A 10 de Julho de 2011 publicava o Público esta foto-montagem comparativa com a seguinte legenda:
Uma avenida que não volta a ser o que foi
"Quem a viu e quem a vê. A Avenida da República, no centro de Lisboa, está praticamente irreconhecível. Não fossem os dois prédios que se erguem à direita das fotos, e que teimam em resistir à passagem do tempo, e à voracidade dos promotores imobiliários, e as duas imagens nada teriam em comum. As árvores antes frondosas e em grande número são hoje uma sombra do que já foram, tanto em número como em vitalidade. O eléctrico já por lá não circula, e os automóveis são agora reis e senhores, embora também os autocarros por aqui passem em grande número. Os palacetes e prédios de dois, três, quatro ou no máximo cinco pisos foram, na sua esmagadora maioria, desaparecendo ao longo dos anos, e aquilo que hoje temos é uma avenida “desdentada”. Homogeneidade é coisa que aqui não existe, não só em relação aos estilos arquitectónicos dos edifícios, mas principalmente em relação às suas alturas."(...) Ines Boaventura in Publico
Todos nós podemos reconhecer os efeitos deste processo que já vem de longe e que parece imparável ...
Este "blog" divulga permanentemente estes casos em sucessivos "cris de coeur" ... Mas ...
Não se tornou imperativo ... ir ao fundo do processo ... ir mais longe e perguntar PORQUÊ ?!? ... Como foi possível e como CONTINUA, cada vez mais, a ser possível assistirmos a isto paralisados por um torpor inerte ... oscilando entre indignação e apatia ... como se isto não estivesse REALMENTE a acontecer ... todos os dias ... e nós não estivessemos a assistir ... portanto, em cumplicidade ...
Claro que esta atitude vem de longe ... Quando o “Heron Castilho” estava em construção o “Establishment” académico louvava este tipo de intervenção como “defesa do Património” ...
Além de que o Instituto do Património nunca conseguiu uma verdadeira independência ( nomeações políticas) nem desenvolver uma verdadeira Escola de Restauro ... tanto ideológica como práctica ... os resultados são claros e nitidamnente visíveis nas Avenidas ...
Neste processo participaram TODOS os Vereadores do urbanismo até à data ...
É impossivel encontrar um melhor e mais ilustrativo exemplo da confusão de critérios e da manipulação de principios e ideias sobre os conceitos de “Restauro” e “Preservação” do Património ... do que a própria intervenção no edifício-sede da própria Ordem dos Arquitectos ...
Não se manifestou de imediato a Ordem no caso do Largo do Rato em Manifesto Público de apoio ...? Não reuniu o seu Presidente, de imediato 200 assinaturas de apoio ao desnecessário Projecto do Museu dos Coches ... ? numa nítida e clara atitude de "Clube" e "Esprit de Corps" Corporativo ?
Um dos muitos e inúmeros casos ilustrados neste "blog"
Avenida da Liberdade ... os efeitos preversos do PUALZE ... O Vereador do Urbanismo Manuel Salgado prepara-se para demolir este edifício ...
Se fosse agora ... este também não tinha resistido ... não interessa e é irrelevante ... o nome que se dá ... aos Planos ... eles demonstram na práctica efeitos perversos e destruidores de forma irreversivel do Carácter e da Identidade da Cidade de Lisboa ... O síndrome de “Alinhamento de Cérceas” é perverso e destruidor ....
No entanto, no meio da confusão de critérios e arbitariedade de decisões ... ainda é possivel encontrar na Avenida da Liberdade ... um exemplo de Reabilitação mais correcto ...
Avenida da Liberdade
É "nisto" que estamos a transformar as Avenidas de Lisboa ... E quando digo "estamos"... é porque ao aceitarmos este "Status Quo" ... estamos a consentir ... "Quem cala consente" ...
Aberrações destas são impossiveis de encontrar no resto da Europa ... só na América Latina ... neste caso no Rio de Janeiro ...
Entretanto por cá ... em Lisboa ... na Avenida da República ...
A "Isto" continua-se a chamar "Reabilitação Urbana"
Uma das muitas e sucessivas ilustrações do “modus operandis” dos eleitos e responsáveis perante os desafios Patrimoniais, constituindo um verdadeiro “Status Quo” com Arquitectos , Promotores e “Técnicos”.
