domingo, 1 de janeiro de 2023

Euribor “rouba” centenas de euros ao orçamento mensal das famílias

 


 ANTEVISÃO 2023

Euribor “rouba” centenas de euros ao orçamento mensal das famílias

 

Taxas subiram entre 2,5 e 3,5 pontos no espaço de um ano e ainda vão continuar a aumentar em 2023, mas em menor escala. Mais famílias poderão precisar de renegociar contratos.

 

Rosa Soares

31 de Dezembro de 2022, 6:55

https://www.publico.pt/2022/12/31/economia/noticia/euribor-rouba-centenas-euros-orcamento-mensal-familias-2033296

 

Em 12 meses, verificou-se uma mudança radical no preço do dinheiro para quem tem crédito à habitação associado às Euribor. As recentes subidas das taxas têm um impacto de algumas centenas de euros na prestação mensal, especialmente nos créditos de montante mais elevado e associados à taxa a 12 meses. O aumento violento das taxas de juro demonstra como a descida para valores negativos constituiu uma “armadilha” para as famílias que pediram empréstimos nos últimos anos, porque permitiram aceder a montantes mais elevados, que agora têm dificuldade em suportar.

 

As taxas a três, seis e 12 meses, presentes em cerca de 90% dos empréstimos à habitação existentes em Portugal, atingiram, em Dezembro, valores médios de 2,063%, de 2,560%, e de 3%, respectivamente. Estes valores contrastam com os valores negativos verificados em Dezembro de 2021, quando registaram os valores mais baixos de sempre: a três meses em -0,572%, a seis meses em -0,546%, e a 12 meses em -0,501%.

 

Como ao valor das taxas Euribor ainda é somado o spread ou a margem comercial do banco, a taxa final suportada pelos particulares é ainda mais elevada. Contrariamente, no período das Euribor negativas, o valor da margem comercial do banco era abatido à taxa, o que limitou ou mesmo anulou o pagamento de juros em muitos empréstimos.

 

Rendas só poderão ser actualizadas em 2%

A actualização automática das rendas, prevista por lei, ficará limitada a um máximo de 2% em 2023, um valor que fica abaixo daquele que resultaria da aplicação da fórmula de cálculo actualmente em vigor.

 

De acordo com a lei, o valor das rendas dos contratos de arrendamento é actualizado, anualmente, em função da variação média dos últimos 12 meses do índice de preços no consumidor, sem a componente de habitação, registada em Agosto do ano anterior. Considerando esse indicador, as rendas poderiam ser actualizadas em 5,43% no próximo ano, mas, no âmbito do pacote de medidas destinadas a apoiar as famílias impactadas pela inflação, o Governo decidiu limitar esse aumento a 2%.

 

Assim, a título de exemplo, uma renda de 500 euros poderá ser actualizada, no próximo ano, para um máximo de 510 euros, em vez dos 527,15 euros que poderiam ser alcançados sem a imposição deste limite dos 2%.

 

Esta medida aplica-se apenas aos contratos de arrendamento já em vigor.

 

Quanto aos novos contratos, os aumentos têm sido constantes. No terceiro trimestre deste ano, o valor mediano das rendas dos novos contratos de arrendamento fixou-se em 6,55 euros por metro quadrado, valor que se mantém inalterado em relação ao segundo trimestre deste ano mas que representa um aumento de 7,6% face a igual período do ano passado.

 

Tendo em conta a evolução dos valores praticados no mercado de arrendamento nos últimos anos, tudo aponta para que, em 2023, as rendas dos novos contractos continuem a aumentar a ritmo acelerado.  Rafaela Burd Relvas

 

O impacto da subida da prestação é muito significativa para quem tem empréstimos mais elevados e associados à Euribor a 12 meses, como são boa parte dos contratos celebrados nos últimos anos. Nos que estão associados aos prazos a três e seis meses, a subida é menor e mais lenta, devido ao valor mais baixo destas duas taxas, e ao facto de serem revistos mais vezes.

