O VOO DO CORVO .......
O Voo do Corvo pretende informar e contextualizar .
Assim acompanhará diáriamente diversos temas e acontecimentos, de forma variada e abrangente nas áreas da Opinião e Noticiário. Nacional e Internacional.
O critério Editorial é pluralista e multifacetado embora existam dois “partis/ pris”:
A Defesa do Património e do Ambiente.
António Sérgio Rosa de Carvalho.
Rua Nova do Carvalho vai ser transformada em "galeria de arte" com nome de
vodka e com protestos de moradores da zona
A Câmara de Lisboa, em parceria com uma associação de
bares e discotecas e com uma marca de vodka, inaugura na próxima quinta-feira um
"projecto de intervenção urbana", no Cais do Sodré, que tem sido contestado por
dois grupos de moradores e por alguns hotéis da zona.
O projecto, desenvolvido num troço da Rua Nova do Carvalho, junto a algumas
das casas de diversão nocturna mais conhecidas da zona, tem por base a pintura
do pavimento com tinta cor-de-rosa e a montagem de "oito estruturas tipo Mupi",
que servirão de suporte ao que os promotores chamam "uma galeria de arte ao ar
livre". O espaço, no qual a câmara proibiu o trânsito há cerca de dois anos, foi
baptizado, segundo um comunicado subscrito pelas três entidades envolvidas na
iniciativa, como Absolut Pink Gallery - uma designação que remete para a
marca de vodka que paga a intervenção.
A supressão do tráfego automóvel naquele local em finais de 2011 foi
acompanhada de uma primeira pintura do alcatrão a cor-de-rosa, que desapareceu
pouco depois. A iniciativa, que potenciou a ocupação nocturna da via pública
pelos frequentadores das discotecas e bares vizinhos, tem sido desde então
fortemente criticada por alguns moradores, que se queixam do ruído e da sujidade
provocada pelos milhares de pessoas que ali acorrem, sobretudo aos
fins-de-semana.
De acordo com o comunicado ontem divulgado pela câmara e parceiros, o
pavimento da rua "foi recuperado" e os passeios foram nivelados, inserindo-se a
intervenção numa "estratégia de reabilitação do bairro". O objectivo, afirmam,
consiste em "contribuir para a requalificação, recuperação e limpeza da rua;
facilitar a ordenação das esplanadas; melhorar a iluminação; potenciar novas
valências de comércio e actividades em diferentes horários; e reforçar as
indiscutíveis valências culturais e criativas já presentes no bairro".
Quem acha que este projecto - desenvolvido no âmbito de um concurso de ideias
lançado pela Associação Cais do Sodré (bares e discotecas) - não trará quaisquer
benefícios ao bairro é o grupo de cidadãos Nós Lisboetas, a Associação de
Moradores do Bairro Alto (AMBA) e alguns hoteleiros. Em resposta a anteriores
protestos, o gabinete do vereador Sá Fernandes comunicou à AMBA que o projecto
vencedor do concurso promovido pelos bares e discotecas foi "aceite" pela câmara
"após a realização dos ajustes identificados pelos serviços técnicos
competentes".
"É nosso entendimento que esta intervenção, para além de contribuir para um
melhor ordenamento das esplanadas, possibilitará também um controlo maior da
aglomeração das pessoas na rua indo ao encontro desejo dos moradores", salienta
a assessora do vereador que respondeu à associação. Reagindo a esta
argumentação, a AMBA afirma que a intervenção a inaugurar visa "reforçar e
incrementar a inadmissível utilização de uma via pública para uma pretensa
"galeria de arte a céu aberto", paga por uma empresa de bebidas, em
incumprimento dos necessários requisitos da lei do ruído, de salubridade,
segurança e ordem pública". A associação considera que a chamada Rua Rosa está
ser "imposta à margem da lei e das regras de conduta que pautam a administração
pública - apenas favorecendo alguns negócios naquela rua, a par da promoção do
consumo de álcool e do desregramento urbano".
Na carta que enviou há dias a José Sá Fernandes, a associação exige que lhe
seja facultado um conjunto de documentos camarários que terão servido de suporte
às decisões que permitiram a concretização do projecto dos bares na via
pública.
Sem mais comentários ... http://ovoodocorvo.blogspot.nl/2013/08/e-possivel-fazer-vibrar-criatividade.html
“Propõe-se o nivelamento da faixa de rodagem com os passeios
laterais, de modo a transformar o espaço existente num espaço público contínuo
e sem barreiras. Ao longo da rua prevê-se a colocação de oito MUPIS ao longo da
rua, que podem ser utilizados para exposições de fotografia ou outras
(individuais/coletivas, noite/dia), ou para informação de eventos na rua. Os
oito MUPIS podem ser utilizados como candeeiros no caso de não conterem
qualquer informação mas somente luz. Estes candeeiros podem mudar de cor de
acordo com o caráter do evento ao qual estão associados.”
Problemas financeiros punham em causa actividade em Setembro
A Secretaria de Estado da Cultura deu ontem à
direcção da Cinemateca Portuguesa - Museu do Cinema a garantia de que serão
desbloqueadas por estes dias "dotações excepcionais" para assegurar o
funcionamento da instituição, como confirmou ao PÚBLICO Maria João Seixas.
A directora da Cinemateca, cujos problemas de tesouraria denunciou no dia 20,
avançou apenas que um despacho da Secretaria de Estado irá oficializar a
existência de "dotações excepcionais", "em tranches de Setembro até Dezembro"
que permitirão continuar as suas actividades. Seixas não precisou quais os
montantes envolvidos.
As dificuldades financeiras da Cinemateca estão a ser discutidas com o
secretário de Estado da Cultura desde Abril. Em Junho e Julho foram entregues à
instituição 400 mil euros, dotações extraordinárias do Fundo de Fomento
Cultural. O PÚBLICO tentou confirmar junto da Secretaria de Estado da Cultura se
se trata, como aconteceu em Junho e Julho, de verbas saídas do Fundo de Fomento
Cultural, mas tal não foi possível. A programação da Cinemateca mantém-se, disse
ainda Seixas ao PÚBLICO, já com uma retrospectiva integral do realizador
espanhol Victor Erice a começar em Setembro.
A deputada socialista Inês de Medeiros ultima entretanto um projecto de
resolução para levar a debate e votação no Parlamento sobre o modelo de
financiamento da Cinemateca Portuguesa, por considerar que o Governo deverá
prever no Orçamento do Estado para 2014 verbas para a instituição. A Cinemateca
Portuguesa inclui o Arquivo Nacional das Imagens em Movimento, o maior
repositório do cinema português.
"Com a nova Lei do Cinema [Lei n.º 55/2012], a Cinemateca está excluída do
acrescento de verbas vindo das taxas [anuais a pagar pelos operadores de TV por
subscrição] e o Estado passa a ter a responsabilidade directa da preservação e
da disponibilização ao público do arquivo do nosso cinema", diz a deputada. "Que
não está a cumprir."
Editorial / Público
O Governo deve aproveitar o clima de comoção com os incêndios para discutir
novas políticas florestais
Vários responsáveis do Governo, incluindo o
primeiro-ministro, têm associado o brutal surto de incêndios das duas últimas
semanas à multiplicação de práticas criminosas. As detenções por fogo posto
realizadas pela GNR ou pela Polícia Judiciária não desmentem esta avaliação -
este ano já se registaram quase meia centena de detenções de suspeitos de
incendiarismo. Valia por isso a pena discutir estratégias para se combater a
acção dos pirómanos, que, em consequência de distúrbios mentais ou de mera
vocação criminosa, reincidem nos seus crimes em cerca de 20% dos casos. Valia
também a pena voltar a discutir para o futuro o papel que as imagens das
televisões têm na multiplicação destas práticas e saber se não faria sentido um
pacto de auto-regulação entre os meios de comunicação social. Mas o
reconhecimento destes problemas não deve levar à ilusão que o desastre que nos
últimos dias se abateu sobre a floresta nacional tem no incendiarismo a sua
principal causa. Se assim fosse, não se teria verificado um aumento exponencial
de ignições nestes dias de forte calor e de baixa humidade, nem sequer se teriam
registado fogos com a dimensão do que está há dias a destruir a serra do
Caramulo. Mesmo que nestes dias de aflição e de comoção nacional seja defensável
que as mensagens políticas devem apoiar o esforço dos bombeiros e procurem
denunciar a profusão de crimes contra o património florestal nacional, o Governo
não pode deixar de insistir na necessidade de se voltar a repensar as políticas
destinadas a protegê-lo e valorizá-lo. É em momentos de alarme social como o que
vivemos que se reúnem condições para se ousarem medidas de fundo para o futuro.
