O texto realizado
pelo grupo organizador que aqui publicamos é um texto de trabalho,
aberto e em formulação. Para mais informações consulte a página
do evento no facebook.
O Estado adoptará
uma política tendente a estabelecer um sistema de renda compatível
com o rendimento familiar e de acesso à habitação própria.
Ponto 3 do artigo
65º da Constituição Portuguesa
Um grupo informal de
habitantes da cidade de Lisboa juntou-se à volta de uma preocupação
comum: a percepção de uma abrupta alteração das dinâmicas da
cidade e sobretudo da grande subida do preço da habitação.
Começaram por conversar casualmente sobre o que os preocupava. Essas
conversas tornaram-se mais regulares. As inquietações comuns
tornaram-se mote para a organização de um debate à volta do tema.
Das conversas e de alguma pesquisa foi escrito, a várias mãos, o
texto abaixo.
A grande
intensificação do turismo em Lisboa tem implicado transformações
significativas na vida de quem nela habita. Muitas são positivas,
mas o que verificamos de forma empírica é que o saldo é negativo
para a larga maioria que vive (n)a cidade. O que nos preocupa ao
ponto de nos juntarmos para propor o debate e procurar soluções, é
aquilo que consideramos ser a mais devastadora das transformações
de que falamos: o brutal aumento dos valores da habitação, com
especial incidência no centro histórico alargado da cidade de
Lisboa. Grande parte dos residentes, sem capacidade económica para
enfrentar esta subida, está a ser forçada a deslocar-se para
bairros cada vez mais periféricos. As zonas mais centrais da cidade
parecem estar a tornar-se morada exclusiva dos mais ricos e de
habitantes temporários.
É incontornável
que Lisboa vive um pico de projecção internacional; que as receitas
do turismo podem contribuir para a recuperação económica do país;
que este pode ser motor de reabilitação urbana do património
arquitectónico e contribuir para a criação de emprego. Mas a
aparente ausência tanto de uma estratégia de planeamento como da
avaliação dos seus impactos, a par da quase inexistente regulação
do processo, tem consequências avassaladoras. Urge estancar a
sangria do centro histórico da cidade e regular a actividade
turística para que sirva os interesses da cidade, de quem a habita e
de quem a visita.
De uma breve análise
da informação pública sobre o turismo em Lisboa emergem dados
reveladores: o número de apartamentos em regime de alojamento local
não pára de aumentar, tendo a Associação do Alojamento Local de
Portugal (ALEP) calculado que surjam 200 alojamentos locais por mês
em Lisboa; 40 novos hotéis têm inauguração anunciada para 2016 e
2017; milhares de pessoas compraram casa em Lisboa devido à Lei das
Autorizações de Residência para Actividade de Investimento (só de
nacionalidade francesa, calcula-se que sejam 25 mil as pessoas que
adquiriram ou arrendaram casa em Portugal). Estes dados indiciam
algumas das causas da subida de preços da habitação.
Propomos com este
texto não uma desconstrução dos processos económicos e políticos
que subjazem à emergência do turismo, mas um debate sobre os modos
de como pode este ser regulado de forma a que os que na cidade
habita(va)m, nela possam continuar a viver; ou seja, que os preços
da habitação sejam compatíveis com o rendimento familiar dos
habitantes.
Vamos começar por
traçar um panorama da situação e compará-lo com o de outras
cidades; de seguida analisar as suas causas e consequências; e por
fim propor um conjunto de possíveis medidas concretas para conter
este fenómeno.
1.Fonte: site
https://www.airdna.co. Listagens do Airbnb disponíveis em Maio de
2016
1. Diagnóstico
Ao longo dos últimos
3 anos assistimos a grandes aumentos nos preços do arrendamento e
compra de casa em Lisboa, com particular incidência no centro da
cidade. Sabendo que as transformações recentes da cidade afectam
não apenas o centro, mas implicam uma reconfiguração geral da
metrópole, vamos cingir-nos por agora a este “centro”. Contamos
posteriormente alargar a análise.
