VÍDEO: "Depois vais-me buscar para levar para
casa." As compras pessoais de Margarida Martins num carro da junta
A SÁBADO filmou e fotografou a recandidata à Junta de
Freguesia de Arroios nas suas compras pessoais (sem pagar) ao sábado. Um carro
da junta e um fiscal vão buscá-la e levá-la a casa. A Segurança Social
reclama-lhe €47 mil e penhorou-lhe salário e casa. Fernando Medina reitera que mantém
confiança pessoal e política.
LISBOA
Margarida Martins é arguida por suspeitas de peculato e
abuso de poder na Junta de Arroios
Gestão da ex-autarca Margarida Martins é alvo de uma
investigação a alegados crimes económico-financeiros e de usufruto pessoal de
bens públicos.
João Pedro Pincha
e Ana Henriques
27 de Outubro de
2021, 11:46 actualizado a 27 de Outubro de 2021, 18:27
A ex-presidente
da Junta de Freguesia de Arroios, Margarida Martins, foi constituída arguida
por suspeitas de ter cometido crimes de peculato e abuso de poder no
exercício de funções públicas, confirmou ao PÚBLICO o seu advogado Ricardo Sá
Fernandes.
A Polícia
Judiciária esteve esta quarta-feira a fazer buscas na junta de Arroios, em
Lisboa, no âmbito de uma investigação a alegados crimes económico-financeiros e
de usufruto pessoal de bens públicos que terão ocorrido durante os mandatos de
Margarida Martins, a ex-autarca socialista que perdeu as eleições a 26 de
Setembro.
As diligências
estiveram a cargo da Unidade Nacional de Combate à Corrupção daquela polícia
criminal, que procedeu à execução de dez mandados de busca — três
domiciliárias e sete não domiciliárias — e realizou uma busca autorizada,
visando a recolha de documentação relacionada com suspeitas de práticas
criminosas, informou o Ministério Público (MP) em comunicado na tarde desta
quarta-feira.
O inquérito
judicial é conduzido pelo Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de
Lisboa, que está a investigar factos que podem constituir crimes de peculato,
peculato de uso e participação económica em negócio.
De acordo com
informações recolhidas pelo PÚBLICO, as buscas estarão sobretudo relacionadas
com dois processos que há muito levantavam dúvidas na freguesia. Por um lado, a
compra de cimento em doses consideradas excessivas. Por outro, a contratação de
empresas para a manutenção de espaços verdes.
Neste último
caso, o Tribunal de Contas enumerou várias ilegalidades num relatório de
Outubro do ano passado. A junta dividiu os espaços verdes da freguesia por dois
lotes, o que os juízes consideraram ser uma estratégia para fugir à
necessidade de concursos públicos, e fez contratos por ajuste directo com
várias empresas com os mesmos donos. Como o PÚBLICO revelou, antes de celebrar
esses contratos, a autarquia fez consultas ao mercado que apenas envolviam empresas
do mesmo grupo. A auditoria do Tribunal de Contas seguiu para o Ministério
Público.
Ao PÚBLICO,
Ricardo Sá Fernandes confirmou que os assuntos sob investigação se remetem
aos factos já apreciados pelo Tribunal de Contas. O processo é referente a
2018, tendo o mandado de busca sido emitido a 15 de Outubro pelo juiz Carlos
Alexandre.
Já o chamado
“caso dos cimentos”, como ficou conhecido nos meandros autárquicos da capital,
diz respeito à compra deste material em quantidades muito superiores às
necessidades. O caso, que começou por ser noticiado pelo Expresso,
remonta a 2017, quando o segundo executivo de Margarida Martins tomou posse e
começou a ver aparecer sete orçamentos por pagar a uma empresa de materiais de
construção. O valor das compras foi considerado anormal, mas as facturas foram
pagas, o que gerou mal-estar entre os eleitos e foi um dos motivos que levaram
à demissão de três vogais no fim de 2018.
Depois de ter
feito um inquérito interno que apontava falhas no controlo de compras, a junta
fez queixa ao Ministério Público, suspeitando de que houvera conluio entre um
funcionário e a empresa de materiais, mas o inquérito judicial acabou por ser
arquivado com críticas à própria autarquia. No despacho de arquivamento, o
procurador acusa-a de “descontrolo nos procedimentos”, pois “não existia
qualquer confrontação dos materiais, valores e quantidades com as obras e
arranjos efectivamente realizados”. Os eleitos da assembleia de freguesia
pediram a reabertura da investigação.
Margarida Martins
foi presidente da Junta de Freguesia de Arroios entre 2013 e 2021. A poucos
dias das eleições deste ano, a revista Sábado divulgou uma investigação
que mostrava a autarca a fazer compras pessoais no Mercado 31 de Janeiro com
recurso a um carro e a funcionários da junta. Candidata a um terceiro mandato
pelo PS, a ex-dirigente da Abraço acabou derrotada por Madalena Natividade, da
coligação Novos Tempos (PSD/CDS), que tomou posse na semana passada.
Ao princípio da
tarde, o novo executivo emitiu um comunicado a sublinhar que as buscas
incidiram sobre “compromissos assumidos no decorrer de anteriores mandatos” e
que “tem prestado total colaboração com a investigação em curso”.
Não é a primeira
vez que Margarida Martins está envolvida em investigações judiciais. Na edição
de 1 de Abril de 2000, o PÚBLICO dava nota de que a TVI revelara que a
Inspecção-Geral do Ministério do Trabalho e da Solidariedade detectara alegadas
irregularidades nas contas e actividades da associação Abraço, que presta apoio
a pessoas infectadas com VIH, então dirigida por Margarida Martins.
Em causa, lê-se
na notícia, estavam os elevados salários de alguns dos membros da direcção, em
particular o da presidente, e o alegado desvio de obras de arte que tinham sido
doadas à associação. Também a delegação da Madeira estava envolvida na
polémica, acusada de desvio de fundos atribuídos por instituições públicas. A
denúncia partira de um ex-coordenador daquela delegação, que era também alvo de
suspeitas.
Num artigo de
opinião publicado na mesma edição, com o título “A caça às bruxas”, Margarida
Martins negava as acusações e afirmava haver uma “conspiração” contra a
associação. com Cristiana Faria Moreira
tp.ocilbup@ahcnip.oaoj
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