Em 2003/2005 essa oportunidade foi aproveitada. Seria bom que essa inspiração
pudesse ser repetida e que de uma vez por todas o país falasse da sua floresta
ao longo do ano inteiro.
Pulmão de Portugal vai demorar a curar
feridas dos fogos
Por Sandra Rodrigues
A serra do Caramulo que outrora era o pulmão de Portugal, procurada por quem
tinha males respiratórios, hoje é terra queimada. O verde deu lugar ao negro e o
ar que se respira está contaminado
Acabou o que de melhor tinha a serra do Caramulo.
"Esta era a única zona do país com ares puros. Agora está tudo contaminado". O
desabafo é de José Castro, habitante de uma das muitas aldeias espalhadas pela
serra com o nome da vila que foi durante décadas o local de cura para quem
sofria de problemas respiratórios. Os sanatórios do Caramulo eram frequentados
por doentes de todo o país. O primeiro entrou em funcionamento em 1922. Hoje, é
o Caramulo que está doente. Há mais de uma semana que as chamas, o fumo e as
cinzas fazem parte do dia-a-dia desta gente que tinha como companhia o verde da
natureza e a pureza do ar. Agora, o preto é a cor que pinta a paisagem. Os vales
estão mergulhados em fumo.
A serra do Caramulo, no distrito de Viseu e agora também no de Aveiro, é uma
das zonas do país mais afectadas pelos fogos florestais. As últimas semanas de
Agosto tornara-se num verdadeiro inferno. Para as populações, muitas das quais
perderam bens, e para os bombeiros que viram partir três companheiros. De noite
ou de dia, a missão tem sido a mesma: vigiar.
E era a partir do posto de vigia colocado no alto do Caramulo que José Castro
olhava, desolado, em todas as direcções. "Nunca imaginei que estes incêndios
tomassem tamanhas proporções, nem que causassem todos estes prejuízos",
lamentou. O seu colega, André Marques, estava pronto para deixar o seu posto
porque as chamas estavam a ameaçar a pequena localidade de Varzielas, onde vive.
"É melhor ir para baixo. Nunca sabemos o que pode acontecer", contou. Há dois
dias que a rotina tem sido a mesma. Manter-se atento quer em casa, quer no posto
de vigia e "fazer o que se pode para salvaguardar as [suas] coisas e a dos
vizinhos". José Castro e André Marques são dois voluntários que durante os meses
de Julho, Agosto e Setembro, juntamente com mais dois colegas, vigiam 24 horas
por dia a serra. "Nem assim conseguimos evitar que esta tragédia ocorresse",
lamentavam. A caminho de Varzielas, André Marques desceu a serra em silêncio. Só
a cabeça abanava em sinal de desânimo.
Na vila do Caramulo, a população está acostumada a ver passar, com calma, o
tempo. Ontem, as estradas estavam ocupadas pelo vermelho dos carros dos
bombeiros que andavam para baixo e para cima. Com eles, centenas de militares do
Exército que também foram convocados para o terreno. "Ainda vai demorar o seu
tempo até podermos voltar à normalidade. Eu já só acho que este inferno termina
quando vier uma grande chuvada... pelo andar das coisas lá para Setembro",
dizia, com algum desespero, José Castro.
Entre o Caramulo e Castanheira do Vouga (no concelho de Águeda) há populações
que estão longe de voltar à normalidade, mesmo que o incêndio tenha ontem sido
dado como dominado ao final do dia. Manuel Marques não dormia há duas noites.
"Não vai ser fácil regressar à normalidade. Isto vão ser noitadas atrás de
noitadas até termos a certeza que está tudo apagado", disse. Para este habitante
de Caselhe de São João do Monte, também não vai ser fácil esquecer os momentos
que viveu nos últimos dias. "Vi povoações a ficarem ao deus-dará porque os
bombeiros não chegavam para tudo. Vi pessoas de idade a recusarem-se a deixarem
as suas casinhas. Vi uma mulher a ser queimada pelas chamas enquanto tentava
salvar os seus animais. Foram momentos complicados", contou.
Normalidade é uma palavra que estes dias não existe para as gentes da serra.
Muitos populares que tiveram de ser evacuados voltaram às suas habitações, mas o
medo continuava espelhado no olhar. Ontem, ao final do dia, enquanto centenas de
carros de bombeiros de corporações desde Ovar até Albufeira passavam pelas
estradas, a população acenava, despedindo-se e agradecendo.
"Espero bem que seja um adeus", desejava António Malafaia, embora pouco
convencido. O incêndio do Caramulo esteve ontem a ser combatido por mais de 800
homens. Os prejuízos são avultados e, para já, o presidente da Câmara de
Tondela, Carlos Marta, opta por não avançar um número. "Não sabemos que área
ardeu. Esse é um trabalho que vai ser feito mais tarde. Quando tudo estiver
terminado", disse. Perímetro de 40 quilómetros
A dimensão do incêndio que deflagrou na quarta-feira de manhã em Guardão
levou o comando nacional a repensar na estratégia de combate. O comandante José
Manuel Moura explicou ao PÚBLICO que a estratégia delineada estava a dar os seus
frutos. "Além do comando único, temos o perímetro sectorizado com dois comandos
distintos. Um na zona do distrito de Viseu e outro para Aveiro. Assim, a
comunicação e o planeamento são facilitados", explicou. "Podemos avançar que a
esta hora - 19h00 - o incêndio que devastou pinhal num perímetro de 40
quilómetros está praticamente resolvido e com as várias frentes dominadas",
anunciou. Mas o trabalho está longe de ser terminado. "As próximas 24 horas vão
ser de vigilância activa e espera-nos um fim-de-semana de muito trabalho."
Tendo em conta as condições meteorológicas, José Manuel Moura espera que a
partir da próxima quarta-feira já se possa "respirar de alívio". O comandante
operacional nacional lamentou que os incêndios na serra do Caramulo tenham
provocado a morte de três bombeiros.
No dia 22 de Agosto uma bombeira de 22 anos morreu e outros seis bombeiros
que integravam o grupo ficaram feridos, dois deles gravemente. Dois dias depois,
a 24 de Agosto, uma viatura de combate a incêndios dos Bombeiros Voluntários de
Algés sofreu um acidente em Tondela, quando participava no combate ao fogo que
lavrava naquele concelho, mas não houve feridos. A 27 de Agosto, um dos
bombeiros que ficou gravemente ferido no dia 22 de Agosto acabou por morrer. A
29 de Agosto, junto a esta serra, uma bombeira de 21 anos morreu no combate a um
incêndio em São Marcos/Muna, no concelho de Tondela, e outros quatro ficaram
feridos, dois gravemente. Três elementos do Grupo de Intervenção de Protecção e
Socorro da GNR sofreram ferimentos ligeiros no mesmo fogo. O funeral da jovem
bombeira de Carregal do Sal realiza-se hoje.
Não lhe sei dizer em concreto. Não conheço esses dados.
"As áreas geridas pelo Estado não estão
mais mal cuidadas que o resto da floresta"
Secretário de Estado das Florestas quebra o silêncio para, diz ele, refutar
"algumas afirmações semi-incendiárias". Afirma que 98% da floresta portuguesa
não pertence ao Estado
Francisco Gomes da Silva é secretário de Estado das
Florestas e do Desenvolvimento Rural desde Fevereiro, tendo substituído Daniel
Campelo. Decidiu romper o silêncio sobre os incêndios florestais, porque diz que
tem visto o trabalho de muita gente menosprezado e faz questão de fazer uma nota
prévia a lamentar a morte de bombeiros.
Tem havido algum silêncio do secretário de Estado das Florestas sobre o
problema dos incêndios florestais. Já o ministro da Administração Interna tem
falado muito no abandono da floresta e na falta de gestão florestal. Porquê?
Esse silêncio não tem sido acidental. De uma forma geral, em Portugal
fala-se de incêndios florestais desde que eles começam até que acabam. E nesse
período temos oportunidade de ouvir de diversas fontes a enorme preocupação
sobre essa matéria. A floresta - e é pela política florestal e pela gestão de um
espaço florestal muito diminuto que sou responsável - gere-se o ano todo, a
política faz-se o ano todo. E curiosamente o período do ano em que a actividade
florestal é reduzido ao mínimo é exactamente o período que estamos a atravessar.
Por diversas razões, um das quais o clima em que nos encontramos ser propício
aos incêndios, o incêndio faz parte do ciclo da floresta em Portugal. É evidente
que nos cumpre a todos zelar para minimizar as consequências desses incêndios.
Não é esta a hora da minha intervenção. Nos últimos tempos tem-se falado pouco sobre o problema florestal. Após os
incêndios trágicos de 2003 e 2005 houve uma grande reflexão sobre o abandono
florestal. Mas a premência do assunto caiu e hoje não parece uma
prioridade.