A subida do valor do
imobiliário nas freguesias mais centrais (Misericórdia, Santa Maria
Maior e São Vicente), resultante do aumento do valor de venda, foi
de 12,5% em 2013, tendo atingido os 22,3% em 2015. Contando com o
recuo de 1,3% de 2014, assistimos a um aumento de 33,5% em 3 anos. O
que não quer dizer que estas subidas se façam apenas sentir no
centro: entre 2014 e 2015 o preço da habitação para arrendamento
subiu em média 7,6% em Lisboa, quando no resto do país ficou pelos
0,8% [1]. Basta abrir o site de qualquer imobiliária para perceber o
absurdo a que chegaram os valores de arrendamento e compra, num país
em que o salário mínimo é de 530 euros: com menos de 600 euros
dificilmente se aluga um T1 e com menos de 200 mil euros é quase
impossível comprar um T2.
Em tempos de
“austeridade”, numa altura em que o rendimento da maior parte dos
residentes e trabalhadores da cidade diminuiu ou não aumentou
significativamente, esta subida de preços da habitação resulta,
parece-nos óbvio, da pressão exercida pela actividade turística,
nomeadamente através do redireccionamento da oferta imobiliária
para habitantes temporários. Pois, se é inegável que - por uma
série de razões diversas, como o refluxo do turismo e das
indústrias de serviços do Magreb e da Tunísia - Lisboa vive um
pico de projecção internacional e que o turismo tem sido apontado
como uma forma de ajudar a equilibrar a economia do país, interessa
pensar como aproveitar este pico e quais as formas de o sustentar. Ou
seja: urge pensar em todos os tipos de novos habitantes que acabam
por surgir quando uma cidade alcança a projecção que Lisboa está
a ter e no impacto que a sua vinda exerce sobre a cidade e os seus
residentes mais permanentes.
Enfrentamos um grave
problema de acesso à habitação no centro da cidade, que
evidentemente se estende aos restantes bairros da cidade.
O centro da cidade
está a transformar-se num lugar esvaziado de habitantes permanentes,
de Lisboetas (no sentido alargado e transnacional que Sérgio Tréfaut
[2] inscreveu no seu filme homónimo), com os moradores a serem
pressionados a saírem das suas casas, contratos a não serem
renovados ou subidas de rendas impossíveis de pagar.
Trajectória recente
de Lisboa
Sabemos que o centro
de Lisboa sempre foi um território partilhado por diferentes classes
sociais. É certo que os mais ricos viviam em casas maiores do que os
mais pobres, é certo que alguns bairros tinham zonas melhores do que
outras, e também é sabido que o congelamento das rendas, herdado do
tempo do Estado Novo, muitas vezes criou situações anacrónicas.
Mas concretamente o que tínhamos, até há poucos anos, era uma
situação única para uma capital: um espaço público partilhado.
Hoje caminhamos para um modelo de cidade (já temos?) exclusiva dos
turistas e dos muito ricos.
A quem acha que era
inevitável esta transformação da cidade, acompanhada pela forte
subida de preços no imobiliário, porque aconteceu em todas as
capitais, respondemos que é exactamente por sabermos que aconteceu,
e como aconteceu, que não era de todo (não é?) inevitável.
Tínhamos a experiência e conhecíamos soluções de outras cidades
que lidam com estes problemas há décadas. Eventualmente o fenómeno
do alojamento local por reserva online, que foi mais ou menos
transversal e simultâneo aos vários países, terá surgido sem
pré-aviso. Mesmo assim, várias cidades já definiram modelos de
regulação para este fenómeno, no sentido da defesa da habitação
permanente.
