“Está
um caos!” Lisboetas e turistas desesperam nos transportes
As filas vêem-se ao
longe. Os portugueses queixam-se do tempo que têm de esperar pelos
autocarros. Os turistas nem conseguem comprar os bilhetes nas
máquinas automáticas em direcção a Cascais
Kaky Woon veio do
Colorado, EUA, e está encostada a uma parede a observar o cenário
em volta das máquinas automáticas: “Isto é de loucos”
Teresa Serafim /
10-6-2016 / PÚBLICO
“Péssimo, está a
ser um dia péssimo!” João Póvoa precisa de estar o mais
rapidamente possível na Avenida Infante Santo, onde tem um serviço
da empresa para fazer, mas encontra-se a meio de uma fila com mais de
70 pessoas. “Aqui no Cais do Sodré é terrível!” Indignado, o
estafeta diz que tem sido “uma dor de cabeça” apanhar autocarro
em Lisboa nos últimos tempos. “Já tenho perdido duas horas da
Avenida da República até aqui e isso altera muito o meu trabalho.”
Com a cidade cheia de turistas, a oferta de transportes começou a
rebentar pelas costuras.
Nas rotas mais
turísticas, andar de autocarro ou eléctrico é um desafio à
paciência
Entretanto já
passaram dois autocarros sem que tenha conseguido entrar e João
Póvoa começa a desesperar. Uma das razões que aponta para o caos
são as obras e a falta de coordenação entre a Carris e a Câmara
de Lisboa: “Têm de observar a situação e informar melhor os
passageiros, porque numa hora temos de apanhar numa paragem, noutra
hora passam o autocarro para outra paragem. As pessoas têm de
compreender, mas assim é inexplicável.”
Quem também não
entende é Jorge Gomes. Tirou o dia para ir ter com um amigo e o
destino é a Avenida Infante Santo. Se a sua intenção era apanhar
autocarro no Terreiro do Paço, mudou de ideias quando se apercebeu
da situação. Andou alguns metros e não compensou: “Hoje está
mesmo um caos!” Já está no início da fila, mas esperou quase
meia hora. “Deviam avisar a população. Não sabia que ia ser
assim. Fui mesmo apanhado de surpresa”, suspira.
De acordo com a
Carris, “a dinâmica turística na cidade nesta época do ano, com
as excursões e a chegada de grandes paquetes, gera picos de procura
atípicos, que dificultam momentaneamente a utilização destes
meios.” Questionada sobre o reforço da oferta face ao aumento da
procura, a empresa assegura que apesar de existir “um claro aumento
do turismo na época de Verão” o número médio geral de
passageiros nessa época é “acentuadamente inferior”, pois
existe “uma redução significativa dos passageiros habituais”.
Mas o problema não
se restringe ao Verão. Gonçalo Morais precisa de levar o filho à
escola. Costuma apanhar frequentemente o transporte nas paragens do
Cais do Sodré, mas é a partir de Maio que nota a sobrecarga nos
autocarros com a chegada do calor e dos turistas. “Tem sido um
entrave.” Na paragem há 20 minutos, já saiu da fila porque não
consegue segurar o filho, cada vez mais impaciente. Começou a notar
esta diferença nos transportes há um ou dois anos. “Com isto, o
que ganham é que muita gente acaba por não pagar bilhete”,
revela. Como solução só vê o aumento do número de autocarros e
eléctricos, assim como a sua frequência.
Já reformados, Raul
Pereira e Angelino Anastácio querem aproveitar o dia e vão em
direcção à Infante Santo. Na fila há meia hora, vão trocando
palavras entre si sobre a longa espera. “Nem quero imaginar no
domingo, quando for para ir ver as marchas”, afirma, preocupado,
Angelino. Impaciente, sugere que se crie uma outra via para os
autocarros, para serem mais rápidos. O seu amigo Raul responde-lhe:
“Não vês que isso implica meter pessoal?”
