AMBIENTE
Em 36 cidades da Europa, Lisboa é das que tratam pior
quem anda a pé
Projecto Clean Cities analisou a sustentabilidade da
mobilidade em 36 cidades europeias. Capital portuguesa ficou em 15.º lugar, mas
ocupa a 35.ª posição na segurança dos peões.
Abel Coentrão
24 de Fevereiro
de 2022, 16:11
https://www.publico.pt/2022/02/24/local/noticia/36-cidades-europa-lisboa-tratam-pior-anda-pe-1996658
Em Lisboa, a predominância do automóvel prejudica quem
anda a pé e de bicicleta, que têm muito menos espaços reservados
A cidade de
Lisboa tem um longo caminho a percorrer – e pouco tempo – se quiser que todo o
seu sistema de mobilidade seja neutro em emissões de CO2 no final desta década.
A capital portuguesa, que é uma das 377 candidatas à missão europeia que
pretende apoiar financeiramente a aceleração dos objectivos climáticos à escala
urbana, ficou em 15.º lugar numa amostra de 36 cidades cujo comportamento, na
área específica da mobilidade, foi avaliado por peritos, a pedido de uma coligação
de organizações europeias que está a levar a cabo Campanha Cidades Limpas, para
forçar um aumento das exigências de descarbonização das cidades europeias.
No Norte da
Europa pode ser frio, mas é lá que estão as grandes vencedoras desta avaliação
internacional, que em Portugal contou com o apoio da associação ambientalista
Zero, parceiro desta campanha. Oslo (71,5 pontos em cem possíveis), Amesterdão
(65,5), Helsínquia (64,2), Copenhaga (62,3) e Paris (61,9) ocupam os primeiros
cinco lugares desta tabela, na qual Lisboa (53,5) surge ainda atrás de
Estocolmo (61,7), Guent (58,7), Munique (57,5), Bruxelas (57), Barcelona
(56,9), Lyon (56,6), Londres (55,8), Viena (55,5) e de Bilbau (55), em Espanha.
A capital portuguesa tem melhor desempenho que outras capitais, como Madrid
(16.ª), Berlim (19.ª), Liubliana (28.ª) Praga (29.ª), Roma (32.ª) ou Varsóvia
(34.ª).
Rede pedonal insuficiente
Para este
trabalho foram definidas cinco grandes categorias e um total de 11 indicadores
para análise da performance ambiental de uma amostra de cidades europeias com
mais de cem mil habitantes, escolhidas pela sua importância para o debate sobre
mobilidade nos respectivos países mas também pela disponibilidade de dados.
Cada uma das cidades foi avaliada quanto ao espaço que dedica para pessoas, ou
seja, as condições oferecidas a peões, ciclistas e em termos de espaços verdes.
Os utilizadores vulneráveis são também o centro das atenções da categoria “ruas
seguras”, que se apoia no padrão exigente da Visão Zero. As três outras
categorias são o acesso a meios de mobilidade amigos do ambiente, as políticas
públicas e a qualidade do ar.
Lisboa continua a
não ser uma cidade segura para os peões. Neste critério pontua mal (2,5 em dez
valores), tendo em conta os atropelamentos mortais ocorridos nos últimos três
anos em função da população, surgindo mesmo em penúltimo lugar da classificação
(35.º lugar), explica a Zero, numa análise mais detalhada a cada uma das
dimensões. Aliás, noutro indicador relacionado, fica em 25.º lugar na avaliação
da rede pedonal (3,7 pontos), aferida com base no tamanho desta, em comparação
com a extensão da rede rodoviária. “Neste aspecto, Lisboa ainda tem muita
margem para progredir, uma vez que o peão em Lisboa é o elo mais fraco, havendo
poucas vias dedicadas à circulação pedonal com espaço suficiente, desimpedidas
e confortáveis”, alerta a parceira portuguesa desta campanha.
Ciclovias mais seguras
Tema de campanha,
a rede de ciclovias ajudou Lisboa a conseguir uma boa classificação do ponto de
vista da segurança (8,7, de zero a dez). Segundo a Zero, este indicador foi
aferido com base no número de fatalidades ocorridas entre ciclistas nos últimos
três anos em relação à população residente e a capital portuguesa está no 10.º
lugar entre as 36 cidades. No entanto, tal como em relação aos passeios, o
tamanho da rede cicloviária (pontuação de 1,5), apurada comparativamente com a
extensão da rede rodoviária, deixou Lisboa na parte de baixo da tabela, em 21.º
lugar, apesar dos investimentos realizados nos últimos anos, nota o parceiro
português deste estudo.
Uma das melhores
notícias nos últimos anos, a redução do preço do transporte público valeu a
Lisboa uma óptima pontuação (8,1) no peso que a despesa com transporte público
tem no orçamento familiar. Mas, assinala a Zero, “apesar de este peso ser baixo
em Lisboa, muito por força da tarifa do passe intermodal em vigor desde 2019,
neste aspecto a cidade classifica mal em termos relativos (30.º lugar), pois na
maior parte das restantes cidades o peso é ainda menor”. Em contrapartida, a
capital portuguesa pontua muito bem na densidade da rede de transporte público
(8,6) – o que lhe vale, neste caso um segundo lugar entre as 36 cidades
comparadas.
Área verde insuficiente
Houvesse uma
correlação directa entre a densidade da rede e a qualidade do serviço, e tudo
seria melhor para os lisboetas. O problema é que a qualidade do transporte
público acaba por ser afectada, por exemplo, pelo congestionamento do trânsito
automóvel. Este também foi avaliado e, claro, Lisboa surge abaixo do meio da
tabela, com 5,9 pontos. Pior pontuação mereceu a qualidade do ar (4,9), aferida
com base nas concentrações de dióxido de azoto (NO2) e partículas (PM10 e
PM2,5), e a área dedicada a espaços verdes (4,2), que além de trazer conforto a
quem anda a pé, ajudaria a mitigar este tipo de problemas. Neste último
aspecto, a cidade portuguesa ficou-se pela 21.ª posição.
Como assinala uma
das autoras deste estudo, Barbara Stoll, o sector dos transportes “é o único em
que as emissões vêm aumentando, desde os anos 90”, o que torna urgente a sua
descarbonização, principalmente nas cidades, dado que a mobilidade urbana
(pessoas e mercadorias) é responsável por 23% dos gases com efeito de estufa
atirados para a atmosfera por todo o sector. Com 75% dos Europeus a viver em
cidades, descarbornizar o quotidiano destes espaços é um desafio colossal, para
o qual já não há tempo a perder, assinala a Zero, que numa nota sobre este
trabalho, pede objectivos claros e ambiciosos às cidades portuguesas, um apoio
legislativo e financeiro do Governo a esta transição e um esforço credível de
monitorização, para que os decisores, e a própria população, percebam em que
ponto do caminho estão e o trabalho que ainda têm pela frente.
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