Aqueles que acham
que isto é um assunto do centro e dos seus moradores, lembrem-se que
os preços estão a subir na cidade toda [3], e a oferta de habitação
para arrendar a descer drasticamente. Só em 2015 houve uma
diminuição de 21% [4] na oferta de arrendamento. Se o problema
começou por ser no centro histórico neste momento é geral e
alastrou a toda a cidade.
Qual é o problema
dos habitantes saírem das zonas centrais da cidade? Estas zonas não
são melhores nem piores do que bairros menos centrais ou
periféricos, mas é aí que muitas pessoas viveram uma vida inteira,
e é esse o lugar que outros tantos escolheram para viver. Falamos de
direito ao lugar mas também de direito à cidade.
Qual é o problema
do preço da habitação subir em Lisboa? Como sabemos, uma subida
deste tipo implica uma imediata e objectiva perda de poder de compra
por parte dos habitantes da cidade.
Mas se a origem do
problema é o turismo, são as opções políticas recentes,
expressas na legislação e numa agenda de promoção turística
aparentemente sem planeamento, que estão efectivamente a contribuir
para os problemas que apontamos acima. Governo e CML continuam a
sublinhar os benefícios trazidos pela indústria do turismo, o seu
papel na dinamização do mercado imobiliário, no investimento em
reabilitação urbana, na geração de emprego e no impulsionar da
economia, ignorando, na nossa opinião, os efeitos colaterais e a sua
responsabilidade na gestão dos interesses da cidade e dos seus
habitantes. Pelo contrário, temos assistido a uma facilitação e
até mesmo incentivo das dinâmicas mais agressivas de mercado
geradas por investidores imobiliários de capacidade de investimento
impossível de acompanhar, ou superar, pela larga maioria dos actuais
residentes.
Neste sentido, o
actual executivo da CML, tem vindo a alterar a sua posição face às
políticas de habitação previstas para o centro da cidade. No caso
concreto da Baixa, por exemplo, este executivo prometeu, na campanha
do primeiro mandato, trazer jovens moradores para a Baixa e fazer
cumprir a lei dos terços (⅓habitação; ⅓ comércio; ⅓
serviços). Contrariamente a estas intenções, e até à data, as
únicas intervenções da CML na zona da Baixa de que temos
conhecimento são os licenciamentos de diversos hotéis. Apontamos
também, o Programa de Renda Acessível (PRA), apresentado pela CML o
mês passado, que prevê a construção ou reabilitação de 5 a 7
mil fogos disponibilizados a rendas controladas, mas evita as zonas
de Lisboa mais bem servidas de transportes ou serviços, onde o
imobiliário está mais valorizado.
Sabemos que a CML é,
com a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, um dos grandes
proprietários da cidade, com inúmeros edifícios no centro que têm
sido vendidos a privados. A alienação consecutiva de património no
centro, simultânea à criação de zonas habitacionais, de
iniciativa camarária, em bairros não centrais, revela um programa
para a cidade que está a contribuir para a deslocação das classes
médias e mais desfavorecidas (que aí ainda subsistem) para fora das
áreas centrais.
Paralelo com outras
cidades
Veneza, que recebe
cerca de 20 milhões de turistas por ano, é um dos casos em que não
se legislou de forma a proteger a habitação permanente e em que a
população diminuiu para menos de metade, de 120mil para 55mil, nos
últimos 30 anos. No decorrer deste processo, lojas e
estabelecimentos - inclusivamente de ensino e saúde - que davam
resposta à população local, têm vindo a ser substituídas por
espaços para compra de souvenirs e pastelarias, por exemplo. O
número de cinemas, por exemplo, desceu de 20 para 2. Sabemos que a
diminuição da população de Veneza, tal como a de outras cidades,
não se deve exclusivamente ao turismo, e que o fecho de espaços
destinados ao uso, e ao serviço, das populações locais é muitas
vezes consequência e não necessariamente a causa, de uma diminuição
significativa dos habitantes permanentes. Mas, neste momento, a
situação é “de pescadinha de rabo na boca” na qual o turismo
tem um papel central [5].
