quinta-feira, 30 de abril de 2015

Sampaio da Nóvoa cola-se às vitórias socialistas

“Resta saber se Sampaio resistirá ao jogo duro da política, tão distante da praxis da “República dos professores”. Afinal, numa entrevista em 2010, ainda antes do seu nascimento político, o próprio reconhecera não gostar desse “ambiente”. “O único cargo onde poderia ter tido algum poder, mas foi um cargo de que gostei muito pouco, foi o de consultor do Presidente Sampaio. Não gostei daquele ambiente.”

Sampaio da Nóvoa cola-se às vitórias socialistas
30-4-2015 / PÚBLICO

Muitos socialistas à vista, mas sem Bloco de Esquerda ou PCP. O anúncio da candidatura de Sampaio da Nóvoa a Belém ficou ontem marcado pela aproximação à esfera socialista. Dois ex-presidentes da República socialistas (Mário Soares e Jorge Sampaio) mais alguns antigos ministros (João Cravinho, Mário Lino e Jorge Lacão) e autarcas, como Duarte Cordeiro, compareceram no Chiado para ouvir o professor universitário comparar a sua futura campanha a outras batalhas. “Doutor Mário Soares, em 1986 foi difícil mas foi possível, doutor Jorge Sampaio, em 1996 foi difícil mas foi possível. Em 2016 também será difícil, mas também será possível”, disse Sampaio da Nóvoa no arranque de uma intervenção que ensaiou a demarcação à Presidência de Cavaco Silva e a crítica ao Governo de Passos Coelho. A demarcação a Cavaco ia sendo feita com referências subtis. Prometeu não ser “um espectador impávido da degradação da nossa vida pública”. Prometeu atenção às Forças Armadas “não abdicando da palavra que o Presidente” tinha na “mobilização para missões no estrangeiro”. Garantiu trabalho para “celebrar pactos de mudança e não de resignação”, não querendo “ser Presidente de apenas alguns portugueses”.
Depois de prometer empenho na luta para não “perder o país que conseguimos levantar nas ultimas décadas”, Sampaio da Nóvoa ensaiou a “diferença” da sua candidatura. Apesar do compromisso contra a “destruição do Estado social”, assegurou que pretendia “dar corpo a dinâmicas” que iam “além das dicotomias tradicionais esquerda/direita”. E para isso assumiu não ter “filiação partidária” e garantiu não ter exercido “cargos políticos no sentido estrito”.
sor”. “Até jogava matraquilhos, futebol e correu o mundo”, recordou o ex-director do Centro de Estudos do Pensamento Político do ISCSP. Foi a jogar a médio pela Académica que chega à Universidade de Coimbra. O curso de Medicina fica, entretanto, para trás. O gosto pelos palcos teatrais empurra-o para o Conservatório de Lisboa. E o prazer das aulas, de expressão dramática durante dois anos em Aveiro, trouxe-o de novo à Academia para finalmente se dedicar àquela que seria a sua área: a Educação. O “mundo” que percorreu foi para dar substrato a essa formação. Doutorou-se em Genebra e Paris antes de regressar em Lisboa. O seu globo alargou-se com o Brasil, onde até há pouco, foi consultor da UNESCO, precisamente na área da Educação.
É essa a arma que arremessa constantemente nos seus recentes discursos políticos. Desde o 10 de Junho de 2012: “O drama de Portugal tem sido sempre, mas sempre, o afastamento de sociedades que evoluíram graças ao conhecimento e à ciência.” A sua outra marca que flui dos palanques é a insistência na “mudança”, ou não fosse o ex-reitor um confesso “admirador” de Bob Dylan, autor de The
times are changing. No Congresso do PS, em Novembro de 2014, mostrouse “disposto a tudo” sem pretender “nada” para si, com essa mesma condição. Há dias reiterou-o no Congresso da Cidadania: “Pronto a morrer pela liberdade” mas apenas “se for para abrir um tempo de mudança”. Com urgência, asseverava, porque ou “será em 2015 ou não será por muito tempo”.
Houve uns que viram no termo um jargão vazio de contestação à austeridade. “Ilustre desconhecido”, concluiu Marques Mendes, um dos comentadores políticos reformado das lides. E, no entanto, no 10 de Junho de 2012 já traçava a sua linha, citando Franklin D. Roosevelt: “A democracia funda-se em coisas básicas e simples: igualdade de oportunidades; emprego para os que podem trabalhar; segurança para os que dela necessitam; fim dos privilégios para poucos; preservação das liberdades para todos.” Também não se escusou nos escaldantes dossiers que queimam as línguas da liderança socialista. Sampaio da Nóvoa, já depois de sucessivos líderes do PS (como o presidente Carlos César) terem sinalizado o seu apoio, ousou falar na expressão maldita ligada à dívida. “Temos de renegociar a dívida e resolvê-la honradamente. O nosso problema é económico e não financeiro”, disse no Congresso da Cidadania.
Foi por isso que o seu provável adversário Marcelo Rebelo de Sousa disse que, com Nóvoa, o PS poderia “fazer um dois em um”: “Pode ajudar António Costa a tentar ir buscar a uma esquerda que o rodeia mais uns por centos na luta contra o centrodireita.”


É a “formula ideal”, resume André Freire, a de apresentar “um candidato de extracção não partidária, mas sem prescindir do apoio financeiro e capacidade de mobilização da máquina de um grande partido”. Resta saber se Sampaio resistirá ao jogo duro da política, tão distante da praxis da “República dos professores”. Afinal, numa entrevista em 2010, ainda antes do seu nascimento político, o próprio reconhecera não gostar desse “ambiente”. “O único cargo onde poderia ter tido algum poder, mas foi um cargo de que gostei muito pouco, foi o de consultor do Presidente Sampaio. Não gostei daquele ambiente.”

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