Em Lisboa procede-se à demolição sistemática de interiores intactos de edifícios com Valor Patrimonial inquestionável, para depois se efectuarem intervenções Híbridas e Alienantes ... mas com a utilização desonesta, intelectualmente e culturalmente, de argumentos da Carta de Veneza ... à volta do conceito de “pastiche”... para justificar o injustificável e inaceitável ...
Deixo-vos uma passagem de um texto da minha autoria ...
“No presente , a consciência da autenticidade única da textura e do tecido histórico, assim como o reconhecimento do carácter único da sua inerente energia criadora e artística, valores tão defendidos por Ruskin e por Morris, foi aceite por todos e institucionalizada pela Carta de Veneza em 1964 e adoptada pelo ICOMOS em 1965.
A consciência do valor intríseco e específico das intervenções nas diversas épocas de um Monumento e a sua aceitação, foi também oficialisada pela mesma Carta e Instituição, rejeitando-se assim oficialmente e definitivamente, o conceito de Restauro em “Unidade de Estilo”.
Assim, o conceito de “Conservação acima do restauro”, tornou-se éticamente a única atitude aceitável e possivel, partindo da permissa Ruskiniana, mas com uma interpretação ligada a consequências com alguns aspectos curiosos ...
A norma adoptada pelo ICOMOS é a de, que depois da atitude de conservação e manutenção máxima e rigorosa da autenticidade do material histórico presente no Monumento, atitude que corresponde a um rigor de principio, com o qual todos concordamos, reflexo de um simples bom senso aceite universalmente, toda e qualquer intervenção posterior deve ser demarcada através estilo que denuncie claramente o contemporâneo.
Ora o contemporâneo é neste caso interpretado, depois da “victória” cultural do Modernismo como estilo, no pós-guerra, como algo abstracto e depurado de forma minimalista.
Esta situação, de pura influência ideológica, perfeitamente datável e nesse sentido imposta, torna-se mais clara ao aproximarmos o trabalho da DOCOMOMO, a organisação das Nações Unidas que se dedica à defesa dos Monumentos Modernos (leia-se Modernistas).
Assim, têm-se sem hesitações, reconstruído na integra, notáveis e magnificos Monumentos do Periodo Heróico do Movimento Moderno, tais como o Pavilhão Mies van der Rohe (Barcelona) o Café de Unie em Roterdão (etc.,) e têm-se restaurado em “Unidade de Estilo” Monumentos como a Fábrica Van Nelle, O Sanatório “Zonnenstraal” em Hilversum, a “OpenluchtSchool” em Amsterdão , etc, etc,.
Chegou-se mesmo ao ponto de propôr a construção de edifícios nunca construídos e que tinham ficado apenas como projecto.
Esta atitude é apoiada sem reservas e aplaudida pela grande maioria da classe arquitecta, com convicção e nostalgia.
Mas quando chegamos, à hipótese da aplicação da mesma atitude aos Monumentos anteriores a este periodo, aí, imediatamente grita-se de forma furiosa e indignada : “Sacrilégio”! “Sacrilégio”! “Pastiche”! Pastiche”!
Verificamos assim , dois critérios, dois pesos e duas medidas, determinados claramente por uma ambígua, subjectiva e ideológicamente motivada dualidade.”
António Sérgio Rosa de Carvalho
In “História das Ideias , História da Teoria da Arquitectura e Defesa do Património”, 2010, Scribe .
Avenida da República.
Bogota
Caracas
«A cidade mais bonita do Mundo» assim classificava o Vereador Manuel Salgado, Lisboa ... mas dizendo também : «Podemos ter edifícios altos, mas sem descaracterizar a cidade histórica e a sua ligação com o rio»
Até agora Lisboa conseguiu resistir a várias tentativas de descaracterização irreversível e definitiva da sua linha de horizonte fluvial (exceptuando as Torres das Amoreiras ), mas esta descaracterização já se instalou fortemente nas Avenidas, mostra-se imparável, e continua a ser fomentada pelos responsáveis e eleitos ...
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