Segundo um artigo do
The Independent, alguns cientistas sociais prevêem que em 2030
Veneza não terá qualquer habitante permanente.
Em Barcelona (talvez
a cidade mais parecida com Lisboa nestas questões), a presidente da
câmara Ada Colau assinou em Julho de 2015 uma moratória para
suspender, por um ano, as licenças para hotéis e outros
empreendimentos turísticos (foram parados 45 projectos). O objectivo
foi estudar o impacto do turismo na cidade, e assim poder tomar
decisões adequadas àquela que é a situação actual da cidade.
Em Cinque Terre, em
Itália, património mundial da Unesco desde 1997 que junta cinco
pequenas aldeias, as autoridades querem limitar o número de turistas
a 1 milhão e meio por ano, diminuindo em 1 milhão as visitas de
2015. Só será possível um turista visitar a região adquirindo
bilhete.
Em França, já
desde os anos 50, foi desenhada uma estratégia de turismo
descentralizado baseado na cultura. Foram criados festivais temáticos
como o de cinema em Cannes, de fotografia em Arles ou de dança em
Montpellier, de forma a não cingir o turismo à capital ou zonas
balneares.
Lisboa, em poucos
anos, passou a ser uma das cidades mais visitadas da Europa e neste
momento a segunda mais saturada com o turismo, depois de Amesterdão.
Enquanto só se
falava de crise foi fácil olhar para as recentes transformações da
cidade como exclusivamente positivas. Agora que esse discurso deixou
de ser dominante, achamos que é urgente recentrar o debate nos
efeitos nefastos que estas transformações estão a ter sobre o
preço de habitação, e as suas consequências.
Vamos seguidamente
analisar o que acreditamos serem as causas deste fenómeno: Nova Lei
das Rendas; legislação do Alojamento local; leis dos Reformados e
Vistos Gold; licenciamento de novos Hotéis e Hostels.
2. Fonte: site
https://www.airdna.co/
2. Causas e
consequências
Nova lei das rendas
A Nova Lei das
Rendas, em vigor desde Novembro de 2012, introduziu uma série de
alterações à antiga lei do arrendamento, permitindo, por exemplo,
que um proprietário despeje os seus inquilinos, alegando obras
estruturais, tendo apenas de lhes pagar um ano de rendas como
indemnização. O que quer dizer que qualquer fundo de investimento
ou banco, pequeno ou grande proprietário, pode no seu quarteirão,
prédio ou apartamento, após realizar as obras alegadas,
transformá-lo num hotel, hostel ou apartamento(s) turístico. Isto
independentemente destes edifícios ou apartamentos terem usos
anteriores de habitação permanente.
É a combinação
desta nova lei das rendas com uma política camarária sem restrições
à atribuição de licenças a unidades hoteleiras ou alojamento
local que nos parece constituir um dos fortes motivos para a atracção
de investidores e especuladores nacionais e internacionais.
Alojamento turístico
Segundo o Arnaldo
Muñoz, director ibérico da Airbnb (maior site de alojamento local a
nível mundial), existiam em 2015 nesta plataforma, 12 mil casas
listadas na grande em Lisboa (mais 60% que em 2014) [6]. A
recentemente criada Associação de Alojamento Local de Portugal
(ALEP), afirma que nascem na capital cerca de 200 novos alojamentos
locais por mês [7].
De onde vêm estas
casas? Não sabemos quantas, mas com certeza grande parte destas
habitações saíram do mercado de arrendamento permanente.
Inicialmente, sites como o airbnb tinham como objectivo pôr em
contacto habitantes que queriam alugar temporariamente a sua casa ou
um quarto a visitantes e turistas, criando uma rede de turismo
"sustentável" numa lógica de economia partilhada.