A floresta portuguesa é 2% propriedade do Estado, as chamadas "matas
nacionais", o que significa que 98% da floresta portuguesa não pertence ao
Estado. Sobre essa floresta existe um regime de propriedade que o Estado tem de
respeitar. A actuação no terreno sobre áreas florestais que compete ao Estado é
sobre 60 mil hectares. E ainda os perímetros florestais.
Ao todo soma 530 mil hectares. Ao contrário do que muitos têm dito durante
esta época de incêndios, as áreas geridas pelo Estado e em concreto as áreas que
são propriedade do Estado não estão mais mal cuidadas que o resto da floresta.
Não são mais mal geridas que o resto da floresta. Não ardem mais do que o resto
da floresta, antes pelo contrário. Qual é a área ardida neste conjunto este ano?
Não lhe sei dizer em concreto. Mas os dados de um ano pouco significam,
porque a evolução dos incêndios e as ignições aparecem de forma aleatória. E se
uma ignição aparece no espaço público é esse espaço que arde. Posso dizer em
todo caso, e não são dados muitos certos mas uma ordem de grandeza, que as matas
do Estado quando comparadas com a incidência de incêndios na floresta nacional é
substancialmente inferior. Sem nenhum grau de precisão avançaria números da
ordem de menos de metade. Muitos técnicos florestais garantem que essas áreas são mal geridas.
Não conheço esses dados. Quando alguém diz que o Estado gere mal a floresta,
estou à espera que me diga: qual, onde e quando. Os dados que tenho não são
esses. A principal mancha florestal propriedade do Estado que fica na região
centro, que costumamos chamar erradamente Pinhal de Leiria - já que é um
conjunto de matas - representa 50% das matas nacionais. Essas matas são
visitadas anualmente por inúmeros gestores florestais do mundo e são um exemplo
de gestão florestal. O Estado faz mais do que a sua obrigação? Não. E é uma das
razões por que não vale a pena falar muito nesta altura, porque quem afirma isso
não está a ser correcto. E se o afirma que diga quais são essas áreas, porque se
calhar não são área públicas. As pessoas confundem muito. Existem áreas
classificadas, que são zonas protegidas, parques naturais, reservas, locais da
rede natura que não são área públicas. São áreas completamente privadas. Dou um
exemplo, o Parque Natural da Arrábida: o Estado não é proprietário. O Estado
impõe um conjunto de restrições de uso, dado aqueles valores e, por isso, é uma
área classificada. Não são áreas públicas. Em termos de prevenção de incêndios, o que de relevante se tem feito?
A última alteração ao sistema de defesa de floresta contra incêndios data de
2009. Os grandes incêndios de 2003 e 2005 espoletaram todo um processo de
reflexão que levaram à concepção de um edifício de prevenção que é tido como bom
e equilibrado por toda a gente. O que foi feito de então para cá foi todo o
planeamento do sistema de floresta contra incêndios. Não chega fazer a lei. Teve
de se definir onde ficam as infra-estruturas de prevenção, faixas de gestão de
combustível da rede primária e da rede secundária, rede de pontos de água, rede
de caminhos, rede de parqueamento para os bombeiros nas fase de intervenção
estarem mais próximos dos locais de maior risco, rede de parqueamento dos meios
aéreos. Isto é feito sob a superintendência dos serviços florestais, do ICNF
[Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas], que o fez dinamizando
como lhe competia a criação das comissões municipais de defesa da floresta
contra incêndios, que é presidida pela câmara municipal, que tem a competência
para fazer planeamento à escala municipal destas infra-estruturas, ou seja, por
onde devem passar as faixas de combustível. Os técnicos dizem é que os planos estão feitos, mas no terreno as
infra-estruturas não existem.
O ICNF não tem por competência executar no terreno as infra-
-estruturas de defesa da floresta contra incêndios. Uma coisa é dizer "não
está tudo feito", outra coisa é dizer "a culpa é dos serviços florestais", como
já ouvi dizer. Vamos distinguir as coisas. O planeamento, isto é, dizer em
Portugal a faixa passa aqui, a identificação de pontos de água e a sua
localização precisa, tudo isso é feito ao nível das comissões distritais
coordenadas pelos ICNF. Os planos distritais resultam do somatório dos planos
municipais e o plano nacional resulta de tudo isto. Todo este trabalho foi
coordenado pelos serviços florestais à luz da actual lei. Esse trabalho só ficou
completamente concluído no início de 2013. Nada disso é feito porque o ICNF quer
e faz. As comissões têm de aprovar e quando uma comissão distrital, por exemplo,
demora a aprovar, por quaisquer que sejam as razões, o ICNF não pode fechar o
planeamento. A quem compete implementar os vários elementos da prevenção
estrutural? Compete ao ICNF a elaboração da rede de ponto de água, que são zonas
em que tanto os meios aéreos como os meios terrestres podem reabastecer-se, rede
que tem de ser aprovada na comissão municipal e distrital, onde têm assento a
protecção civil, as forças policiais, associações de produtores florestais... O
que está feito disso? Está implementada a rede a mais de 95% por acção do ICNF.
Temos uma memória muito curta. Quando os aviões e os helicópteros precisavam de
abastecer em 2003 e 2005, não tinham onde e esse foi um dos problemas. E a quem cabe fazer as redes de caminhos?
Depende do tipo de caminho. Em muitas circunstâncias compete ao proprietário
e é sua obrigação manter aquela rede de caminhos que está identificada nos
planos de defesa. Seja o Estado, uma autarquia ou particulares. Aquilo que a
legislação diz é muito claro. Compete sempre ao proprietário reter para o
terreno os elementos de defesa estrutural que estão concebidos, planeados e
aprovados e transferidos para os planos directores municipais. Quem tem de
implementar um determinado troço de faixa? O proprietário ou os proprietários
dos terrenos em cima dos quais a faixa foi traçada. Procurou-se que o traçado da
rede primária, que são faixas com 125 metros de larguras para interromper a
propagação de grandes incêndios, caíssem o mais possível em estruturas já
existentes, por exemplo, aproveitando o traçado de auto-estradas. Houve a
preocupação de minimizar os sacrifícios que isto pode impor aos cidadãos. O Estado tem já completo o que lhe compete enquanto proprietário?
O Estado tem implementado através do ICNF algumas faixas primárias de gestão
de combustíveis. Como a propriedade pública em termos florestais é muito
reduzida, compete pouco ao Estado. O que é que já está concretizado a nível da rede primária?
Em termos nacionais a rede primária implementada é de 12%. A rede secundária
é uma rede destinada a proteger estruturas: estradas, caminhos-de-ferro, linhas
de alta tensão, casas isoladas, povoações. Em torno de todas estas estruturas
têm de existir faixas de contensão de fogo. A quem compete implementá-las? Se
for uma casa, ao proprietário da casa. Não posso construir uma casa no meio de
um espaço florestal, se não garantir à minha volta 50 metros de faixa de
contensão de combustíveis. Vemos nas imagens excessivas dos incêndios que isto
não acontece. Muitas vezes a GNR levanta os autos e depois as câmaras não aplicam as
contra-ordenações. Não era tempo de mudar a forma de fiscalização?
As responsabilidades na lei estão perfeitamente identificadas. Quando se diz
que a culpa é dos serviços florestais, eles nem sequer têm competências na maior
parte dessas matérias. Refuto completamente algumas das afirmações
semi-incendiárias que nesta altura são feitas. Mas não se devia repensar este modelo?
Estou convicto que é bom que a reflexão se faça sem precipitações para não
estarmos a alterar coisas que não funcionaram por alguma razão e não é agora que
por irmos mudar tudo que as coisas vão funcionar. Depois temos a crítica: não
dão estabilidade às políticas. Tudo isto é suficientemente recente - e não me
entenda mal, não estou a dizer que de 2006 ou de 2009 até 2013 tenha passado
pouco tempo e que não era possível e desejável ter feito mais. É evidente que
sim. Aquilo que estou a dizer é que todos sabemos as condições financeiras em
que o país vive e não vive só em 2013. Viveu em 2012, viveu em 2011. Há aqui
algumas coisas que poderão realizar-se bem no momento em que existam mais meios
financeiros disponíveis. Afinal é ou não necessário mudar a lei?
Neste momento não é a prioridade. Queria chamar a atenção para um aspecto
muito mais importante. Digo-o sem querer minimizar responsabilidades minhas
enquanto secretário de Estado, ou sacudir a água do capote. Diversos estudos
feitos em Portugal sobre quais os principais factores que permitem interpretar a
área ardida estabelecem uma correlação muito clara entre o número de ignições e
a área ardida. Ou por outra, estabelecem uma ligação directa entre o número de
ignições e número de incêndios com área superior a 100 hectares. Isto significa
que quanto mais ignições houver, maior é a área ardida. Isto é uma questão que
ao nível do Plano Nacional de Defesa da Floresta contra Incêndios deverá ser
alterada. Temos objectivos de área, o número mítico dos 100 mil hectares. O
objectivo da área está mal colocado. Porque do ponto de vista da prevenção não
controlamos a área ardida. É uma questão de combate mais ou menos eficaz. O
grande esforço tem de ser em diminuir o número de ignições. Se as diminuirmos,
teremos sucesso na redução da área ardida.
