Vamos
deixar morrer o comércio de proximidade?
CARLA SALSINHA
11/06/2016 – 07:30
Só
em Lisboa fecharam em média 5 lojas por dia em 2013.
Foi com profunda
preocupação que vi aprovada, em 2012, a revisão do regime jurídico
do Arrendamento Urbano e, em particular, do arrendamento não
habitacional sem qualquer participação ou, sequer, audição prévia
dos Parceiros Sociais e agentes mais representativos do setor em
causa.
O tempo
encarregou-se de comprovar que este é um regime desajustado da
realidade, incapaz de cumprir os desígnios de “promover um mercado
de arrendamento, que, em conjunto com o impulso à reabilitação
urbana, possa requalificar e revitalizar as cidades“, a que se
propusera. Só podemos esperar uma mudança quando o arrendamento não
habitacional tiver uma legislação à parte, pois as empresas vão-se
substituindo e os proprietários podem e puderam atualizar as
respetivas rendas, bem como as anteriores alterações à lei sempre
permitiram atualizações. Não me recordo de alguém alguma vez ter
negado a necessidade de atualização da lei. Apenas não deveria ter
sido colocada em discussão com o arrendamento habitacional, esse sim
que sofreu o congelamento de décadas, de outra forma o que se
esperaria era a especulação das rendas. O que de facto aconteceu.
Completados três
anos desta reforma os resultados estão à vista de todos: centros
urbanos desertificados à medida que encerram muitas das lojas do
pequeno comércio de proximidade, incapazes que foram de responder ao
aumento exponencial das rendas, a somar ao de tantos outros custos de
contexto com que se defrontam desde há longos anos.
A reabilitação e
requalificação urbanas constituem uma área de intervenção de
grande importância no reavivar das funções das cidades - são o
passo imprescindível para que se possa repovoar os centros urbanos,
reavivando o comércio tradicional e promovendo com isso a atracção
de novos negócios, mais emprego e mais turismo. Se todos concordamos
na necessidade de reabilitar as cidades, requalificar os centros
urbanos e recuperar os edifícios degradados, tanto para os
municípios como para os particulares, parece-me inegável que os
divulgados efeitos da "reentrada" no mercado de antigos
espaços não habitacionais por força desta reforma está, ainda,
muito longe de ser uma realidade. Perante a desadequação, cada vez
mais, evidente entre oferta escassa e procura crescente, os valores
de arrendamento têm vindo a subir vertiginosamente, atingindo os
níveis mais elevados de sempre, o que propicia uma rotatividade das
lojas que não me parece que beneficie alguma parte. Nos últimos
dois anos, por cada duas lojas inauguradas houve outra que encerrou.
Só em Lisboa, por exemplo, fecharam em média 5 lojas por dia em
2013. Mesmo zonas emblemáticas da cidade, como a baixa Pombalina,
apresentam índices de descaracterização e encerramento de espaços
comerciais absolutamente preocupantes.
O actual Regime do
Arrendamento Urbano veio incrementar um certo tipo de reabilitação,
virada para o turismo e para a habitação de luxo. A reabilitação
tem ficado confinada a certas zonas das cidades associadas a
processos de valorização imobiliária especulativos,
particularmente evidentes em grandes centros urbanos com crescente
potencial de atração turística, como são os casos de Lisboa e
Porto. É urgente e necessária uma revisão do Regime de
Arrendamento de 2012, já aprovada na generalidade pela Assembleia da
Republica, de medidas que funcionem como verdadeiro estímulo à
dinamização do mercado de arrendamento e sirvam de dissuasão a
mecanismos especulativos que mais não visam do que potenciar
despejos, sem resultados efectivos ao nível da reabilitação
urbana.
A cada dia que passa
mais lojas encerram e em seu lugar surgem as lojas de conveniência,
as frutarias e as lojas de brindes,. Se não protegermos o comércio
das nossas cidades, em poucos anos veremos desaparecer todas as lojas
emblemáticas que as caracterizam, que são a imagem de marca de
Lisboa, do Porto, que são os que nos distinguem de Madrid, de Paris,
de Londres, são a nossa identidade turística!
Presidente da União
de Associações do Comércio e Serviços (UACS)
Sem comentários:
Enviar um comentário