Hoje a grande
maioria destas casas são concebidas especialmente para serem
alugadas exclusivamente a turistas. Algumas pertencem a pequenos
proprietários que com a crise largaram a sua habitação permanente,
para equilibrar as contas, outras, cada vez mais, são de médios e
grandes proprietários ou investidores. Muitas destas casas funcionam
num sistema de subaluguer.
O governo anterior
fixou o imposto sobre este tipo de arrendamento em valores muito mais
baixos do que o imposto sobre arrendamento permanente, ou seja, não
só é mais rentável alugar a turistas como se paga menos impostos.
Todos os dias chegam
notícias de outras cidades que, ao serem afectadas pela subida de
preço na habitação devido ao turismo, legislaram o alojamento
local: em Paris e Barcelona só é possível um proprietário alugar
a sua primeira morada e por um período máximo de 120 dias, em
Londres por 90 dias; e em Berlim e Nova Iorque só se podem alugar
apartamentos nos quais também morem os proprietários, ou seja, só
se podem alugar quartos, permitindo assim o acolhimento de turistas
sem a saída dos habitantes permanentes.
Em Lisboa, sabemos
que cerca de 75% dos anúncios disponíveis no Airbnb são casas
inteiras e apenas cerca de 25% são quartos. A sua localização é
mais concentrada no centro mas, como se pode ver no gráfico (e no
site https://www.airdna.co), está já disseminada pela cidade
inteira. O fenómeno do alojamento local contribui em Lisboa, como
tem contribuído em diversas cidades, para a subida dos preços de
arrendamento e para a escassez na oferta. Só a sua regulamentação
poderá alterar esta situação.
3. Reformados Gold
O Governo anterior
fez passar uma lei que possibilita a qualquer reformado europeu, que
ganhe pelo menos 2.000 euros de reforma e tenha a sua 1ª morada em
Portugal, a isenção de impostos durante pelo menos 10 anos.
Desconhecemos o
número total de beneficiários, mas para se perceber a dimensão do
impacto desta medida, o presidente da Chambre de Commerce et
d'Industrie Franco-Portugaise calcula que, até ao momento, teremos
25 mil franceses [8] a beneficiarem deste regime. Em que é que isto
se reflecte nos preços da habitação? Temos uma enorme quantidade
de reformados de outros países europeus com poder de compra muito
acima da média portuguesa (que é cerca de 1.000 euros/mês) a
comprar e arrendar casas. Para muitas destas pessoas, comprar casas
por 400 ou 500 mil euros é acessível ou mesmo barato, assim como
pagar 1.500 euros de renda é um bom preço.
O centro da capital
é um dos lugares eleitos e, consequentemente, os preços sobem. A
lei também diz que, para beneficiar da isenção, os reformados
apenas têm que permanecer em território nacional 183 dias por ano
ou "possuir uma habitação com a intenção de a manter como
residência habitual", o que faz com que estes reformados,
quando cá não estão, aluguem as suas casas a turistas.
Como se pode ver
pela fotografia, já existem investidores que garantem um pacote que
inclui o serviço de venda e a posterior rentabilização das casas
através do aluguer de curta duração.
Ao pé destes
números os vistos gold são uma brincadeira, com 2.788 vistos
emitidos até Dezembro de 2015, o que não quer dizer que também não
estejam a contribuir para o problema.
Os 500 mil euros que
o futuro detentor de um visto gold tem que investir em imobiliário
podem ser investidos na totalidade num só imóvel ou repartidos por
vários. Muitos estão a comprar apartamentos ou mesmo edifícios
inteiros, que seguidamente alugam a turistas. Ao contrário dos
reformados, estes não têm qualquer obrigatoriedade de permanência
no país.
4. Crescimento dos
hotéis e hostels
Neste momento
existem, segundo o site Hostelworld.com, 174 hostels em Lisboa. Estes
estabelecimentos, que podem ir desde o apartamento ao prédio, são
regulamentados pelo regime de alojamento local, segundo o qual apenas
é necessária uma comunicação prévia para a sua abertura. Por
essa razão não temos a previsão de quantos mais irão abrir nos
próximos tempos.