Crime na Serra do Caramulo
por Sónia Graça in Sol online
PJ suspeita de mão criminosa no incêndio da Serra do
Caramulo, onde morreram dois bombeiros. Este ano, 25 dos 50 incendiários
detidos ficaram em prisão preventiva, o número mais alto dos últimos dois anos.
A Polícia Judiciária (PJ) suspeita que o incêndio que
devastou boa parte da Serra do Caramulo, em Viseu, e que ontem se reacendeu,
teve mão criminosa. Uma equipa de inspectores está no terreno há vários dias,
em exclusivo, para tentar descobrir o rasto dos incendiários responsáveis por
aquele que já é considerado o pior fogo deste Verão – em cinco dias, arderam
cerca de 30 quilómetros e dois bombeiros morreram no combate às chamas.
“É como procurar uma agulha no palheiro” – sublinha Rui
Almeida, director da PJ de Coimbra, explicando que naquele local houve várias
ignições simultâneas, o que levantou suspeitas: “Quando há mais do que um foco
de incêndio na mesma zona, estamos perante um indício de fogo posto”.
Desde o início do ano até ontem, a PJ já deteve 50 suspeitos
de atearem fogo, dos quais 25 ficaram em prisão preventiva – mais do que em
todo o ano de 2012, em que 17 incendiários foram sujeitos a esta medida de
coacção, e de 2011, que totalizou 14.
“Não só pela quantidade de ignições, mas dada a gravidade da
situação, os juízes estarão mais sensibilizados para esta problemática”,
observa Rui Almeida, que prevê que, a este ritmo, venham a ser detidos mais
incendiários do que no ano passado, em que foram apanhados 60 suspeitos, o
número mais alto desde 2008.
Leia mais na edição impressa do SOL, hoje nas bancas
O presidente do Tribunal Constitucional, Joaquim Sousa
Ribeiro, iniciou a conferência de imprensa de ontem com uma longa explicação
sobre o regime de férias dos juízes
Juízes do TC garantem emprego para a vida
30/08/13 00:22 | António Costa in Diário Económico
Aí está o maior risco à competitividade do País, à saída da
crise: a decisão de sete juízes do Tribunal Constitucional que chumbaram a
possibilidade de despedimento na Função Pública.
Os trabalhadores do Estado estão protegidos de uma crise
económica e financeira, da incapacidade do País de pagar um Estado pesado, no
fundo, têm emprego para a vida, estão protegidos da realidade. O Estado tem,
primeiro, de ir à falência.
Mais uma vez, a leitura dos juízes do Tribunal
Constitucional não é apenas restritiva, é mesmo completamente subjectiva e, por
isso, não colhe a tese de que esta lei viola a Constituição. Não, viola a
leitura que estes juízes em concreto, neste momento histórico, têm da lei
fundamental. Os juízes do TC garantem um emprego para a vida no Estado e, com
esta decisão, aceleram o desemprego para a vida no sector privado. É a
‘virtude' desta decisão.
Vamos por partes: os juízes do TC consideram que a lei da
requalificação e a possível, diria até provável, consequência, isto é, o
despedimento ao fim de 12 meses, põe em causa o princípio da confiança,
garantido em 2008 quando entrou em vigor um novo regime de trabalho no Estado.
Porquê? Porque, à data, o Governo e a maioria parlamentar que o suportava, à
esquerda, prometeu a segurança no emprego e, segundo os juízes, já se sabia que
existiam restrições orçamentais. Importa-se de repetir? Portanto, para os
juízes do TC, nada mudou entre 2008 e 2013. Sim, mudou muito, na realidade, e
que o digam as centenas de milhares de pessoas que, desde então, caíram no
desemprego. Não mudou para os juízes, sim.
Com esta decisão, o despedimento na Função Pública fica,
para sempre, vedado, e é bom que os portugueses que trabalham no sector privado
entendam bem o que se considera afinal a necessidade de igualdade no Estado, o
famoso artigo 13º da Constituição que, há menos de um ano, foi invocado
precisamente pelos juízes do TC. É sempre bom manter a (in)coerência.
Decorre daqui que os juízes do Constitucional - e não a
Constituição, diga-se - consideram que as razões financeiras não são
suficientes para reduzir efectivos na função pública, claro, os que entraram
após 2009. Aceitaria que exigissem uma clarificação das razões que justificam
escolher o trabalhador A em detrimento do trabalhador B, aceitaria até que
exigissem, em complemento, uma garantia de não contratação de novos trabalhadores
para as mesmas funções por um período mínimo, de quatro anos, por exemplo, a
duração de uma legislatura. Seria, sim, aceitável, para blindar estas decisões
de interesses partidários e aparelhísticos, mas como é que é possível que as
razões económicas e financeiras não sejam a maior das razões!? Especialmente se
são os contribuintes a financiar o Estado, porque o Estado somos todos nós.
Este é, claro, mais um tiro na credibilidade do Governo, não
há como escapar a isso. Por duas razões, a menor das quais a financeira. Esta
lei ‘valia' 167 milhões de euros em 2014, e o Governo terá duas alternativas:
acomodar o acórdão dos sete juízes e manter um regime de requalificação que
permita a mobilidade e, no limite, a permanência para sempre dos funcionários
nesse regime, com o respectivo corte salarial. E, para os funcionários públicos
que entraram posteriormente a 2009, especificar as razões para o despedimento
na Função Pública.
O pior dos problemas é político, porque que esta decisão
prenuncia o que poderá seguir-se com diplomas relevantes de reforma do Estado,
ou melhor, de corte de despesa pública, a um mês da chegada da ‘troika' a
Portugal para a oitava e nona avaliações. Éum bom cartão de visita, sim senhor.
Maioria acredita que Governo tem margem
para ultrapassar chumbo
Por Ana Rute Silva, Luís Villalobos e Sofia
Rodrigues
Tribunal Constitucional dá razão a Cavaco Silva e trava lei que abria portas
a despedimentos na função pública. Passos Coelho pode insistir na solução
A maioria PSD/CDS recebeu a decisão do chumbo do
Tribunal Constitucional (TC) ao novo regime de mobilidade na função pública como
um "forte contratempo" face aos compromissos que o Governo assumiu com a troika,
mas deu sinal de que o executivo ainda pode insistir na proposta. O próprio
Presidente do TC, Joaquim Sousa Ribeiro, sublinhou que o tribunal não proibiu a
redução de efectivos no Estado, embora "não por este meio".
O tom de prudência dominou as reacções do PSD e do CDS e até do próprio
primeiro-ministro, Passos Coelho, que recusou falar sobre o assunto no Caramulo,
onde se encontrava para acompanhar a situação dos incêndios. O vice-presidente
do PSD, Marco António Costa, assumiu que o partido discorda da decisão e que é
um "forte contratempo", mas assegurou que o "Governo irá encontrar soluções
adequadas para ultrapassar mais esta dificuldade". O CDS, pela voz de João
Almeida, reconhece que o chumbo "limita a margem do Governo", mas sublinha que
"é preciso encontrar uma solução" que respeite a interpretação do TC e que
permita poupanças" tendo em conta que "o regime da mobilidade não é novo" nem
ficou posto em causa com esta decisão.
O TC chumbou todas as normas do novo sistema de requalificação na função
pública postas em causa pelo Presidente da República e que, pela primeira vez,
abria portas a despedimentos dos trabalhadores mais antigos.
O diploma previa que os funcionários públicos que entrassem para o mecanismo
de requalificação pudessem permanecer neste regime de mobilidade apenas por um
período de 12 meses. Findo o prazo, e sem ter direito a qualquer remuneração, ou
optavam por esperar por uma eventual colocação, ou cessavam o contrato de
trabalho. Os juízes do Palácio de Ratton recusaram os motivos invocados pelo
executivo para justificar o fim do vínculo à função pública: nesta espécie de
bolsa de excedentários seriam colocados os trabalhadores de serviços em
reestruturação/fusão (e que por isso ficariam com trabalhadores a mais), os
serviços que sofrem cortes nas transferências de verba do Orçamento do Estado,
os que têm quebras de receitas próprias ou, ainda, os que precisam de
requalificar trabalhadores.