Ao PÚBLICO, a
Carris afirma que continua a assegurar “os níveis de oferta em
todas as carreiras que mantêm níveis de procura elevados,
procurando, sempre que possível e dentro das suas limitações,
compensar picos pontuais de procura”. Nesta época do ano, a maior
procura assinala-se nos eixos turísticos, segundo a empresa, entre a
Praça do Comércio e Belém, nos acessos ao Castelo de São Jorge,
nas carreiras de eléctricos (com destaque para o 28 e o 15) e nos
ascensores e no elevador de Santa Justa.
A empresa afirma
ainda que “procura sempre ir adequando a sua oferta de forma a
minimizar estes impactos, mas face à limitação em termos de
dimensão da frota e tripulantes afectos diariamente, e à
imprevisibilidade de muitos destes constrangimentos, nem sempre é
possível colmatar todas as situações”.
De máquina
fotográfica ao pescoço, Joane veio de França para descobrir a
capital portuguesa. Vai para Belém com um grupo de amigos e diz que
os 15 minutos de espera não são de mais para quem está de férias.
“Comprei o VivaCard no aeroporto, agora é só utilizar.”
Filas intermináveis
na CP
Mas se os turistas
não se preocupam muito com a espera dos autocarros, já na estação
do Cais do Sodré a atitude é diferente. A australiana Lauren Porter
quer ir para Cascais. “O sistema das máquinas é fácil. Estive
noutras cidades e eram como estas, mas aqui não consegui comprar
bilhete”, conta, já desesperada. Depois de ter estado numa fila
com mais de 20 pessoas, dirigese à bilheteira, onde tem mais de 40
pessoas à frente. “No início coloquei uma nota de dez euros e
depois a máquina bloqueou”, lamenta. Shiena Howhodi estava antes
de Lauren e o seu problema foi a máquina não aceitar o cartão de
crédito.
Entre os turistas,
está Paula Madeira, que precisa de ir para Algés, onde trabalha.
Foi a uma reunião no Terreiro do Paço e agora só queria apanhar
rapidamente o comboio. “Os turistas não percebem as indicações
das máquinas, porque não são friendly.” Apanha comboio
ocasionalmente no Cais do Sodré, mas nota que é a partir de Maio
que as filas crescem. “Deviam existir mais postos de atendimento
personalizados para ser mais fácil tirar o bilhete para o destino.
Há uma série de informações que são escusadas no ecrã”,
sugere.
Ana Raquel Reis, que
trabalha na banca de bolos da Pastelaria Batalha, mesmo em frente das
máquinas automáticas, conta que, entre as 9h e as 12h, o rodopio na
troca de notas por moedas intensifica-se. “O facto de muitas
máquinas não aceitarem notas faz com que os turistas acabem sempre
a trocar dinheiro.”
Há filas que chegam
a circundar a banca. “Podiam abrir mais bilheteiras em vez de
máquinas. O facto de os estrangeiros não conseguirem mexer com as
máquinas e não terem seguranças ou alguém para os ensinar faz
aumentar as filas.” Acresce outro problema: as máquinas não têm
opções em francês e Jean Claude vai ter de ir para a bilheteira
porque não conseguiu comprar o bilhete correctamente.
Contactada pelo
PÚBLICO, a Comboios de Portugal (CP) reconhece que “nos períodos
de maior volume de deslocações às zonas de praia, como é o caso
da Linha de Cascais, a afluência de clientes regista picos de
procura muito superiores ao habitual, tornando mais difícil evitar
filas de espera para aquisição dos títulos de transporte”.
Contudo, salienta que são tomadas “medidas de reforço”,
nomeadamente nos postos de venda. Quanto às máquinas de bilhetes,
“nem sempre é possível garantir a completa operacionalidade”.
Os motivos apontados são o seu mau uso, grande parte devido a actos
de vandalismo. Para evitar as longas filas, a CP recomenda “a
aquisição antecipada de títulos pré-comprados”.
Kaky Woon veio do
Colorado, EUA, e está encostada a uma parede em frente da bilheteira
a observar o cenário em volta das máquinas automáticas: “Isto é
de loucos.”
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