Já o número de
hotéis é neste momento de 184 unidades, com uma oferta de 36.481
camas [9]. De acordo com o Observatório do Turismo de Lisboa [10],
mais 9 unidades hoteleiras vão abrir Lisboa ainda este ano, 4 delas
no centro histórico da cidade; e em 2017 prevê-se que 8 novos
hotéis abram as portas na capital [11]. Contudo, estes números não
batem certo com o conjunto de notícias recentemente publicadas em
vários jornais que referem que 40 novos hotéis abrirão nas ruas de
Lisboa até ao final de 2017 [12]. A fonte que referem os jornalistas
é a CBRE, uma consultora imobiliária internacional com escritório
na cidade, que afirma que as referidas 40 novas unidades hoteleiras
[13], nas mãos de cadeias nacionais e internacionais, estão
actualmente em construção ou em fase de projecto na cidade, com
inauguração prevista para 2016/2017. A consultora contabilizou
ainda a abertura de 21 hotéis no ano de 2015, três vezes mais do
que no ano anterior.
Em 2014 o vereador
do urbanismo, Manuel Salgado, referindo-se ao licenciamento que a CML
faz de hotéis, disse que não compete à Câmara de Lisboa “fazer
uma regulação do mercado”, algo que em seu entender nem sequer
seria “desejável” [14]. Até ao momento, a CML está a licenciar
todos os pedidos para hotel ou hostel, independentemente da sua área
de localização e de anteriormente esse edifício ser ou não
habitação.
5. Valores do
retorno imobiliário
Segundo o Global
Property Fund Index, Portugal está entre os países que geraram
retornos mais elevados em 2015, ocupando, equiparado com os EUA, o 7º
lugar entre 32 países analisados. [15]
Em 2014 batemos o
recorde de investimento estrangeiro em compra de habitação,
chegando a um valor calculado em 930 milhões.
Em 2015, este mesmo
indicador, revela-nos que foram captados no total 1100 milhões de
euros, representando assim um crescimento de 15,4%.
Destes montantes,
calcula-se que grande parte está suportada nos regimes de Golden
Visa e dos benefícios fiscais para residentes não habituais, tendo
este último ganho grande relevância em 2015, face a 2014. [16]
3. Propostas
Tendo em conta estes
dados e números, a pergunta que urge colocar é a que dá título a
esta apresentação: Quem vai poder morar em Lisboa? num quadro em
que se favorece a expulsão de moradores e se isenta de impostos
novos detentores de propriedades imobiliárias. Urge pensar a longo
prazo qual a cidade que se está a construir e para quem.
Uma cidade é feita
de muitas coisas, mas nunca pode ser feita maioritariamente por
turistas - como se de um parque temático se tratasse.
Também não é o
seu edificado que a define como cidade, por muito bonito e recuperado
que esteja, veja-se o exemplo de Veneza. Uma cidade deve ser
planeada e esse planeamento deve ser discutido e delineado para
benefício dos seus habitantes.
Parece-nos
fundamental utilizar a dinâmica desta mudança para conduzir a
cidade numa direcção que seja vantajosa e enriquecedora para todos,
não cedendo a interesses económicos de especulação que
negligenciam e afectam os habitantes que definem e sustentam a
cidade.
Os governantes
eleitos pelos habitantes desta cidade, mais do que fazer parte deste
esforço devem ser os protagonistas deste movimento.
Algumas medidas a
estudar/debater
+ Suspender a
atribuição de licenças a hotéis e hostels até à elaboração de
um estudo sobre os impactos do turismo em Lisboa, à semelhança de
outras cidades e em permanente actualização, com o objectivo de
definir os impactos do turismo e índices de capacidade de carga
turística da cidade.