 

A partir de uma simulação realizada pelo PÚBLICO, para um empréstimo de 150 mil euros, a 30 anos, associado à média da Euribor a 12 meses de Dezembro de 2022, e um spread de 1% (taxa final de 3,560%), a contratar ou a rever em Janeiro de 2023, é possível verificar que a prestação mensal correspondente é de 717,68 euros. Um aumento de 268,96 euros face ao valor que pagava com a taxa verificada em Dezembro de 2021 (-0,501% + 1% = 1,499%). Como o contrato associado a este prazo só seria revisto em Janeiro de 2024, o impacto anual do aumento ascende a 3327,52 euros.

 

Se o montante do empréstimo for mais elevado, de 200 mil euros, a prestação sobe para 952,91 euros, uma diferença de 354,62 euros tendo em conta o agravamento da taxa face ao final de 2021. O impacto anual é de 4255,44 euros.

 

Na mesma simulação para um empréstimo de 150 mil euros, associado à Euribor a seis meses, a rever em Janeiro, a prestação sobe 232,84 euros face ao valor de há 12 meses, para 678,60 euros. Neste caso, o contrato é revisto a cada seis meses, pelo que uma parte do aumento já foi incorporada. Assim, face à revisão realizada em Julho, o aumento da prestação é de 184,9 euros.

 

Com a taxa a três meses, a prestação resultante da simulação é de 637,51 euros na revisão a ocorrer em Janeiro, um aumento de 193,45 euros face ao que pagava com a taxa de Dezembro de 2021, e mais 82,26 face à última revisão, no passado mês de Outubro.

 

A forte subida das taxas Euribor acabou por anular uma das salvaguardas ao endividamento excessivo das famílias, demonstrando a necessidade de uma alteração dos pressupostos tidos em conta para o cálculo da taxa de esforço (peso dos encargos com o crédito no orçamento familiar). Essa salvaguarda, em vigor apenas a partir de Julho de 2018, consistiu na soma de mais 3% face à taxa verificada no momento da contratualização, valor que a evolução da taxa já igualou no prazo a 12 e seis meses.

 

Ou seja, face aos mínimos em cerca de -0,5% verificados no final de 2021, e culminando um período de cerca de sete anos abaixo de zero, a taxa a 12 meses já subiu 3,5 pontos; a seis meses, três pontos; e a três meses, 2,5 pontos.

 

Renegociação dos contratos

Para muitas famílias, é difícil assimilar os actuais aumentos e os que ainda ocorrerão em 2023. Embora de forma mais moderada, as perspectivas para o ano que agora se inicia não são positivas. As Euribor vão continuar a subir, especialmente durante o primeiro semestre.

 

O ritmo dessa subida será ditado pelo Banco Central Europeu (BCE), que na última reunião avisou que vai continuar a subir as suas taxas directoras, de referência para as operações com os bancos, “de forma significativa e de forma regular”. As decisões de política monetária do banco central influenciam o valor das Euribor, fixadas diariamente no mercado interbancário, a partir das taxas a que um conjunto alargado de instituições está disponível para emprestar dinheiro entre si.

 

As famílias que sofram aumentos mais expressivos podem recorrer à renegociação dos contratos, de forma a evitar a entrada em incumprimento. O Plano de Acção para a Prevenção do Incumprimento (PARI) foi melhorado recentemente, através de um diploma do Governo, fixando novas obrigações aos bancos no acompanhamento da situação financeira dos clientes e na apresentação de soluções quando for necessário. E são muitos os particulares que têm sido contactados pelas instituições financeiras, já com estimativas relativas aos próximos aumentos.

 

O Decreto-Lei n.º 80-A/2022, de 25 de Novembro, elimina alguns custos que estão habitualmente associados às soluções que permitam a redução do valor a pagar mensalmente, como é o caso, por exemplo, da comissão por alargamento do prazo do contrato. E proíbe-se o aumento da taxa de juro. É ainda facilitada a amortização total ou parcial dos empréstimos à habitação (independentemente do montante dos empréstimos), ao ser eliminada a comissão de resgate, que é de 0,5% sobre o capital a pagar. Quem tem planos de Poupança Reforma poderá resgatá-los, sem penalização fiscal, para pagar as prestações, e quem tiver poupanças também as pode amortizar no capital sem custos.

Sem comentários: