OPINIÃO
Transportes gratuitos na gaveta de Moedas
Em 126 dias de governo da Câmara de Lisboa, a proposta do
Bloco já passou 70 na gaveta da coligação de direita. Decidimos avançar para
tribunal contra o presidente da CML.
Beatriz Gomes
Dias
26 de Fevereiro
de 2022, 6:44
https://www.publico.pt/2022/02/26/opiniao/opiniao/transportes-gratuitos-gaveta-moedas-1996887
Os transportes
públicos são a espinha dorsal da mobilidade nas cidades. Com uma rede ampla e
eficiente de transportes públicos com custos acessíveis a todas as pessoas,
conseguimos resolver alguns dos maiores problemas que as cidades enfrentam: o
trânsito e as emissões de gases, que poluem as ruas e aceleram o aquecimento
global. Em Lisboa o caso é grave. Todos os dias entram na cidade 370 mil
carros, que se juntam aos 160 mil que já circulam nas suas ruas, fazendo com
que se desloquem diariamente na capital tantos carros como habitantes.
Veio da esquerda
o maior avanço das últimas décadas para incentivar o uso do transporte público:
a unificação de centenas de títulos de transporte num passe único e a enorme
redução do seu preço. Foi um dos maiores aumentos de rendimento para as
famílias nos últimos anos e foi um passo de gigante para a neutralidade
carbónica. No Parlamento, o PSD opôs-se e votou contra.
Nas últimas
eleições autárquicas, o Bloco de Esquerda defendeu a gratuitidade dos
transportes públicos para toda a gente, a implementar num plano faseado e
quantificado, começando pelas pessoas desempregadas, pessoas com deficiência,
jovens e maiores de 65 anos. A coligação liderada por Carlos Moedas declarou
que também queria transportes públicos gratuitos para “os mais novos e os mais
velhos”.
Como seria
expectável, o Bloco de Esquerda, cumprindo o seu programa eleitoral, redigiu
uma proposta com a colaboração de vários especialistas em transportes e pediu o
agendamento da sua apresentação ao presidente da Câmara de Lisboa. Durante a
discussão do orçamento da Câmara Municipal de Lisboa (CML), Carlos Moedas
anunciou querer avançar com a sua medida de transportes públicos gratuitos para
“os mais novos e os mais velhos”.
Contudo, este
anúncio da gratuidade dos transportes públicos não passou de uma declaração de
intenções. Não só Carlos Moedas não apresentou ainda qualquer proposta, como
tem bloqueado a proposta do Bloco de Esquerda, impedindo o seu agendamento. Em
126 dias de governo da CML, a proposta do Bloco já passou 70 na gaveta da
coligação de direita, onde está guardada desde 13 de dezembro, num inequívoco
incumprimento do que está previsto no regimento da Câmara.
A falta de
democracia e de capacidade de diálogo é tal, que o gabinete de Carlos Moedas
enviou um ofício a todos os outros partidos dizendo que todas as matérias em
que a direita também tenha proposta só serão agendadas quando a direita quiser.
Assim, uma medida
tão importante como os transportes públicos gratuitos, um tema em que parecia
haver maioria na CML para aprovar e decidir um caminho comum, foi sequestrada
pela direita, sem data para sair da gaveta.
O Bloco de
Esquerda não aceita entorses à democracia e às suas regras e, por isso, face à
imutável posição de Carlos Moedas já apresentou uma queixa formal na Provedoria
de Justiça, que considerou não ter competência para decidir. Assim, decidimos
avançar para tribunal contra o Presidente da CML, por incumprimento das regras
da autarquia. Não aceitamos vetos de gaveta.
Parece longínquo
mês de outubro de 2021, tempo em que Carlos Moedas jurava ser um homem de
consensos. Pelo contrário, os novos tempos da direita parecem ser de falta de
diálogo e de incumprimento das regras da democracia.
CÂMARA DE LISBOA
Bloco vai avançar com queixa contra Moedas por não
agendar propostas
Proposta em causa refere-se à criação de um programa de
transportes públicos gratuitos — uma medida em que o executivo também diz estar
a trabalhar. Depois de uma queixa à Provedoria de Justiça, que considerou não
ser a entidade competente para avaliar o assunto em apreço, o Bloco vai avançar
para os tribunais.
Cristiana Faria
Moreira
24 de Fevereiro
de 2022, 7:00
O Bloco de
Esquerda vai avançar com uma queixa na Justiça contra o presidente da Câmara de
Lisboa pela demora no agendamento de uma proposta da vereadora bloquista sobre
a criação de um programa de transportes públicos gratuitos.
A decisão surge
depois de a vereadora Beatriz Gomes Dias ter apresentado uma queixa à
Provedoria de Justiça contra o autarca, Carlos Moedas, pelo facto de não ter
ainda agendado a discussão em reunião do executivo de uma iniciativa dos
bloquistas, entregue em Dezembro passado. No seu entender, esta demora
“desrespeita o Regimento da Câmara Municipal de Lisboa”.
