o
seu voto para que o OE pudesse incorporar reivindicações comunistas. “Está
disponível para regulamentar na fase da especialidade? É que para isso temos de
chegar à fase da especialidade”, insistiu. E depois virou-se para o PAN, a quem
reconheceu e agradeceu “a contribuição” e apelos lançados para levar a
discussão à especialidade. Repetidamente, os deputados do PAN fizeram questão
de se afirmar como um parceiro responsável e disponível para estar “ao lado da
solução”.
Cá fora, depois
de um encontro com o presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, a
deputada Bebiana Cunha dava também sinais de que o partido poderia alterar o
seu sentido de voto, defendendo que “este Orçamento precisa de ir à
especialidade” para poder ser “melhorado”, ressalvando, no entanto, que,
sozinhos, os três deputados do PAN não conseguem dar ao PS uma maioria
parlamentar que permita evitar o chumbo do documento.
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tp.ocilbup@segrob.anailil
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