No acórdão lê-se que estas normas do Decreto 177/XII criam "novos motivos" de
cessação de contrato na Administração Pública, "por violação da garantia de
segurança no emprego e do princípio das proporcionalidade, constantes dos
artigos 53º e 18º, nº2" da Constituição. O presidente do TC, Joaquim Sousa
Ribeiro, esclareceu que em causa estava a manutenção do emprego: "Algo de muito
mais contundente, de muito mais agressivo para o direito à segurança." Sendo
"esse efeito tão agressivo para o direito constitucionalmente tutelado, seria
necessária uma definição minimamente precisa dos motivos que podem levar a esse
processo de requalificação, que pode finalizar no despedimento", disse. Para o
TC, essa exigência não estava cumprida. Despedimentos por outra via
Sousa Ribeiro fez questão de deixar claro que o tribunal não diz que não
"podem ser diminuídos efectivos da Administração Pública" por justa causa.
"Nunca o disse e não o diz neste acórdão", sublinhou. "Simplesmente, o que diz é
que não pode ser por este meio. Foi essa a razão que conduziu ao sentido da
decisão que foi tomada por maioria de seis votos em sete", afirmou (ver pág. 6).
Apenas um voto, o do conselheiro Cunha Barbosa, não foi favorável à declaração
de inconstitucionalidade.
Outra das normas da nova lei, e que também levantou dúvidas "fundadas" a
Cavaco, prende-se com a violação do "princípio de confiança" dado aos
trabalhadores admitidos antes de 2008 no regime de mobilidade implementado pelo
anterior Governo de José Sócrates, e que os salvaguardava de uma situação de
despedimento. O actual executivo queria revogar este artigo mas o TC entendeu
que o Estado, ao dar essa garantia, gerou uma "confiança reforçada dos
trabalhadores". Neste caso, não houve dúvidas no Palácio de Ratton e a opção
pelo chumbo foi unânime.
O desfecho ao pedido de fiscalização preventiva feito pelo Presidente da
República terá implicações nos objectivos de poupança do Governo, acordados com
a troika. Em termos de cortes na despesa, o Governo previa uma poupança
de 48 milhões de euros com a requalificação já este ano, de acordo com os dados
do FMI referentes à 7ª avaliação da troika. Depois, olhando para 2014, e
se o Governo não conseguir contornar o chumbo do TC, em causa estão mais 119
milhões em termos anuais, só através da requalificação.
Cortes por resolver
Além disso, resta saber quais os impactos da decisão do TC em outra medida da
reforma do Estado que afecta a função pública, o programa de rescisões por mútuo
acordo, cujo impacto está avaliado em 252 milhões anuais com efeitos a partir de
2014.
Sem a possibilidade de perderem o vínculo ao Estado através da entrada em
vigor da requalificação, alguns trabalhadores que estivessem a avaliar a sua
saída a partir de domingo poderão agora pensar de outra forma. Ou seja, parte
deste valor poderá ser afectado. Este é o terceiro chumbo que o TC dá a medidas
do Governo ligadas à austeridade, e o segundo este ano.
Depois de em 2012 ter apontado desigualdades no corte dos subsídios feito
apenas ao sector público, em Abril deste ano o TC declarou inconstitucionais
quatro normas do Orçamento do Estado para 2013, com destaque para os cortes dos
subsídios de férias aos funcionários públicos, aos reformados e pensionistas, e
as contribuições nos subsídios de doença e de desemprego. Estas últimas acabaram
por ser reintroduzidas pelo Governo após pequenas alterações no universo de
beneficiários abrangidos, mas o certo é a inconstitucionalidade, com efeitos
retroactivos, teve um impacto de 1300 milhões.
O buraco no OE, quando decorria a 7ª avaliação da troika, levou a
medidas alternativas, como a aceleração dos cortes na função pública. Pouco
depois, o ministro das Finanças, Vítor Gaspar, demitiu-se e o governo de
coligação esteve por um fio. Agora, quando ainda nem começou a 8ª avaliação da
troika (em Setembro), o Governo é confrontado com novos obstáculos no
momento em que ultima o Orçamento do Estado para o ano que vem. Desta feita, a
clarificação surge antes da sua divulgação e entrada em vigor.
No entanto, o TC deverá avaliar ainda uma outra medida ligada às poupanças
com a função pública que fazem parte do plano de consolidação que o Governo
negociou com a troika após os abalos de Abril. A lei que aumenta o
período de trabalho dos funcionários públicos em cinco horas semanais foi ontem
publicada em Diário da Republica e entra em vigor a 28 de Setembro. Mesmo
assim, não deverá escapar ao crivo do TC: os partidos da oposição preparam-se
para pedir a fiscalização sucessiva.
Londres e Washington esperam pelo menos pelas conclusões dos inspectores da
ONU que amanhã regressam - um dia mais cedo do que o previsto - e apresentam
resultados preliminares
Exigências de provas e votações no Parlamento: o
fantasma da guerra no Iraque deixou consequências e uma delas é as dificuldades
do primeiro-ministro britânico, David Cameron, e do Presidente norte-americano,
Barack Obama, para levarem a cabo uma intervenção militar na Síria, mesmo que
circunscrita a um ataque aéreo.
Há dias, declarações vindas dos dois lados faziam pensar que a intervenção
estaria por dias. Mas oposição e pedidos para provas e para que os inspectores
da ONU acabem de fazer o seu trabalho - feitos inclusivamente pelo
secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon - levou os dois líderes a adiarem a acção,
que segundo a imprensa dos EUA, teria estado planeada para ser levada a cabo
antes da saída de Obama para uma viagem ao estrangeiro, na terça-feira.
A primeira dificuldade surgiu em Londres, com Cameron a admitir duas votações
sobre a questão - uma sobre o princípio de um ataque, ontem, e outra sobre a
acção em concreto, já depois de serem conhecidos os resultados da investigação
dos peritos da ONU, o que deverá acontecer já amanhã.
Os peritos da ONU não vão, no entanto, dizer nada sobre quem poderá ter
cometido os ataques. A sua missão é apenas verificar se houve de facto ataques
com armas químicas, e que tipo de armas foram usadas.
Horas depois de Cameron admitir uma segunda votação na Câmara dos Comuns,
Obama falava pela primeira vez sobre o assunto após o ataque da semana passada
num subúrbio de Damasco que provocou a intenção de um ataque. Mas contrastando
com o tom do seu secretário de Estado John Kerry, que na semana anterior tinha
afirmado claramente que os ataques não podiam ficar impunes, o Presidente dos
EUA afirmou não se ter ainda decidido por um ataque, numa entrevista ao programa
Newshour da estação pública PBS. Repetiu a conclusão de que foi o regime
de Assad a levar a cabo os ataques - esperava-se para ontem que os EUA
divulgassem as provas que dizem ter -, mas concluiu: "Se realmente decidirmos
que o uso de armas químicas tem de ter repercussões, o regime de Assad receberá
um sinal muito forte de que é melhor não o fazer outra vez." Obama falou ainda
no tipo de ataques, "decisivos mas muito limitados", garantiu.
Também no debate no Parlamento Cameron tentou convencer a sua oposição
explicando que "não se trata de uma invasão, não se trata de mudança de regime
ou de trabalhar de modo mais próximo com a oposição". "Isto tem a ver com o uso
em larga escala de armas químicas e a nossa reposta a um crime de guerra - mais
nada."
Tentado aplacar os críticos antes da votação, o Governo tornou públicos dois
documentos, um sobre o que disse a comissão de informação e serviços secretos
sobre a provável autoria do ataque químico e outro sobre a base legal de um
ataque à Síria sem o aval do Conselho de Segurança da ONU.
Sobre o ataque da semana passada, a comissão de informação diz: "Um ataque
químico ocorreu em Damasco na manhã de 21 de Agosto, resultando em pelo menos
350 mortes. Não é possível que um ataque desta escala tivesse sido levado a cabo
pela oposição. O regime usou ataques com armas químicas no passado numa escala
semelhante em pelo menos 14 ocasiões. Aqui está alguma informação que sugere a
culpabilidade do regime neste ataque. Estes factores fazem com que seja
altamente provável que o regime seja responsável." A única dúvida, terminava a
comissão, era qual teria sido "a motivação precisa do regime para levar a cabo
um ataque a esta escala nesta altura".
O relatório acrescenta ainda que "não há provas credíveis de que qualquer
grupo da oposição tenha usado armas químicas", acrescentando que embora "alguns
continuem a procurá-las, nenhum tem actualmente a capacidade de levar a cabo um
ataque com armas químicas nesta escala".
Sobre a questão legal, o Executivo britânico defende que mesmo sem
autorização do Conselho de Segurança (que ninguém espera que venha a existir,
por causa da oposição da Rússia), é possível levar a cabo um ataque. Explicou a
base legal para uma acção neste caso: a doutrina da "intervenção
humanitária".