De acordo com
este documento, “a ordem do dia de cada reunião é estabelecida pelo presidente
da câmara, devendo as propostas de inclusão na ordem de trabalhos ser
apresentadas pelos vereadores ao presidente da câmara com a antecedência mínima
de seis dias relativamente à data da reunião”. Devem também “ser incluídas até
à segunda reunião após a sua apresentação, sob pena de ficarem automaticamente
agendadas para a terceira reunião após a sua apresentação”. Ora, de acordo com
a queixa a que o PÚBLICO acedeu, tal não aconteceu com as iniciativas
subscritas por Beatriz Gomes Dias.
Queixa-se a vereadora
de que apresentou quatro propostas que “foram enviadas por email no dia 13 de
Dezembro de 2021, ao cuidado do Gabinete do Presidente da Câmara de Lisboa, com
o conhecimento do Departamento de Apoio aos Órgãos e Serviços Municipais e da
Divisão de Apoio à Câmara Municipal”, assim como para os vereadores das outras
forças políticas, e que entre esse dia e 21 de Janeiro — período durante o qual
se realizaram cinco reuniões — não foram agendadas para discussão.
“Apesar das
diversas tentativas em obter informação sobre o estado da inclusão dos assuntos
[…], o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa optou sempre por não fornecer a
respectiva informação”, refere a queixa, que acrescenta ainda que nesse período
foram incluídos nas ordens de trabalho assuntos indicados por outros
vereadores.
Com esta conduta,
Moedas “opta por dar tratamento diferenciado aos vereadores e vereadoras que
compõem o órgão colegial, criando desigualdades, no que se considera ser um
incumprimento das disposições previstas no Estatuto do Direito de Oposição,
aprovado pela Lei n.º24/98, de 26 de Maio, e na própria Constituição da
República Portuguesa”, nota a queixa que foi remetida à Provedoria de Justiça
no passado dia 18.
A resposta chegou
três dias depois, referindo a Provedora não ser a entidade competente para
avaliar o assunto em apreço. Esta é uma “matéria estranha à intervenção da
Provedora de Justiça”, uma vez que é “um órgão de defesa dos cidadãos e das
suas organizações contra os poderes públicos e não de adjudicação de conflitos
institucionais entre poderes públicos”, lê-se na resposta enviada por este
órgão.
Na sequência
desta resposta, o Bloco de Esquerda decidiu que “vai interpor uma acção
administrativa no tribunal administrativo para cumprimento do direito administrativo,
do regimento e do direito de oposição”, refere a vereadora Beatriz Gomes Dias
ao PÚBLICO. "Todos os canais de comunicação esgotaram-se. É um bloqueio
inaceitável às propostas do Bloco de Esquerda e à democracia”, afirma a eleita
ao PÚBLICO.
Transportes
públicos gratuitos
“Após diversas
reclamações”, três das quatro propostas subscritas por Beatriz Gomes Dias
acabaram agendadas no passado dia 9 de Fevereiro, mas uma permanece ainda por
marcar, precisamente a que esteve na origem da queixa apresentada à Provedoria
de Justiça. Refere-se à criação de um Programa Municipal para a Gratuitidade
dos Transportes Públicos, que envolva Carris, Metro de Lisboa e CP. O projecto
dos bloquistas é que se inicie “o caminho para a gratuitidade com as pessoas
desempregadas, jovens até aos 23 anos, seniores com 65 anos ou mais e as
pessoas com deficiência”.
Uma proposta que
é semelhante a uma das medidas que foi bandeira de Carlos Moedas durante toda a
campanha eleitoral e na qual a Câmara de Lisboa diz estar a trabalhar. Em
reacção a esta queixa, o município notou que na reunião de câmara de 9 de
Fevereiro, o presidente “apresentou um cronograma de reuniões e uma metodologia
de trabalho sobre a gratuitidade dos transportes públicos na cidade de Lisboa e
as diferentes formas de a implementar, para o qual foram convidados a
participar todos os vereadores, num trabalho conjunto que tem por objectivo
encontrar consensos sobre as formas de implementação da medida no mais curto
prazo”. Um planeamento que “mereceu elogios de todos os partidos, à excepção do
Bloco de Esquerda”, sublinha a câmara numa curta resposta ao PÚBLICO.
O município
detalha ainda que desde o início do mandato, foram agendadas e votadas 12
propostas elaboradas pelos vereadores do PS, PCP, Livre, Cidadãos por Lisboa e
BE.
TRANSPORTES
PÚBLICOS
Moedas diz ter apresentado um “orçamento dos transportes
públicos”
O autarca quer alargar a medida dos transportes públicos
gratuitos para jovens e idosos à Área Metropolitana de Lisboa mas tudo
dependerá das conversações com os restantes presidentes camarários, a empresa
Transportes Metropolitanos de Lisboa e os deputados municipais.
