quarta-feira, 8 de junho de 2016

Na assembleia municipal falou-se na demissão de Salgado por causa da torre de Picoas


Na assembleia municipal falou-se na demissão de Salgado por causa da torre de Picoas

INÊS BOAVENTURA 07/06/2016 – 23:18

Eu, se calhar, no lugar do vereador Manuel Salgado, já me teria demitido”, disse Diogo Moura (CDS). Já Margarida Saavedra (PSD) exigiu “consequências políticas” deste caso.

O polémico caso da torre de Picoas voltou a dominar a reunião desta terça-feira da Assembleia Municipal de Lisboa, na qual houve vários deputados a defender a demissão do vereador Manuel Salgado e do seu braço direito, o director municipal de Urbanismo. Em resposta, o presidente da Câmara de Lisboa disse que só tomará decisões depois de estar concluída a realização de um inquérito externo à actuação dos órgãos municipais neste processo.

Sem nunca pronunciar a palavra demissão, foi Margarida Saavedra quem primeiro colocou essa possibilidade em cima da mesa, ao dizer que o PSD “exige consequências políticas deste processo”. Para a deputada, este caso ficou marcado por “uma enorme benevolência, senão mesmo uma cumplicidade” da câmara para com o promotor imobiliário, que construiu para lá dos limites do seu lote de terreno, em propriedade municipal.

Margarida Saavedra acusou ainda o executivo liderado por Fernando Medina de ter tentado “passar um atestado de menoridade à assembleia municipal”. “Não podemos deixar passar imune esta situação, nem jurídica nem politicamente”, concluiu, já depois de sustentar que “a câmara só se pode culpar a si mesma” neste que é “um buraco, a todos os títulos exemplar no mau sentido”.

Já Modesto Navarro, do PCP, defendeu que o promotor da torre de Picoas foi “altamente beneficiado” (face ao anterior proprietário do terreno) e “desacompanhado em matérias que são de facto criminais”.

O entendimento do deputado é que se este caso tivesse sido já visto “a nível da alta justiça”, e tendo em conta “tudo o que saiu a público” sobre ele, “provavelmente” o seu desfecho incluiria a demissão do vereador do Urbanismo, Manuel Salgado. “Mesmo a nível médio”, acrescentou Modesto Navarro, teria pelo menos levado à demissão do “director responsável pela área”, Jorge Catarino Tavares.

“Eu se calhar no lugar do vereador Manuel Salgado já me teria demitido”, afirmou depois o centrista Diogo Moura. “Ou já teria demitido algum serviço, caso a responsabilidade não seja dele, o director municipal ou quem deu a ordem para que esta obra se pudesse iniciar”, acrescentou, defendendo que este processo foi “uma salganhada”, em que “houve um total desrespeito” da câmara para com a assembleia municipal.

Pelo PEV, Cláudia Madeira falou em “irregularidades” várias e disse ter “dúvidas” de que a ordem verbal alegadamente dada pela autarquia ao promotor para que parasse a obra que estava a desenvolver para lá do seu terreno “tenha realmente ocorrido”.

“Porque é que só vamos carregar em cima do promotor quando a responsabilidade é da câmara?”, perguntou por sua vez o social-democrata Victor Gonçalves. Para o deputado, a admissão de culpa feita pelo gestor de projecto da obra (que disse ter cometido “um pecado” ao realizar trabalhos que não teriam sido autorizados) tem uma explicação: “o pobre do promotor”, disse o autarca, “não podia dizer outra coisa, senão nunca mais construia nada, nunca mais mexia uma palha nesta cidade”.

“Será que os criminosos ficam sem culpa?”, perguntou ainda Victor Gonçalves, sem mencionar o nome de Manuel Salgado mas defendendo que neste caso deve haver “uma penalização política de quem permitiu estas barbaridades”.

Para o PAN, a torre de Picoas “tem sido um edifício com pés de barro, em que as coisas têm fugido à lógica do que seria correcto fazer”. “O processo está viciado”, sustentou ainda Miguel Santos.

Já o bloquista Ricardo Robles voltou a mostrar-se muito crítico deste caso, como de resto tem feito desde que ele chegou à assembleia municipal. “Todo este processo é um acumular de erros do princípio ao fim”, disse o autarca, que viu ser chumbada (com os votos contra do CDS, PSD, PS, Parque das Nações Por Nós e Cidadãos Por Lisboa) a proposta que apresentou para que não fosse viabilizado o avanço da obra até que a procuradora-geral da República se pronunciasse.

“Sabemos que a longo prazo uma não decisão poderá agravar os problemas existentes”, afirmou por sua vez Miguel Graça, justificando assim a posição agora assumida pelos Cidadãos Por Lisboa. Admitindo que o caso da torre de Picoas encerra “uma série de erros”, o autarca defendeu a importância de se “procurar soluções construtivas”, em nome da “segurança”.

Aquilo que ficou decidido esta terça-feira é que a faixa de terreno na qual o promotor terá construído ilegalmente não vai ser permutada com a câmara mas sim vendida ao abrigo da figura de complemento de lote. Questionado pelo PÚBLICO sobre o valor da alienação, o presidente da câmara disse que ele será “superior a 300 mil euros”.

Quanto a eventuais demissões no executivo ou nos serviços camarários, Fernando Medina lembrou que foi já pedido a uma entidade externa (por sugestão da assembleia municipal) que avalie aquela que foi a actuação dos órgãos municipais neste processo, com vista ao apuramento de eventuais responsabilidades civis e criminais. Essa entidade, apurou o PÚBLICO, é a Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território.


“Faça-se uma avaliação independente e depois tire-se conclusões”, disse Fernando Medina aos jornalistas, já depois de ter defendido na reunião da assembleia que “não há nenhuma culpabilidade definida a priori”.

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