Seria preciso que se cumprissem três condições: provas credíveis, e aceites
pela comunidade internacional em geral, de um sofrimento humano em larga escala,
precisando de alívio urgente e imediato; que seja objectivamente claro que não
há uma alternativa praticável ao uso da força para que sejam salvas vidas; e que
o uso da força seja o necessário e proporcional ao objectivo. O Governo defende
que todas as condições podem ser cumpridas neste caso.
Nos EUA, também há membros do Congresso a expressar alguma irritação por
terem a sensação de que Obama planeará um ataque sem aprovação dos deputados,
diz o New York Times. E, como Adam Smith, democrata de Washington, a
expressarem o temor de que uma intervenção limitada se transforme numa operação
prolongada de consequências imprevisíveis.
Esperava-se que ontem os Estados Unidos tornassem públicas as provas
adicionais que dizem ter sobre os ataques químicos de quarta-feira na região de
Ghutta, nos arredores de Damasco, que mataram centenas de pessoas e intoxicaram
milhares de outras, o que não aconteceu até à hora de fecho desta edição.
Segundo o New York Times, poderá fazê-lo de uma forma simples - talvez
através de um mero comunicado de imprensa. Tudo para evitar a imagem teatral de
Colin Powell apresentando provas, que depois se descobriu não serem verdadeiras,
da existência de armas de destruição maciça no Iraque.
De qualquer modo, depois da divulgação da informação britânica e com o que se
antecipava da informação norte-americana, parecia claro que não iria ser
apresentada uma prova definitiva da ligação de Assad ao ataque.
Cidadãos contra
Estados Unidos
Uma esmagadora maioria de 60% de norte-americanos está contra o
envolvimento militar dos Estados Unidos no conflito da Síria, revelam os dados
de uma sondagem Ipsos para a Reuters. Só 9% dos inquiridos concordam que o
Presidente Barack Obama deve "agir" para travar o regime de Bashar al-Assad. Reino Unido As opiniões sobre a participação do Exército numa missão militar na Síria
não se alteraram com as revelações sobre o ataque com armas químicas em Damasco:
40% dos britânicos é contra a intervenção. Um inquérito YouGov mostra que 50%
também rejeitam o disparo de mísseis a partir do mar Mediterrâneo. França Numa amostra de 963 pessoas auscultadas pelo instituto de sondagens CSA
sobre uma eventual intervenção das Nações Unidas na Síria, 45% manifestaram-se a
favor, 40% contra e 20% fortemente contra (desses, mais de metade descreveram-se
como simpatizantes da Frente Nacional).
Syria debate: parliament did its job when it mattered
The government has been prevented from mounting a foolish
attack, leaving the PM humiliated and Labour with great credit
Summoned back to debate the Syrian crisis, the House of
Commons distinguished itself on Thursday. It did so more because of the
political outcome than because of the quality of the parliamentary occasion
itself. What mattered most was not the many powerful speeches. What really
counted is summed up in the familiar constitutional phrase about the
legislature holding the executive to account. For that is what occurred on
Thursday. The government was prevented, by a remarkable 285 votes to 272, from
mounting a premature and foolish attack on Syria. Parliament, so often sneered
at, did its job when it mattered.
The principal loser from an extraordinary 72 hours was David
Cameron. The prime minister returned from holiday expecting that he would be
able to deliver a Commons majority for an early US-UK military assault in
response to the use of chemical weapons in Syria. Three days later, he has
failed. A combination of pressures, including public opinion, military caution,
Tory backbench uncertainty and a well-played Labour counter-strategy meant Mr
Cameron had to scale back and slow down his ambitions. But even that was not
enough. As the former army chief Lord Dannatt put it: "The public didn't
like it, and the debate has changed." Mr Cameron asked for a blank cheque,
but in the end the Commons would not even give him the note of conditional
willingness to pay in the future. Mr Cameron's instant reaction suggests he
will not be trying again any time soon.
Mr Cameron in fact gave a polished performance when he
addressed MPs at the start of the debate. But it was to no avail, and the
humiliation is a historic one. For a prime minister to lose control of a key
issue of foreign policy of this kind is an almost unprecedented failure. The
prospective missile attack on Syria is not a foreign policy moment on a par
with the Suez war in 1956, the Norway debate of 1940 or Chanak in 1922, all of
which led to the fall of 20th-century prime ministers. But it was a massive
reverse nevertheless. It is a reminder that things are different in hung parliaments
and that Mr Cameron's control of his party has been seriously weakened.
Though its own motion was also defeated, the Labour party
deserves great credit for the wiser course that parliament has now imposed on
the prime minister. Ed Miliband's speech Thursday lacked the fluency of Mr
Cameron's, but Labour's decision to stand its ground over the Syria debate was
the indispensable bedrock of the outcome. Labour's insistence that
international law and process should be at the heart of the response to the
Assad regime's probable use of banned chemical weapons should not have been
necessary. But it is a crucial victory for the multilateral rather than the
unilateral approach nevertheless. Mr Miliband should be congratulated for
insisting that Britain holds to the line of process and law. Mr Cameron's
readiness to change his approach should be noted, too. Both of them have
learned some lessons from 2003. But the Tory vindictiveness towards Labour in
the debate was a badge of honour.
The case for a more measured approach to Syria is ultimately
an argument about political effectiveness. The most important objective in the
current phase of the Syrian war is to stamp out any use of chemical weapons.
That is best achieved by making a renewed case to the nations of the world that
chemical weapons must always be beyond the pale, by establishing that a breach
of that global proscription of such weapons has occurred, and ensuring that the
international ban on them must be upheld and enforced. The world's message is more
effective when most widely supported.
Several things happened on ThursdayThursday that advanced
this process. The UK government's intelligence assessment of the reported use
of chemical weapons on 21 August is due to be followed on Thursday by a similar
but by no means conclusive assessment from Washington. The UK document admits
it struggles to find the motive but concludes it is highly likely that the
Assad regime was responsible for the deaths and poisonings in the attack on the
Damascus suburbs last week. The report of the UN inspectors will add
substantially to that pool of knowledge.
The legal position, as set out in the UK law officers'
advice published on Thursday, is that the best way of responding is under the
United Nations charter, but that there is a right to act against the users of
chemical weapons on humanitarian grounds if the UN route is blocked by a veto.
This is contested and will need to be assessed again. But these measured steps
are the right approach. Evidence first, verdict afterwards – not the reverse,
as happened over Iraq.
The debate about Syria and chemical weapons is not over. But
it feels as if a page has turned in the way such challenges are being faced.
Ten years ago, MPs were given a say over decisions to enter international
conflict. Their vote on Iraq was a great error. This week's arguments show that
some lessons have been learned. If all this results in a different kind of
British approach to conflict, more measured and more respectful of the
international order, though no less determined to uphold humanitarian and legal
values, then some real good will have come from the dilemmas with which
politicians have wrestled this week.
Elevador gratuito que liga a Baixa e o
Castelo lisboetas inaugurado no sábado
Por Lusa
A Câmara de Lisboa informou hoje que inaugura no sábado, nove meses depois da
data prevista inicialmente, o novo elevador da Rua dos Fanqueiros, para
facilitar a ligação, gratuita, entre a Baixa e Costa do Castelo.
Para subir da Baixa ao Castelo de São Jorge,
lisboetas e visitantes vão poder, a partir de sábado, apanhar o elevador no
edifício recuperado dos números 170/178 da Rua dos Fanqueiros e sair no Largo
Adelino Amaro da Costa (Largo do Caldas). Depois, daí subir no elevador
panorâmico do antigo Mercado do Chão do Loureiro, concluído em 2011, até à Costa
do Castelo.
Este novo elevador insere-se no chamado "Percurso de
atravessamento pedonal, assistido por meios mecânicos de elevação, da Baixa ao
Castelo de São Jorge" e, segundo a Câmara de Lisboa, tem como objectivo
"articular as diferentes cotas entre colinas, segundo uma estratégia que,
facilitando a subida, ajuda também revitalizar e a requalificar a envolvente a
este caminho".
Em Fevereiro de 2012, na altura da assinatura para o auto
de consignação para a recuperação dos dois edifícios para albergar o elevador, o
presidente da Câmara de Lisboa admitiu a abertura do elevador no início de
2013.
António Costa indicou que o elevador seria gerido pela EMEL
(Empresa de Mobilidade e Estacionamento de Lisboa) e pago pelos utilizadores,
tendo uma tarifa especial para moradores. No entanto, fonte municipal disse hoje
à agência Lusa que o uso do elevador será grátis e que a gestão será partilhada
entre a empresa e a autarquia.
A recuperação dos dois edifícios da Rua
dos Fanqueiros e a sua conversão em elevador rondou os 1,5 milhões de euros.