Ana Bacelar
Begonha
6 de Janeiro de
2022, 15:30
Em visita à
estação de recolha de Miraflores da Carris, esta quinta-feira, o presidente da
Câmara Municipal de Lisboa (CML), Carlos Moedas, reforçou a prioridade de se
implementar a gratuitidade dos transportes públicos para jovens e idosos,
referindo-se ao orçamento municipal para 2022 como o “orçamento dos transportes
públicos”. Pretende também que esta aposta se estenda a toda a área
metropolitana, em articulação com as outras autarquias.
“Temos trabalhado
muito com a Carris e também com os Transportes Metropolitanos de Lisboa (TML)
porque esta é uma medida que permite a descarbonização da cidade e que habitua
as pessoas a andarem de transportes públicos. E, por isso, esta é uma medida,
para mim, fundamental”, afirmou em declarações à imprensa. “Este orçamento é,
de certa forma, o orçamento dos transportes públicos”, sublinha.
A introdução de
“transportes públicos gratuitos para residentes menores de 23 e maiores de 65
anos” já constava do programa eleitoral da coligação “Novos Tempos" e já
tinha sido apontada por Moedas como uma das medidas prioritárias do novo
executivo da CML no seu discurso de posse, mas só agora tomou forma.
De acordo com o
vice-presidente da CML, Filipe Anacoreta Correia, que anunciou a medida esta
quarta-feira na apresentação do orçamento municipal para 2022, os passes
gratuitos deverão abranger os jovens dos 13 aos 18 anos, os estudantes até aos
23 anos e os maiores de 65 anos residentes em Lisboa.
Esta proposta
terá um custo plurianual de 12 milhões de euros, no qual se inclui a
“compensação por perda de receita para os operadores”.
O executivo
pretende adoptar a medida através da Transportes Metropolitanos de Lisboa
(TML), empresa responsável pela gestão dos transportes e dos passes, de forma a
abranger todos os meios de transportes públicos da cidade: os rodoviários, o
metropolitano e também a rede ferroviária.
Carlos Moedas
comprometeu-se também, na visita à Carris, a apresentar esta medida na próxima
segunda-feira aos outros concelhos da Área Metropolitana de Lisboa (AML), que
já se mostraram abertos a implementar a medida nas suas cidades, revelou o
presidente da CML.
Descarbonização
das cidades
“Penso que é algo
com que muitos colegas também sonham e, por isso, se eu puder ajudar nesse
caminho e influenciar nesse movimento nacional dos transportes públicos, acho
que seria bom para todos”, afirmou. “Quero influenciar essa passagem em
Portugal para aquilo que eu penso que é a melhor medida para a descarbonização
das cidades”.
Quando
questionado pelo PÚBLICO sobre o andamento das conversações com a TML, Moedas
mostrou-se confiante, declarando que “vamos lá chegar, sem dúvida”.
Contudo,
Anacoreta admitia, na apresentação do orçamento, a possibilidade de que a
medida venha a ter de abarcar apenas a Carris, empresa tutelada pela CML, e de
ser implementada de forma faseada, primeiramente ao nível dos idosos, “por razões
técnicas”.
Relativamente à
data de implementação da medida, o o autarca quer fazê-lo “o mais breve
possível”, apontando para a sua efectivação no segundo semestre do ano, apesar
de ter ainda pela frente cerca de dois a três meses de trabalho em conjunto com
a Carris.
A coligação
“Novos Tempos” vai precisar, pelo menos, da abstenção do PS, do Livre e da
deputada independente Paula Marques para aprovar o orçamento da CML para este
ano e, com ele, a introdução dos transportes gratuitos em Lisboa para as
camadas mais jovens e velhas da população.
Em resposta aos
jornalistas sobre como espera aprovar o documento, Moedas disse que, por este
ser “um orçamento para as pessoas”, que não mistura “a ideologia e a política”,
considera “que todos aqueles que fazem parte do executivo, estejam do lado que
tem pelouros ou não, vão olhar para este orçamento com bons olhos”.
A proposta foi
esta quarta-feira entregue a todos os vereadores municipais e será discutida na
próxima reunião da Câmara Municipal no dia 20 de Janeiro, para depois ser
votada na Assembleia Municipal.
Se aprovada, irá
aumentar o conjunto de pessoas na cidade com acesso gratuito aos transportes,
que até agora são apenas as crianças com menos de 12 anos e os ex-combatentes
com mais de 65 anos.
A medida não vai
obrigar à criação de novos passes, nem a alterações nos custos dos passes e
bilhetes da restante população, mas a um único passe gratuito comum para os
autocarros e os metros, garantiu o presidente da CML.
A visita do
executivo da CML à transportadora durou cerca de 30 minutos e contou com
paragens ao posto de abastecimento a gás natural, inaugurado o ano passado, e à
central de comando de tráfego da Carris, onde se realiza a monitorização de
ocorrências no trânsito, em articulação com a EMEL e a PSP e em comunicação
directa com os condutores dos veículos da Carris.
Posteriormente, o
executivo esteve em reunião à porta fechada com o Conselho de Administração da
Carris, na qual continuaram as conversações sobre a medida sobre os transportes
públicos gratuitos que pretendem implementar.
Texto editado por
Ana Fernandes
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