quarta-feira, 10 de julho de 2013

Nome indicado para suceder a Paulo Portas no MNE gera polémica.

"Nuno Brito é apresentado como o "arquitecto" da famosa Cimeira dos Açores. A sua ascensão no MNE continuou mesmo após a saída de Durão.
Além disso, é tido como um diplomata próximo dos interesses norte-americanos, nomeadamente, com algumas relações estreitas no interior do Partido Republicano. É de assinalar que as suas duas únicas colocações no exterior tenham sido, precisamente, em Nova Iorque e Washington."



Nome indicado para suceder a Paulo Portas no MNE gera polémica


Por Nuno Sá Lourenço
10/07/2013 in Público

Proposta de Nuno Brito fez soar alarmes. Embaixador contrariou a prática comum que evita a colocação de casais de diplomatas na mesma missão. E é criticado por ter sido o arquitecto da Cimeira dos Açores
Nuno Brito, apontado para o cargo de ministro dos Negócios Estrangeiros, está ser contestado por ter protagonizado a quebra de uma regra do Ministério que evita a colocação dos casais de diplomatas na mesma missão no exterior. Brito, embaixador em Washington, fez-se acompanhar para esse destino da mulher, Rosa Batoréu, que fontes contactadas pelo PÚBLICO descrevem como a "número dois" da embaixada. Mas há outro registo no percurso profissional de Nuno Brito que causa mal-estar numa parte importante do Ministério: o seu papel na organização da Cimeira dos Açores que juntou George W. Bush, Tony Blair e José Maria Aznar na Base das Lajes para a preparação da invasão do Iraque.
Desde há alguns dias que se instalou o debate sobre os méritos e currículo do embaixador em Washington para suceder a Paulo Portas. Alguns elementos ligados ao PSD e outros com relações nos Negócios Estrangeiros fizeram mesmo questão de lançar os seus sinais de alerta junto do gabinete do primeiro-ministro. Não é ainda certo que o primeiro-ministro venha a nomear Brito, mas o embaixador é dado como certo no Governo (que terá de ser aprovado pelo Presidente).
Um dos argumentos que está a ser usado para contestar a nomeação é o aparente conflito de interesses que a sua indigitação geraria. Isto porque a esposa do embaixador, Rosa Batoréu, é também diplomata, ficando assim Nuno Brito chefe da sua própria mulher. O problema que se levanta é a possibilidade do actual embaixador poder vir a ter um papel, enquanto ministro, na nomeação e promoção de Rosa Batoréu para um qualquer posto diplomático.
O Estatuto da Carreira Diplomática define isso mesmo. "As nomeações que envolvam a colocação de funcionários diplomáticos nos serviços externos ou a sua transferência para os serviços internos são da competência do ministro dos Negócios Estrangeiros, com base em proposta elaborada pelo conselho diplomático, excepto no que respeita aos chefes de missão ou directores-gerais ou equiparados", pode ler-se na lei.
Questionado ontem directamente pelo PÚBLICO, o embaixador Nuno Brito disse que "nada" tinha a dizer sobre a polémica. E a sua assessora remeteu para o porta-voz do MNE.
O caso afigura-se ainda mais espinhoso se se tiver em conta o passado. O casal tornou-se num exemplo sui generis no Palácio das Necessidades quando Rosa Batoréu foi nomeada no início do ano passado, por Paulo Portas, para a mesma embaixada. Oficialmente para desempenhar funções na Organização dos Estados Americanos. Mas, na prática, asseguraram ao PÚBLICO, exercendo a função de "número dois" na embaixada.
Uma nomeação que quebrou a praxis do MNE: a de evitar que marido e mulher sejam colocados no mesmo posto. O caso foi notícia em 2012, quando o Correio da Manhã denunciou esse aparente tratamento especial. Mas o Estatuto admite essa possibilidade a título excepcional quando estipula que "o conselho diplomático ponderará, na medida do possível e sem prejuízo da prevalência do interesse do serviço, aspectos da vida pessoal dos funcionários, designadamente a reunificação ou aproximação familiares".
E existem exemplos de casais de diplomatas que tiveram de viver separados por milhares de quilómetros. Como foi o caso da agora eurodeputada Ana Gomes. Esteve colocada como embaixadora em Jakarta, na Indonésia, quando o seu marido António Franco era chefe da casa civil de Jorge Sampaio.
Essa suspeita de tratamento diferenciado é suportada pelo peso político de Nuno Brito. É tido como protegido do actual Presidente da República, além de ter relações estreitas com o actual presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso. Foi aliás o assessor diplomático de Durão quando este era primeiro-ministro. Que vê com bons olhos a sua nomeação até para apoiar numa alegada candidatura do social-democrata a um cargo de topo na ONU.
Nuno Brito é apresentado como o "arquitecto" da famosa Cimeira dos Açores. A sua ascensão no MNE continuou mesmo após a saída de Durão. Durante os mandatos de José Sócrates foi nomeado para director dos Assuntos Europeus e depois para director-geral de Política Externa. O topo da carreira em termos políticos, onde acompanhou os dossiers quentes relacionados com os voos da CIA, invasão do Iraque e guerra no Afeganistão.
Além disso, é tido como um diplomata próximo dos interesses norte-americanos, nomeadamente, com algumas relações estreitas no interior do Partido Republicano. É de assinalar que as suas duas únicas colocações no exterior tenham sido, precisamente, em Nova Iorque e Washington.
Existem ainda dúvidas sobre a forma como um diplomata de carreira lidaria com os cortes na despesa a levar a cabo no ministério. O próximo Orçamento do Estado prevê menos 13 milhões de euros nos cofres do Palácio das Necessidades, o que implica o despedimento ou rescisão amigável de 500 funcionários, diplomatas e técnicos.

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