Directora da instituição disse que esta corre o risco de suspender as suas
actividades a partir de Setembro
Uma concentração em defesa da Cinemateca Portuguesa – Museu do Cinema está a
ser convocada através de uma página na rede social Facebook para sexta-feira, às
19h, na sequência dos problemas financeiros que a instituição atravessa. A
directora da Cinemateca, Maria João Seixas, disse ao PÚBLICO no passado dia 20
que a partir de Agosto “a Cinemateca não pode avançar”devido a esses problemas
de tesouraria.
A
concentração agendada para amanhã e que está a ser divulgada através do Facebook
descreve-se como uma iniciativa “cívica e apartidária de cidadãos que amam o
cinema” e que ”reivindicam o não encerramento da Cinemateca Portuguesa”, que
associam a um “importante serviço público de difusão e preservação da arte
cinematográfica e, em especial, do cinema português”.
Os organizadores da concentração frisam a importância da “manutenção do Museu
do Cinema, do seu serviço educativo através da Cinemateca Júnior, da sua
biblioteca especializada e do ANIM - Arquivo Nacional de Imagens em Movimento,
entidade que é única no trabalho de conservação e restauro do património
cinematográfico nacional”.
A Secretaria de Estado da Cultura
mantém
em comunicado que “a Cinemateca Portuguesa – Museu do Cinema e o ANIM não vão
fechar. Independentemente de quaisquer circunstâncias, as medidas para garantir
o funcionamento da Cinemateca estão a ser asseguradas”, sem adiantar esta
quinta-feira mais pormenores.
Os
problemas financeiros que a Cinemateca ultrapassa são do conhecimento da
tutela desde Abril, segundo Maria João Seixas, tendo sido accionadas “dotações
extraordinárias” do Fundo de Fomento Cultural em Junho e Julho (400 mil euros no
total) para solucionar esses problemas. Mas em Agosto não surgiram verbas para
compensar os problemas administrativos e financeiros da instituição, causados
pelas quebras nas receitas publicitárias das televisões – os anunciantes são
obrigados por lei a pagar uma taxa de 4% sobre a publicidade exibida nos canais
de televisão e 20% do total dessa taxa destina-se ao financiamento da Cinemateca
e do ANIM – mas também à perda de autonomia financeira e de gestão das
instituições.
Além da concentração agendada para
sexta-feira, na véspera do final do mês e com a programação de Setembro
delineada na instituição, existe ainda uma petição online
em defesa
da Cinemateca que tem também como objectivo que o tema seja discutido na
Assembleia da República e que já ultrapassou as 4000 assinaturas – o número
necessário para cumprir os requisitos para ser debatida no Parlamento.
Cinemateca, património e criação
Por Fernando Mora Ramos
A paralisia iminente da Cinemateca, agora revelada
mas há muito conhecida, é um problema comum às áreas artísticas como resultado
da aplicação de uma política apenas de cortes e orçamental que, na cultura, tem
sido e é destrutiva. Há outras formas de fazer política cultural, uma nova
fiscalidade específica, um novo mecenato, uma clara definição do que é o serviço
público e suas articulações programáticas com as entidades de criação sem fins
lucrativos, um programa vasto de reforma do sector público que não apenas a de
um falso controlo da despesa - sempre que na gestão destas coisas inventam a
pólvora concentrando administrações, gastam mais com medidas que só complicam
(despesismo) o que funcionava simples e coerente.
Não existe política cultural porque não existe ministério. Essa inexistência
é, em si, a política - o mais ridículo é não existir secretaria de Estado,
havendo um secretário de Estado junto ao primeiro-ministro (sem acesso ao
Conselho), sinal que se exibe como uma distinção operativa mas que não é mais
que um adorno. Assim como se criou o ministério, e chegou mesmo a existir porque
tinha um programa, assim se destruiu, transformando-se o que foi identificado
como áreas de responsabilidade, programa, em gestão diária e casuística do que
emerge como problemático: um dia o comendador Berardo, outro dia a Cinemateca,
num outro, o Museu dos Coches, todos os dias o património em estado de abandono,
anualmente as capitais europeias a descapitalizarem no dia seguinte ao do prazo
oficial de vida, e de modo mais invisível, a vida cultural e artística dos
interiores: as pequenas estruturas de criação, teatros e museus, festivais e
programações regulares não-comerciais que transformavam o pouco que recebiam no
muito que davam a conhecer e fruir, criando vida onde o Estado só desertifica,
sufocam.
O projecto deste Governo começou pela subalternização das disciplinas
culturais e artísticas enquanto componentes estruturantes da democracia - uma
invenção saída das cinzas no pós-guerra - na medida em que a inexistência do
ministério significa não só o desprezo pela cultura como qualificação da
democracia, mas também pelo seu papel económico - contra as evidências
estatísticas recentes que, aliás, são apenas enfeite de situações
mundano-políticas. Considera-se que as actividades artísticas, numa leitura
mecânica, são antimercado, isto é, despesa não-lucrativa, a famosa
subsidiodependência - é o que chamam ao Teatro Aberto, à Cornucópia, à Paula
Rego e à sua Casa das Histórias (Fundação), ao projecto violentado de Maria João
Pires em Belgais (o problema já era este e por isso refiro-o), e a tudo o que
não seja lucro imediato (de cortar a torto e a direito) ou especulação
financeira potencial (o jogo viciante dos capitais de risco ou os negócios na
esfera público-privada), à excepção, não comprovada por uma política consequente
mas com estatuto no discurso "responsável", do património que, aliás, há que
valorizar - que tombo sem a Torre do Tombo, e que seria se a outra torre, em
Belém, fosse a discoteca ou o restaurante falados, assim à Berlusconi, esse
farol quase lusitano?
A recolocação da colecção Berardo como problema mostra a predilecção pelo
elefante branco (desde o princípio que deveria ter tido sede própria e
autonomia, reconhecido o interesse do Estado no mérito público da colecção) e só
vem comprovar que tudo o que se faz se desfaz e que o fazer do que levou anos a
construir (estruturante da democracia), não tem, para este poder, nenhum valor:
a sua democracia coincide com o desaparecimento do Estado democrático, a sua
redução a funções repressivas e a facilitação do exercício de um poder absoluto
pelos mercados sem controlo legal (a ideia do Estado-empresa é isso mesmo). Como
disse um ministro há pouco, o Estado quer desamparar a loja. A loja é toda para
o homem de novo tipo, o empreendedor, o empresário de visão, o investidor, o
criador de produtos transaccionáveis... Para o Estado fica a actividade
não-lucrativa, assim se controla a dívida, aliás o Estado não necessita de
redistribuir a riqueza comum, os privados, é sabido, fazem isso melhor...
Ao longo dos anos, o Estado, mal governado pelos então já poderosos gestores
(o dr. Cavaco é o exemplo acabado, o "país de doutores" foi-se com o papel
selado), parece vocacionado para possuir uma infindável colecção de elefantes
brancos (não estão em vias de extinção) e de cada vez que faz uma obra (CCB,
Museu dos Coches agora, e tantos exemplos no interior do país) não acautela que
à obra corresponda um programa - em Portugal, a decisão começa na obra, depois
inventa-se o programa, o que faz com que grandes logísticas iniciem a sua "morte
física" (morrem do que são) no dia seguinte às inaugurações, na medida em que
não há modos úteis de as habitar, vida própria como programa. Os exemplos
abundam e a dança dos edifícios não é muito distinta da que gerou auto-estradas
(de programa fácil e falhado) em que viajamos solitariamente, ou da dos estádios
de futebol... - imaginam a Igreja a multiplicar Santuários de Fátima?
O que resta da administração pública da cultura tem como função tirar o
Estado das suas responsabilidades culturais democráticas, sejam patrimoniais,
sejam nos domínios da criação - uma das invenções do pós-guerra foi a inclusão
da cultura e dos patrimónios nas funções programáticas do Estado democrático
como resposta à barbárie nazi. A memória de um país, seja a pedra, sejam
imagens, pintura, escultura ou cinema, teatro e as criações artísticas
contemporâneas, não é uma questão do Estado se o Governo não concebe a cultura
como um programa político na medida das consignas constitucionais do acesso à
criação e fruição culturais. Mas não o fazer é, desde logo, desqualificar a
democracia, impedindo as maiorias (e minorias) de aceder a formas de liberdade
pública que as linguagens das artes são enquanto conteúdos da liberdade
artística e da própria liberdade, o que só poderá acontecer com o reconhecimento
íntegro da cidadania artística. A desqualificação da democracia e o seu
empobrecimento são o desígnio de uma política que destrói o fenómeno cultural,
identificada tão-só com a redução da despesa pública. Para as "elites
novo-ricas" e para os velhos ricos de sempre, trata-se de garantirem a
operacionalidade do sistema que estrutura a desigualdade, agora mais funda,
protegendo os seus interesses contra o interesse de todos e os direitos
universais. O orçamento, um qualquer, é estruturante da economia, a economia
será, ou não, estruturante da democracia. Democracia é uma palavra prostituída,
tão usada é pelos seus inimigos. Ao que parece economia, por via de um culto que
a celebra como um totem verbal, não. É o tabu que faz o totem pela repetição -
"é a economia, estúpido", diz-se e a realidade submete-se-lhe, como se a
economia fosse um projecto inevitavelmente antidemocrático: é o caso da
austeridade, esse modo de concentração da riqueza nos especuladores e da
redistribuição da miséria, no lugar da riqueza, através do desaparecimento das
funções democráticas do Estado, pela maioria da população.