+ Realização de
uma nova lei restritiva do alojamento local, à semelhança de outras
cidades (Ex: Barcelona, Paris, Berlin, Nova Iorque, Londres, São
Francisco).
+ Revogação da lei
dos reformados gold ou limitação da atribuição de estatuto aos
residentes que se fixem em áreas específicas a definir. Ex. Zonas
despovoadas ou cidades do interior.
+ Discussão e
revisão da Nova Lei das Rendas (de acordo com o previsto no Programa
do Governo da Cidade de Lisboa para 2013-2017).
+ Promover estudos
sobre o perfil dos novos habitantes da cidade e respectivas
expectativas e motivações.
+ Sensibilizar as
associações de moradores para nas respectivas assembleias de
condóminos implicarem formas de compromisso colectivo e consenso
democrático que faça depender a criação de apartamentos para
acomodação/alojamento turístico, de consenso unânime por parte de
todos os moradores do prédio;
+ Reter na cidade, e
sobretudo nas comunidades mais afectadas pela turistificação, uma
parte significativa das mais-valias económicas, criando canais de
redistribuição dos proveitos/receitas geradas pelo turismo nos
bairros, orientando-as, de forma transparente, para benefício das
comunidades respectivas.
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Autores
Ana Bigotte Vieira
Catarina Botelho
Joana Braga
António Brito
Guterres
Leonor Duarte
Luisa Gago
Luís Mendes
//////////////////////////////////
Referências
1.
http://expresso.sapo.pt/sociedade/2015-10-18-Menos-casas-e-mais-caras-para-arrendar-em-Lisboa-e-no-Porto
http://expresso.sapo.pt/economia/2016-05-08-Imobiliarias-estimam-subida-de-40-nas-rendas-em-Lisboa
http://www.jornaldenegocios.pt/empresas/imobiliario/detalhe/preco_das_casas_no_centro_historico_de_lisboa_disparou_22_em_2015.html
2. Referência ao
filme “Lisboetas” 2004, da autoria de Sérgio Tréfaut
3.
http://www.dn.pt/sociedade/interior/arrendamento-classico-esta-a-desaparecer-do-centro-da-cidade-5174101.html
4.
http://expresso.sapo.pt/sociedade/2015-10-18-Menos-casas-e-mais-caras-para-arrendar-em-Lisboa-e-no-Porto
5.
http://www.independent.co.uk/news/world/europe/the-death-of-venice-corrupt-officials-mass-tourism-and-soaring-property-prices-have-stifled-life-in-10251434.html
6.
https://www.publico.pt/economia/noticia/um-milhao-veio-a-portugal-e-ficou-alojado-atraves-da-airbnb-1720510
7.
http://www.alep.pt/sobre-a-alep/
8.http://www.jornaldenegocios.pt/economia/impostos/detalhe/portugal_destaca_isencao_fiscal_e_seguranca_para_atrair_investimento_de_reformados_franceses.html
9. De acordo com os
dados do Registo Nacional do Turismo
10. Dados de Março
de 2016
11.
http://www.visitlisboa.com/getdoc/99d1e497-8a2b-42bf-bdc9-8c2b19e084c7/Novas-unidades-hoteleiras-em-Lisboa.aspx
12.
http://ionline.sapo.pt/500069;
http://noticias.cbre.pt/lisboa-abre-mais-de-20-hoteis-em-2015/
13.http://www.jornaldenegocios.pt/empresas/imobiliario/detalhe/vao_abrir_mais_40_hoteis_em_lisboa_nos_proximos_dois_anos.html
14.
https://www.publico.pt/local/noticia/ha-ou-nao-hoteis-a-mais-projectados-para-a-baixa-pombalina-1629222
15.
http://www.diarioimobiliario.pt/Entrevistas/Sector-imobiliario-representa-um-dos-investimentos-mais-apelativos
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