Museu reabriu em Abril, depois de renovado, e já tem um peso maior no PIB
e atrai cada vez mais turistas a Amesterdão
Quando um país europeu como a Holanda investe 375
milhões de euros na renovação do seu museu nacional, um dos mais importantes do
mundo, não tenciona tirar dele dividendos meramente culturais. O impacto que uma
instituição como o Rijksmuseum tem na economia é assunto sério e merece, por
isso, ser analisado ao pormenor. Foi precisamente o que fizeram agora os seus
responsáveis através da consultora Booz & Company, cinco meses após o museu
ter reaberto depois de dez anos de obras que transformaram por completo esta
casa que é também a de pintores como Rembrandt, Vermeer, Frans Hals e Mondrian.
Num relatório que foi divulgado esta quarta-feira, a firma de consultoria
estima que o Rijksmuseum venha a revelar um impacto económico de 235 milhões de
euros até ao final de 2013, 80% dos quais devido a um aumento muito
significativo do seu número de visitantes. Até ao encerramento para obras, o
museu recebia em média 923 mil visitantes por ano (70% estrangeiros), mas em
2013 e 2014, prevê-se que venha a receber 1,5 e 1,7 milhões respectivamente. O
número deverá estabilizar nos 1,5 milhões/ano no triénio 2015-2017, o que
permitirá ter um orçamento equilibrado.
A equipa do museu está confiante no crescimento de público porque, entre a
data da reabertura (13 de Abril) e o dia 23 de Agosto, um milhão de pessoas
percorreram as magníficas galerias de exposição. Uma tão grande afluência de
público em quase cinco meses pode ser explicada pelo factor novidade, mas é
também um reflexo da curiosidade e interesse que a instituição desperta.
Para Wim Pijbes, o seu director, não há dúvidas: "É agora evidente que o
investimento no novo Rijksmuseum teve consequências que ultrapassam as paredes
do próprio edifício", lê-se na introdução ao relatório, co-assinada com o
vice-presidente da Booz & Company, Haein van Beuningen. "Estes resultados
provam que a velha sabedoria de Jonh Paul Getty [filantropo e coleccionador
britânico nascido nos Estados Unidos] ainda é verdadeira: as belas artes são o
mais belo investimento."
Fazer o balanço do impacto económico e social (este mais sensível porque não
depende exclusivamente de variáveis quantificáveis) do Rijksmuseum implica mexer
em múltiplas variantes. Isto porque, afinal, os visitantes do museu são
visitantes da cidade - e isso deixa os hoteleiros, donos de restaurantes e
lojas, e até a companhia aérea KLM muito satisfeitos.
Emprego e prestígio
Os museus levam à reflexão, estimulam a criatividade e o sentimento de
pertença, mas devem ser vistos também, e cada vez mais, como importantes agentes
de desenvolvimento, defende a Booz & Company num estudo que não diz respeito
apenas ao período de renovação (2003-2013), mas que se prolonga em estimativas
até 2017: "Como empregadores, e através de despesas directas e indirectas, [os
museus] têm um papel importante e quantificável na economia."
Os consultores estimam que o total combinado das despesas do Rijksmuseum
(quer nas suas actividades, quer na renovação) e a percentagem de gastos dos
turistas relacionada com o museu venha a ascender a 5,7 mil milhões de euros
entre 2003 e 2017, o que representará uma contribuição de três mil milhões de
euros para o PIB no mesmo período (uma média anual de 200 milhões de euros). "O
impacto económico do Rijksmuseum mostra claramente uma linha ascendente",
escrevem os analistas, que garantem que, pós-renovação, o contributo do museu
para o PIB pode vir a aumentar de forma estável 90 milhões de euros (80% deste
valor resulta de uma maior despesa dos visitantes).
O impacto económico mede-se, também, pelas possibilidades de trabalho geradas
no museu e no turismo com ele relacionado. Contas feitas mostram que, em média,
durante os dez anos de renovação o Rijksmuseum criou o equivalente a 2600
oportunidades de emprego a tempo inteiro, um número que, pós-reabertura, deverá
estabilizar nas 3700.
Mais difícil de avaliar, mas igualmente importante, é o seu impacto social.
Além de ter elevado os padrões de qualidade das instituições culturais de
Amesterdão, nomeadamente no que respeita à investigação científica, o renovado
museu aumentou a capacidade da cidade de atrair visitantes holandeses e
estrangeiros: em termos domésticos, contribui para um reforço identitário,
transformando-se naquilo a que os analistas chamam já um "ícone da nação"; a
nível internacional, reforçou o prestígio da principal colecção de arte e
história do país, colocando o Rijksmuseum na rota dos museus que é obrigatório
ver.
"A pesquisa internacional sugere que os grandes museus como o Rijksmuseum são
elementos cruciais no bem-estar económico e social de uma cidade. Mas fazem
muito mais do que isso", diz, citado pelo museu, Tony Travers, director de um
centro de investigação ligado à London School of Economics, invocando cidades
como Londres, Paris e Nova Iorque. "Amesterdão, tal como outras grandes cidades
europeias, precisa de ser flexível e de se reinventar se quer continuar a atrair
negócio, turismo e talento criativo." É por isso que, defende, "o Rijksmuseum
contribui de muitas maneiras para o futuro económico e cultural da cidade e do
país".
Dez Anos Depois ... Reabertura do Rijksmuseum, por António Sérgio Rosa de Carvalho. 12/4/2013
Finalmente !! Depois de 10 anos de Obras/ Restauro, o Rijksmuseum em Amsterdão, abre as suas portas.( Abertura Oficial a 13 de Abril )
Hoje, é a abertura/ preview para o "mundo" dos Historiadores de Arte/ Arquitectura, da Cultura e dos Museus ... e vou estar presente.
Acima de tudo ... fascinante e possível fonte de inspiração e de Pedagogia para a nossa Classe Arquitecta, sempre obcecada em deixar assinaturas pessoais e "reintepretar" Património Arquitectónico, reduzindo e depurando as características históricas dos Interiores dos Monumentos ... é a Filosofia de Intervenção e Renovação aplicada na cuidada intervenção.
Assim, Antonio Cruz en Antonio Ortiz, Arquitectos de Sevilha foram precisamente escolhidos pelas suas características altamente respeitadoras do Património Arquitectónico e sua sensível capacidade de contextualização.
O fabuloso edifício de Pierre Cuypers tem 125 anos ( 1885.)
Pierre Cuypers foi o Viollet-le-Duc holandês. Ele constitui a manifestação Holandesa do "Gothic Revival" e a sua vasta obra ilustra as "encruzilhadas" dialécticamente "renovadoras" de uma tradição internacional mista de Identidade Religiosa/ Arts and Crafts/ Gothic Revival, comparável a Pugin, Ruskin e George Gilbert Scott em Inglaterra e Viollet-le-Duc em França.
A filosofia de Restauro foi determinada pela vontade de eliminar acrescentos posteriores à pureza do Projecto Original de Cuypers e de restaurar os fabulosos interiores e a sua magnifíca Policromia Neo-Gótica.
António Sérgio Rosa de Carvalho.
Rijksmuseum Amsterdam ca 1895
O Director à espera da Ronda da Noite de Rembrandt.
Este famoso quadro vai ficar exactamente no mesmo sítio planeado por Cuypers.
O Centro estratégico do edifício.
A intervenção seguiu o Princípio : "CONTINUAR COM CUYPERS"
Continue with Cuypers
A fabulosa e intacta Biblioteca, agora completamente Restaurada/Visitável
Inteligentemente e de forma absolutamente respeitadora os Arquitectos "libertaram" os dois páteos intermidiários , criando dois Fóruns/ Vestibulos de Distribuição e de lazer/contacto-social, com cafetaria e largueza de espaço e perspectiva.
Curiosamente toda a Intervenção ilustra uma "Victória" do Século XIX sobre o Modernismo ... ou ... uma "inversão dialéctica" do curso da História.
Um "sinal dos tempos" numa Europa em plena crise Económica com Outros Sentimentos e Ansiedades Civilizacionais, em busca de uma Identidade mais profunda ? António Sérgio Rosa de Carvalho.